Pronta desde 2023, a Ponte da Integração que liga Foz do Iguaçu, no Paraná, a Presidente Franco, no Paraguai, está parada e sem uso. O atraso nas obras de acesso tanto no lado brasileiro como no paraguaio inviabiliza a circulação de carros e caminhões na região fronteiriça mais movimentada do País.
Responsável pela administração e fiscalização da obra da Ponte da Integração, o Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná (DER) afirma que no lado brasileiro ainda precisam ser concluídas a rodovia de acesso à ponte, com 14,7 quilômetros, e duas aduanas: Brasil-Paraguai e Brasil-Argentina. No Paraguai, também é necessário finalizar as obras de acesso.
Enquanto isso, outra ponte entre os dois países é construída para interligar a cidade de Porto Murtinho, em Mato Grosso do Sul, e a paraguaia Carmelo Peralta. Hoje com 60% das obras concluídas, essa ligação é chamada de Ponte Bioceânica e deverá ficar pronta em novembro de 2025, segundo o governo brasileiro.
A nova ponte no Paraná é aguardada há mais de três décadas com a expectativa de aliviar o trânsito caótico da Ponte da Amizade, na fronteira entre Foz do Iguaçu e Ciudad del Este. A nova estrutura custará R$ 374 milhões quando entregue.
Desse valor, R$ 238 milhões correspondem à estrutura da ponte em si e outros R$ 136 milhões referem-se às obras de acesso - aduana e rodovia perimetral no lado brasileiro - que não estão prontas. A obra é uma parceria entre os governos federal, do Paraná e a Itaipu Binacional, esta responsável pelo financiamento da ponte, desapropriações e da perimetral brasileira.
Com 760 metros de comprimento e vão livre de 470 metros, a ponte tem duas pistas, cabos estaiados e um mastro principal de 190 metros no lado brasileiro, o que corresponde a um prédio de 63 andares.
O descompasso na entrega da ponte e das obras de acesso é o que inviabiliza liberação do trânsito na via. Enquanto a construção da ponte fluiu sem contratempo a partir de 2019, a infraestrutura de rodovias e aduanas, tanto no Brasil quanto no Paraguai, demorou para sair do papel.
Apesar de o contrato para as obras de acesso ter sido firmado em 2019 no lado brasileiro, o consórcio responsável pelas obras, JL/Planaterra/Iguatemi, que não é o mesmo da execução da ponte, fez um pedido de reequilíbrio econômico-financeiro, alegando prejuízos causados pela pandemia, alterações contratuais e novas soluções de engenharia necessárias. Um acordo para prosseguir os trabalhos foi homologado em dezembro de 2023.
Diretor presidente da Construtora JL, que integra o consórcio, João Luiz Félix explica que o prazo contratual para o término das obras é no final de 2025. Ele diz que várias questões implicaram no atraso das obras, iniciadas em 2021, incluindo desapropriações novos viadutos que não estavam previstos na rodovia perimetral e concessão de licença ambiental. “Tivemos de fazer o projeto executivo e aprovar todos. Veio a pandemia e estourou os preços”, afirma.
Outro problema foi em relação ao projeto original que inicialmente previa aduanas apenas para a passagem de caminhões. Os planos mudaram e as aduanas precisaram ser ampliadas para receber carros pequenos, o que também implicou em alteração no projeto.
Balanço divulgado pelo governo do Paraná no mês passado apontou que a execução da Perimetral Leste estava em 32,4%. A construção das estruturas das duas aduanas, também conforme o governo paranaense, está com 26% das obras previstas finalizadas.
No Paraguai, o gargalo é ainda maior porque, além da conclusão da aduana, é preciso construir uma ponte de 500 metros sobre o Rio Monday, em Presidente Franco, cujas obras estão iniciando só agora.
“Presidente Franco não está preparada para circulação de caminhões. Não há rodovia duplicada”, diz o presidente do Conselho de Desenvolvimento de Presidente Franco (Codefran), Ivan Leguizamón.
Empresários e entidades de Brasil, Paraguai e Argentina, representadas pelo Conselho de Desenvolvimento da Região Trinacional do Iguassu (Codetri), se uniram recentemente para pleitear a liberação do trânsito na ponte, mesmo sem a finalização das obras de acesso.
O objetivo é tentar liberar o trânsito pelo menos para carros de passeio, no início de 2025, caso as aduanas brasileiras e a paraguaia fiquem prontas até o fim do ano, diz o presidente, Roni Temp.
Delegado da Alfandega de Foz do Iguaçu, Cézar Vianna visitou as obras e esteve reunido recentemente com empresários e instituições. A constatação é a de que hoje é impossível liberar a ponte, mesmo para veículos pequenos, porque não há infraestrutura mínima para fiscalizar veículos.
Além das aduanas não estarem prontas, a rodovia que dá acesso à ponte no lado brasileiro, na região do Porto Meira, margeia uma ocupação, tem pista simples, não tem acostamento e nenhuma iluminação, constituindo-se de área de risco. “Todos foram unânimes em dizer que não existe condições de atuar na situação presente”, diz.
Prejuízos
Vice-presidente da Associação Brasileira de Logística e Transporte de Cargas (ABTC) e diretor da Federação das Empresas de Transporte de Cargas do Estado do Paraná (Fetranspar), Celso Gallegario diz que o atraso na abertura da Ponte da Integração traz prejuízos ao setor de logística da região.
