BRASÍLIA - Nove meses após o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, prometer a construção de muralhas em torno de cada um dos cinco presídios sob sua gestão, a única que saiu do papel, em Porto Velho, enfrenta falhas de planejamento, atrasos e prejuízos aos cofres públicos. A obra, atualmente orçada em R$ 45 milhões, já deveria estar com mais da metade do cronograma completo, mas tinha apenas 8% das ações concluídas até outubro, conforme a Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen). Foi preciso ainda aditivo de R$ 1 milhão para corrigir erros de projeto. O valor é insuficiente, segundo a empreiteira contratada.
Procurada, a Senappen afirmou que a lentidão é “responsabilidade exclusiva” da empresa que conduz a obra e disse que abriu processo para rompimento unilateral do contrato. Lewandowski assumiu o compromisso de criar estas barreiras de segurança em fevereiro, após dois detentos fugirem da unidade de segurança máxima de Mossoró (RN). Lá, a iniciativa está em fase de assinatura do contrato.
Em Campo Grande e Catanduvas, as licitações estão previstas para 2025. A prisão da Papuda, no Distrito Federal, é a única que já conta com a estrutura.
O contrato foi firmado em outubro de 2022, no fim da gestão Jair Bolsonaro (PL), mas coube à gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) executá-lo. A TL Engenharia, escolhida em licitação para pôr de pé o paredão com torres de vigia e passarelas, alega em defesa no processo que o governo cometeu falhas técnicas ao projetar a sustentação da estrutura e subestimou o custo de materiais.
Inicialmente, o projeto previa estacas mecânicas, mas um laudo de especialistas em geotecnia revelou a inviabilidade dessa solução devido à presença de água no solo em níveis que impediriam a concretagem adequada. Por isso, adotou-se a alternativa de estacas em hélice contínua, o que resultou no aumento de 50% na quantidade de concreto necessário.
A Senappen diz desconhecer laudo que aponte falhas no projeto. O órgão afirma que o contrato sofreu duas alterações até o momento: uma para ajustes de planilha orçamentária e outra para prorrogação de prazo. Alega também que a correção do modelo de fundação havia sido feito antes da assinatura do contrato. “Os ajustes de execução em obras de engenharia são normais ao processo e previstos na Lei de Licitações.”
Os estudos de revisão citados pela TL já estavam concluídos em janeiro de 2023, quando teve início o terceiro mandato de Lula, mas as alterações e o reequilíbrio econômico financeiro de R$ 1 milhão só foram autorizados dez meses depois. A empreiteira pleiteou aditivo de R$ 3,4 milhões. O Departamento Penitenciário Nacional (Depen) negou o pedido.
Segundo a empreiteira, a demora na aprovação causou desmobilização da mão de obra e custos adicionais devido à necessidade de recontratar trabalhadores. As informações constam no processo administrativo aberto contra a empresa para a rescisão unilateral do contrato.
O governo teria ainda subestimado custos operacionais e de insumos e também desconsiderado dificuldades da região, como falta de oferta de serviços e período de chuvas intensas na região amazônica.
Já o Ministério da Justiça afirma que a empresa, além de atrasar a conclusão da obra, não apresentou proposta para ajustar o cronograma e descumpriu cláusulas contratuais, como a que exige um número mínimo de funcionários empregados na obra. Segundo a pasta, a TL Engenharia ignorou comunicados oficiais da equipe técnica.
Procurada, a TL Engenharia afirmou por meio de nota que pretende concluir a muralha do presídio de Porto Velho até dezembro de 2025 e atribuiu o atraso a características atípicas do projeto. “O projeto enfrentou desafios técnicos complexos devido à peculiaridade da obra e do local, incluindo condições geográficas e climáticas atípicas que impactaram o cronograma inicial.”
Também reconheceu o esforço do governo para solucionar o impasse. “A Senappen sempre imbuiu esforços para o bom andamento da obra, tendo inclusive cobrado soluções da empresa.”
O presídio federal de Porto Velho abriga alguns dos mais perigosos líderes de facções criminosas do Brasil. Até janeiro de 2023, Marco Herbas Willians Camacho, o Marcola, chefe do Primeiro Comando da Capital (PCC) cumpria pena lá. Ele é condenado a 330 anos de cadeia por diversos crimes. O traficante Fernandinho Beira-Mar, do Comando Vermelho, também passou pela penitenciária.
A construção de uma muralha em torno do local tem como objetivo evitar casos como o de Mossoró, onde dois detentos escaparam através de um buraco sob a luminária das celas em que estavam presos. A recaptura dos fugitivos levou 51 dias. O caso foi a primeira crise de Lewandowski à frente da Justiça e expôs a falha de segurança das penitenciárias de segurança máxima.
Em resposta à crise, o ministro anunciou uma série de medidas para aprimorar a segurança dos presídios com recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen). A principal delas foi erguer muralhas com torres de vigia no entorno, a exemplo da estrutura que já existe na penitenciária da Papuda, no Distrito Federal.
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