'País conseguirá chegar à meta fiscal deste ano'

Alexandre Schwartsman: ex-diretor do BC e economista-chefe do banco Santander. [br]Especialista critica gestão fiscal do governo e diz que efeito negativo se dá principalmente sobre o potencial de crescimento

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Para o ex-diretor do Banco Central (BC) e economista-chefe do Santander, Alexandre Schwartsman, a contínua expansão do gasto corrente do setor público será o principal responsável por eventual alta dos juros neste ano. "O crescimento da economia poderia ser mais rápido, se houvesse corte de gastos", diz o economista na seguinte entrevista.O resultado do Tesouro em 2009 é motivo de preocupação?Em alguma medida, não muito. A parte negativa da história obviamente foi a expansão do gasto corrente e recorrente. O gasto corrente veio de 16,3% para 17,1% do PIB, e a maior parte dele é resultado de expansão de coisas que não têm contração possível, como administração da folha de pagamentos, benefícios previdenciários. Tem uma série de coisas que aumentou e não tem como cair, por causa da rigidez do orçamento. No conjunto da obra, é um nível de gasto que não vai ser reduzido facilmente lá na frente, um aumento persistente do gasto.E a parte boa?O que sai de bom é que a gente já está vivendo a retomada do crescimento, com uma recuperação da arrecadação. Só o retorno às condições normais de crescimento da economia já sugere que o País vai conseguir, sem grandes dificuldades, chegar à meta fiscal deste ano. Então, o aumento do gasto, embora seja persistente, não parece ser suficiente para impedir que em 2010 o País consiga atingir suas metas, desde que não faça nenhum grande exagero.Só o aumento da arrecadação já seria suficiente?Em condições normais, sim. A arrecadação teve uma queda bastante expressiva de um ano para outro. Em algum momento no terceiro trimestre de 2008, a arrecadação bruta estava na casa de 24% do PIB. Aí, ela caiu significativamente, mas começou a se recuperar no fim de 2009. Provavelmente, a arrecadação não vai nos levar para os mesmos níveis que nos acostumamos a ver nos últimos anos. A gente não vai ver o governo federal entregar um superávit primário da ordem de 2% a 2,5% do PIB. Deve ficar num intervalo um pouco mais baixo, de 1,8% a 2% do PIB, mas o suficiente para atingirmos as metas fiscais.Há descompasso entre a política monetária e a fiscal?Há sim, e significa que o juro subirá mais do que subiria se a gente tivesse de fato uma política fiscal anticíclica. Não é só olhar o resultado, porque muito provavelmente o superávit primário vai aumentar em 2010 relativamente a 2009. Isso significa que nós estamos fazendo políticas anticíclicas? Não, de forma alguma. O superávit vai aumentar porque a economia recupera e a arrecadação recupera com ela. A forma correta de medir a política fiscal é isolando-a do ciclo econômico. Isso mostra que não vamos voltar a ter superávits como os que prevaleceram até 2008. O que sugere que a política fiscal é expansionista, que vai persistir sendo expansionista em 2010 e, com isso, terá um impulso fiscal que em alguma medida vai ter de ser contrabalançado pelo impulso monetário. Se a gente estivesse fazendo um esforço para voltar para os superávits do período de 2004, 2008, com corte de gasto, ou o Banco Central não subiria os juros ou subiria mais tarde ou subiria menos.As medidas de incentivo ao consumo adotadas pelo governo não foram anticíclicas?O que teve de anticíclico mesmo foi a questão do IPI, porque de fato tem data marcada para acabar, e entra na recuperação da receita. Mas o tamanho disso, relativamente ao PIB, foi pequenininho. O País não cumpriu a meta de superávit fiscal no ano passado...Francamente, eu não me preocupo. Que a gente não ia chegar lá, era muito claro. Mas nós fizemos a meta para nós, e não para nenhum terceiro. Não tem impacto negativo na expectativa do capital estrangeiro?Acho que hoje em dia é muito pequeno. Teria, se a gente estivesse numa trajetória na qual o País não conseguisse manter sua dívida sob controle. Eu acho que a gente não está numa situação como essa. A dívida cresceu em 2009 relativamente a 2008, mas, primeiro não foi nada desesperador e, segundo, e mais importante, as perspectivas são de que a dívida volte a retomar uma trajetória de queda relativamente ao PIB nos próximos anos. Isso significa que não vamos entrar num problema de solvência. Se houvesse problema de solvência, a gente veria um grau de preocupação muito maior. Eu vejo a nossa questão fiscal como um problema de crescimento. Acho que é uma política que reduz o crescimento relativamente ao que ele poderia ser, pela concentração muito grande em gasto corrente. O crescimento do investimento foi muito baixo, de 1% para 1,1% do PIB. Não dá para dizer que esse negócio está andando bem.Se não anda bem, o que se pode esperar para a economia real?Não vamos ter crescimento super-rápido com expansão forte de infraestrutura a cargo governamental. Os impostos vão continuar altos e as distorções que resultam dos impostos altos e do gasto público elevado também vão continuar lá.

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