VATICANO - O papa emérito Bento XVI pediu desculpas por casos de violência sexual contra crianças cometidas por clérigos, mas negou que tenha acobertado padres que cometeram abusos quando ele era arcebispo em Munique, na Alemanha.
Em uma carta divulgada nesta terça-feira, 8, pelo Vaticano, três semanas após a publicação de um relatório independente alemão acusando Bento XVI de inação diante dos abusos cometidos no arcebispado de Munique, o papa emérito afirmou que nunca encobriu esses ataques quando tinha "importantes responsabilidades na Igreja Católica".
"Só posso expressar a todas as vítimas de abuso sexual minha profunda vergonha, minha grande dor e meu sincero pedido de perdão", disse Bento 16, que vive aposentado em um mosteiro do Vaticano.
"Em todos os meus encontros com vítimas de abuso sexual por parte de padres [...] percebi em seus olhos as consequências de uma grande culpa e aprendi a entender que nós mesmos caímos nessa grande culpa quando a negligenciamos ou quando não a enfrentemos com a necessária decisão e responsabilidade, como aconteceu e acontece muitas vezes", continuou, em sua carta.
O cardeal Joseph Ratzinger foi arcebispo de Munique de 1977 a 1982 e papa de 2005 a 2013. "Minha dor é maior pelos abusos e erros que ocorreram durante o tempo de minha missão nos respectivos lugares", acrescentou, ao dizer-se "consternado".
Bento 16 está com 94 anos e tem enfrentado problemas de saúde. Na carta, ele diz ainda que, apesar de quaisquer erros que possa ter cometido, Deus seria o árbitro final. "Em breve, estarei diante do juiz final da minha vida. Embora possa ter muitos motivos de temor e medo quando olho para trás em minha longa vida, ainda assim me sinto feliz."
O relatório publicado na Alemanha sobre os abusos sexuais de menores nos arcebispados de Munique e Freising afirma que o então cardeal Ratzinger teria sido informado dos ataques cometidos pelo padre Peter Hullermann.
Após o relatório alemão ser publicado pela primeira vez, Bento 16 reconheceu ter estado em uma reunião de 1980 sobre um caso de abuso sexual enquanto era arcebispo de Munique, dizendo ter informado erroneamente aos investigadores alemães que não estava lá.
Na época, o secretário pessoal do ex-papa, o arcebispo Georg Ganswein, disse que a omissão foi resultado de um descuido na edição da declaração e não má-fé. Na carta, Bento 16 disse: "Para mim, provou-se profundamente doloroso que esse descuido tenha sido usado para lançar dúvidas sobre minha veracidade e até me rotular de mentiroso".
Em um documento também divulgado pelo Vaticano na terça-feira, conselheiros do papa emérito rejeitam essas acusações expressas no relatório alemão, que analisaram em detalhes.
"Quando era arcebispo, o cardeal Ratzinger não estava envolvido em tentativas de ocultar abusos", dizem esses quatro conselheiros, dizendo que o relatório contém informações "incorretas".
"As palavras desta carta são as de um velho impotente, que sente que seu encontro com Deus está próximo" e "convida toda a Igreja a sentir como sua a ferida aberta do abuso", diz Andrea Tornielli, editorialista da a mídia oficial Vatican News.
O relatório alemão citou 497 vítimas de abuso na Alemanha entre 1945 e 2019, principalmente meninos e adolescentes, e cerca de 235 supostos culpados, a maioria padres. Após sua publicação, o Vaticano expressou seu "sentimento de vergonha e remorso".
Em sua carta, o papa emérito também agradece ao seu sucessor, Francisco, pela “confiança, apoio e orações que ele me mostrou pessoalmente”. / Com informações de AFP e Reuters
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