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‘País precisa de um sistema único de transporte, como o SUS’, afirma especialista

Modernização do sistema e novas formas de financiamento foram temas discutidos no Summit Mobilidade 2023, promovido pelo ‘Estadão’ nesta quarta-feira, 31

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Por Guilherme Santiago

É preciso encontrar novas fontes de financiamento para o transporte coletivo nas cidades brasileiras. Para Gilberto Perre, secretário executivo da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), a solução está na implementação de um sistema único de transporte, assim como existe o SUS na área da saúde. “O país precisa de um sistema único para oferecer obrigações compartilhadas entre governo federal, governadores e prefeitos”, afirmou ele nesta quarta-feira, 31, durante o Summit Mobilidade 2023, evento organizado pelo Estadão.

“O mundo inteiro nos ensina que as receitas tarifárias não sustentam o sistema”, afirma Perre. “Sabemos os caminhos necessários a serem trilhados, mas a aceleração da implementação dessas políticas exige recursos. E é impossível atender a esses desafios sem recursos orçamentários compartilhados entre a União, Estados e municípios”, diz.

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Beto Pereira, deputado federal pelo Mato Grosso do Sul, acredita que, além de compartilhar gastos e atribuições entre as diferentes esferas da administração pública, outras soluções devem ser encontradas. “Precisamos de um plano nacional que incentive a modernização da frota, a implementação de políticas, os investimentos em mobilidade urbana e outras maneiras de orçamento”, defende.

Para Ana Beatriz Monteiro, líder da carteira de transportes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no Brasil, são válidas as preocupações mais imediatas em resolver os problemas do setor. No entanto, é preciso pensar a longo prazo para encontrar novas receitas e incluir pessoas que precisam de um transporte equitativo.

Ana Beatriz Monteiro, do BID, ressalta que é preciso pensar a longo prazo para encontrar novas receitas Foto: FELIPE RAU/ESTADÃO

Assim como ela, especialistas apontam outras soluções para a crise do transporte coletivo brasileiro, tais como a taxação do transporte individual; a inserção, no modelo de financiamento, daqueles que são beneficiados pelo sistema, ainda que indiretamente; e também alternativas para além da “tarifa zero”.

Taxação do transporte individual

Para Lucio Gregori, ex-secretário municipal dos Transportes de São Paulo durante o governo de Luiza Erundina, a discussão também deve envolver a relação entre transporte coletivo e individual. De acordo com dados apresentados por ele, o transporte público é responsável por 57% das distâncias percorridas, enquanto os automóveis correspondem a 31% das distâncias. No entanto, 77% dos gastos públicos com mobilidade referem-se ao transporte individual.

“Por isso, a discussão que temos de fazer é: por que o automóvel, que transporta menos que o transporte coletivo, gasta mais e não paga nada por isso?”, questiona.

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De acordo com Gilberto Perre, da FNP, automóveis são meios de transporte pouco eficientes para cidades, impactando o trânsito e diminuindo a eficiência do transporte coletivo. Isso exige custos maiores para a operação das redes públicas, que, por sua vez, têm suas tarifas aumentadas. “É uma penalização que quem usa o transporte individual motorizado impõe ao cidadão que utiliza o transporte coletivo”, reflete.

Cobrança de taxa por estacionamentos públicos estão entre as soluções indicadas pelos especialistas. “Uma parcela importante dos recursos que financiam o sistema em outros países vem de taxas dos usuários individuais”, afirma Gilberto. O modelo já é utilizado, em certo grau, em Fortaleza, onde o valor cobrado pelos estacionamentos públicos rotativos é integralmente direcionamento para a expansão da malha cicloviária da cidade.

Mais atores no financiamento

De acordo com os especialistas, é preciso que outros atores façam parte do financiamento. “O modelo de financiamento do transporte público do País é um dos piores”, afirma Carlos Henrique Ribeiro, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “No transporte público, os mais ricos contribuem muito pouco em comparação com os mais pobres. Temos que criar um modelo de pagamento de compensação”, defende.

A sugestão é que aqueles que se beneficiam do transporte coletivo, mesmo que sem utilizá-lo, possam colaborar com o sistema. Isso inclui o setor imobiliário, que vê seus empreendimentos valorizarem com a instalação de estações de metrô nas proximidades, e o setor automobilístico, que enfrentaria desafios de mobilidade maiores sem o transporte público.

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“Essa mudança na forma de entender o financiamento do sistema, em que aqueles com mais poder aquisitivo colaboram mesmo sendo usar, poderia nos ajudar a encontrar recursos para planos de assistência técnica a sistemas de transportes de municípios menores, para descarbonizar frotas, colocar ônibus mais confortáveis e investir na mobilidade sobre trilhos”, afirma Gilberto Perre.

Tarifa zero

Há, ainda, o debate acerca da “tarifa zero”. Para o deputado Beto Pereira, essa não deve ser uma prioridade. “Ao invés de discutir sobre tarifa zero, devemos discutir sobre um modelo híbrido, com novas fontes de financiamento, algo que incremente a receita”, diz.

Gregori, no entanto, ressalta que a tarifa impede que uma grande quantidade de pessoas se locomova pelas cidades. “Existem 70 municípios no Brasil com ‘tarifa zero’. Neles, não foi feito nenhuma reforma tributária.”

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