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Porte de maconha para consumo pessoal: veja a opinião de especialistas

Critérios de diferenciação entre usuários e traficantes ainda serão definidos pelo STF

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Atualização:

Nove anos após o início do julgamento, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira, 25, que o porte de maconha para uso próprio não é crime. A quantidade de drogas que deve diferenciar usuários e traficantes ainda vai ser definida. A decisão só passa a valer depois que for publicada.

Sessão plenária do Supremo em que foi retomado o julgamento sobre a descriminalização da posse da maconha. Foto: Wilton Junior/Estadão

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Para o professor de Criminologia da USP Mauricio Stegemann Dieter, a decisão do STF pode ter efeito contrário ao anunciado, porque deixou brechas quanto à aplicação da sanção e à fiscalização do cumprimento dela. “O art. 28 (da lei 11.343, de 2006, que regulamenta o uso e já não previa pena de prisão ao usuário de drogas, mas outras sanções, como advertência ou prestação de serviços à comunidade) não foi revogado, mas ‘deixou de ser crime’ para maconha até uma certa quantidade (que deve ser definida pelo STF nesta quarta-feira). Essa conduta virou, então, ilícito administrativo. Mas, não há autoridade administrativa constituída para fiscalizar nem para aplicar as sanções. Também não foi definido quem vai sancionar o eventual descumprimento das sanções, nem onde e como vai tramitar esse processo administrativo”, disse.

Dieter questiona também quem vai certificar que a substância é mesmo maconha e não outra substância, e quem vai pesá-la. “O Instituto de Criminalística é que não, porque não é mais crime”, disse.

Os parágrafos 6.º e 7.º, que continuam em vigor, atribuem ao juiz as responsabilidades de punir o usuário que não cumprir a sanção inicialmente aplicada e de obrigar o Poder Público a oferecer tratamento médico. “Mas qual juiz? Se não é criminal, porque já não pode ser, será cível? Fazenda Pública? Que juiz é esse que cuida de sanções que não são pena, mas obrigações de fazer?”, pergunta Dieter.

Segundo Dieter, como nenhuma dessas questões foi respondida e não há qualquer sinal de regulamentação por meio de lei, “na prática a tendência é que todo caso de uso de maconha seja considerado tráfico pela polícia, que dificilmente vai aderir à lógica de que está proibida de abordar”. Para o professor, essas brechas podem piorar a situação.

“Todo caso será tratado como tráfico, que é crime hediondo”, prevê o professor da USP. “Antes a prática (de classificar como usuário ou traficante) era arbitrária, agora provavelmente vai continuar sendo, mas por outros motivos”, conclui.

Também analisando a questão sob o ponto de vista jurídico, o advogado e professor de Direito Processual Penal da PUC-SP Claudio Langroiva considerou a decisão acertada. “O consumidor não é um traficante. O que o Supremo fez foi entender que a conduta do porte de maconha para uso pessoal não é mais crime, é uma infração administrativa. Agora, a pessoa não vai mais ter que se preocupar com reincidência, com o fato de se tornar enquadrada em um crime”, avalia.

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“Foi o reconhecimento de uma solução adequada à realidade da saúde pública, pois a conduta do consumo já era equiparada a um ilícito administrativo e estava submetida a reprimendas típicas do direito administrativo sancionador”.

Questão de saúde pública

Para o professor de Psiquiatria na Unicamp e pesquisador de política de drogas Luís Fernando Tófoli, a decisão do STF representa um avanço, mas ainda insuficiente para que as drogas sejam tratadas como questão de saúde pública. “Quem mais precisa de atendimento médico não é o usuário de maconha, mas o de crack. E esse continua longe do serviço de saúde, porque permanece sendo um criminoso”, avalia Tófoli, que defende a liberação de porte, em quantidade restrita, para todas as drogas.

Ele também faz uma ressalva sobre a quantidade de maconha que será estabelecida para caracterizar o usuário: “Quem mais precisa de atendimento médico é quem consome mais drogas. Por isso, acho 25 gramas (como limite máximo de porte) insuficientes, 40 gramas seria mais adequado”.

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O professor e pesquisador também alerta que essa quantidade não pode ser conclusiva para quem excede. “Não se pode pensar ‘ah, então tem 45 gramas, é traficante’. Esse tem que ser um limite a partir do qual vai se investigar a pessoa”.

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