Um dos efeitos é o aumento dos custos operacionais. Hoje, os caminhões vazios só podem retornar ao Brasil via Ponte da Amizade após a meia-noite. Isso, explica Gallegario, leva a maior consumo de combustível, horas extras para motoristas e custos adicionais com manutenção de veículos devido ao tempo prolongado na fila.
“Muitas vezes o caminhão só retorna às 4h ou 5h da manhã. E mais: caminhões de exportação estão demorando em média cinco ou sete dias para cruzar a fronteira. Com a abertura da Ponte da Integração, seriam necessários no máximo três dias”, acrescenta ele, que também preside o Sindicato dos Transportadores Rodoviários de Foz do Iguaçu e Região (Sindifoz).
Ponte Bioceânica
Com 1,2 mil metros de extensão, a Ponte Bioceânica vai interligar Porto Murtinho (MS), e a paraguaia Carmelo Peralta, consolidando a Rota de Integração Latino-Americana, rodovia de 2,4 mil km que sai de Campo Grande, no Brasil, passa por Paraguai e Argentina e termina em Antofagasta, litoral do Chile. A ponte ficará pronta em novembro de 2025, mas os acessos devem demorar mais para serem entregues.
Conforme estudos do Ministério da Infraestrutura brasileiro, a estrada bioceânica pode encurtar em mais de 9,7 mil quilômetros de rota marítima a distância das exportações brasileiras para a Ásia. Os navios que partem de portos brasileiros não precisarão utilizar o Canal do Panamá. Em uma viagem para a China, o tempo de percurso será 23% menor, com cerca de 12 dias a menos de navegação. A rota facilitará também o comércio entre países do Mercosul.
A ponte está sendo construída por um consórcio binacional, com investimento de R$ 575,5 milhões da administração paraguaia de Itaipu. A estrutura é dividida em três trechos: dois viadutos de acesso (cabeceiras secas), um de cada lado, e a parte estaiada, com 632 metros sobre o rio, incluindo um vão central de 350 metros.
Iniciada em 13 de dezembro de 2021, a obra está a cargo do consórcio Pybra, formado pela empresa Tecnoedil Construtora, do Paraguai, e as brasileiras Cidade Ltda e Paulitec Construções. Atualmente, os trabalhos se concentram no reforço de pilares e na colocação das pré-lajes nas estruturas da ponte.
Do lado paraguaio, a ministra de Obras Públicas e Comunicações, Claudia Centurión, disse em nota que o corredor significará redução de até 66% nos tempos logísticos e de quase 20% nos custos operacionais para exportações de algumas regiões do Brasil e do Paraguai.
O projeto do corredor rodoviário bioceânico remonta a 2000, quando a cúpula de presidentes da América do Sul lançou o plano de integração da infraestrutura regional para estabelecer uma rota entre o Atlântico e o Pacífico. Em 2015 foi firmada a Carta de Assunção pelos presidentes do Brasil, Paraguai, Chile e Argentina estabelecendo um corredor bioceânico partindo de Campo Grande até os portos do norte do Chile, com passagem por Porto Murtinho.
O objetivo mais claro era econômico: reduzir o trajeto das exportações para a Ásia e incentivar atividades comerciais, especialmente o turismo, ao longo da rota. Um ano depois, Brasil e Paraguai assinaram acordo para a construção da ponte.
Superar os dois principais entraves – o transporte por balsa entre Porto Murtinho e Carmelo Peralta e as estradas sem pavimentação no Chaco paraguaio – passou a ser o foco do projeto. A previsão inicial era de que a ponte sobre o Rio Paraguai fosse concluída em 2022. Questões políticas e a pandemia atrasaram também as obras de infraestrutura rodoviária na região do Chaco paraguaio.
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul desenvolve o Projeto GPS 67 – Desafios Socioambientais da Rota Bioceânica para monitorar, acompanhar e apresentar propostas para evitar prejuízos à população e ao ambiente nos municípios afetados.
Obra de acesso à ponte
Segundo o secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação de Mato Grosso do Sul, Jaime Werruck, outra obra fundamental é o acesso à ponte do lado brasileiro, já licitada pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).
“Terminamos o processo de licenciamento e as obras devem começar este mês. São 13 quilômetros que vão consumir na ordem de R$ 200 milhões. Importante destacar que nesses 13 quilômetros vamos ter mais de 1 km de pontes, por ser área alagadiça. É uma obra bastante complexa que temos uma previsão de terminar no prazo de dois anos, Termina primeiro a Ponte Bioceânica, e depois o acesso”, disse Werruck. Segundo ele, até o fim do ano será iniciada a construção da área alfandegada que vai custar mais de R$ 200 milhões.
Centro aduaneiro
O Dnit informou que a ordem de serviço para a execução e pavimentação do acesso à ponte internacional sobre o Rio Paraguai e o Contorno Rodoviário de Porto Murtinho na BR-267 foi emitida em fevereiro com prazo de execução de 26 meses consecutivos - entrega prevista para abril de 2026.
O projeto de restauração entre o km 577 e o km 678 está sendo elaborado. Além de construir o acesso à ponte, o contrato prevê um Centro Aduaneiro de Controle de Fronteira para atuação dos órgãos envolvidos nesse tipo de atividade. Devido às características do terreno, segundo o Dnit, também são previstas seis pontes de vazantes para dar vazão às águas oriundas das cheias do Pantanal.
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