Para muitos brasileiros, morar na Itália é um sonho. Atualmente são mais de 100 mil vivendo no país europeu, de acordo com dados do Itamaraty. E para quem ainda está no Brasil? Como fazer para morar na terra de Leonardo da Vinci, da culinária rica em massas e de vinhos famosos?
Rodrigo Gianesini, COO da Cidadania4U, assessoria para reconhecimento de nacionalidade europeia para cidadãos da América Latina, dá algumas dicas sobre como viabilizar essa mudança.
A primeira orientação a saber é que, segundo a Embaixada Italiana, brasileiros natos são isentos do visto de entrada para permanência na Itália de até 90 dias a cada seis meses para turismo, negócios, competições esportivas, convites, missões e estudo. A isenção não se aplica quando o período for para realizar atendimento médico ou atividades remuneradas.
Mas, quem quiser morar na Itália, seja para estudar, trabalhar ou realizar outras atividades, vai precisar de um visto, que tem validades variáveis. Além do visto, é necessário ter o Permesso di Soggiorno - permissão de moradia. O país europeu tem algumas possibilidades de visto (cujas exigências podem ser conferidas no portal da embaixada):
- Estudo e pesquisa: para quem vai ao país estudar (curso superior, língua, MBA, doutorado), pesquisar ou estagiar.
- Trabalho: pode ser para quem fará um trabalho autônomo ou será sócio de uma empresa italiana, mas também para quem vai contratado por alguma empresa.
- Investimento: desde 2017, o governo italiano permite residência de investidores estrangeiros, que devem investir em ativos estratégicos da economia e que estão em uma lista do governo
- Adoção: para quem está em processo de adoção de criança italiana e precisa estar no país por mais de 90 dias
- Tratamento de saúde: quem tiver tratando alguma doença, além do visto, é solicitado outros documentos, como atestado médico que comprove a doença
- Visitas com motivos familiares: para quem tem parentes de primeiro grau e querem passar um período maior de 90 dias
Como conseguir cidadania italiana?
Outra possibilidade para quem quer viver na Itália é ter a cidadania no país. Segundo Rodrigo, todo aquele que for descendente de um italiano tem direito. “Claro, essa não é a única forma de se tornar um cidadão italiano, seja por descendência, casamento ou residência, os direitos e deveres são os mesmos”, comenta.
Na cidadania por descendência, tem direito quem possui um italiano em sua árvore genealógica. “Você pode confirmar esse direito fazendo uma retrospectiva da sua árvore, demonstrando por meio de documentos o vínculo desde o italiano até o interessado”, diz.
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Um ponto importante para entender é que não existe um limite geracional, como pontua a advogada Roberta Firpo Bevilaqua, especialista na área. Independentemente de qual tenha sido o italiano em sua árvore genealógica, é possível pedir cidadania, basta comprovar a partir de documentos. Uma dúvida frequente é sobre a necessidade de ser homem ou mulher. “Até a constituição italiana de 1948, mulheres não passavam o direito à cidadania automaticamente, por isso, se a pessoa tiver uma ascendência feminina antes desse ano, a melhor via é a judicial”, explica. A advogada também argumenta que o entendimento do direito está bem pacificado entre juristas do país.
No caso da cidadania para quem já mora no país, é possível que um estrangeiro se torne cidadão por tempo de residência, graças à Lei Italiana de Naturalização. Esse direito só é concedido àqueles que já são cidadãos europeus e possuem residência fixa na Itália por ao menos 2 anos; estrangeiros de fora da União Europeia que mantêm residência fixa lá por no mínimo 10 anos; além de pessoas que serviram ao Estado italiano, apátridas, refugiados ou filhos adotados por italianos que tenham mais de 18 anos e 5 anos de residência na Itália.
Qual a documentação necessária?
Para reconhecer a cidadania italiana, diz Rodrigo, é necessário reunir documentos que comprovem o vínculo com o italiano de sua árvore genealógica. “Nessa etapa, é preciso colher o maior número de informações possíveis, pois elas irão ajudar a encontrar os documentos e os lugares em que estão – desde cartórios à igrejas”, conta.
Além disso, segundo ele, é fundamental saber se o ascendente se naturalizou ou não brasileiro. Caso isso tenha acontecido, o processo para, já que, entre os documentos necessários, está uma certidão negativa de naturalização. “Por se tratar de documentos antigos, é comum encontrar erros em datas e sobrenomes. Nesses casos, é necessária uma análise minuciosa para verificar se há retificações a fazer”, aponta Rodrigo.
Os documentos imprescindíveis para a abertura do processo são:
- árvore genealógica;
- certidões de nascimento;
- certidões de casamento;
- certidões de óbito (caso haja);
- e certidão negativa de naturalização (CNN) do dante causa (antepassado europeu).
A partir desse ponto, com toda a documentação reunida, é necessário realizar a correção de possíveis erros nas certidões – como grafia de nomes e sobrenomes e discordância de datas. Esses ajustes podem ser feitos em cartórios civis ou, em casos mais específicos, via ação judicial.
Após as correções quando necessárias, é preciso traduzir os documentos para o italiano – trabalho que deve ser feito por um tradutor juramentado, um profissional reconhecido e credenciado como Tradutor Público e Intérprete Comercial, pela Junta Comercial do Estado onde a pessoa reside.
A última etapa antes da abertura do processo é o Apostilamento de Haia, uma legalização para que os documentos brasileiros tenham validade na Itália, podendo ser apresentados em órgãos internacionais. O apostilamento deve acontecer antes e depois da tradução e pode ser feito em diversos cartórios em todo o Brasil.
Quanto tempo demora o processo de cidadania?
Depende da forma de reconhecimento. Segundo Rodrigo, o pedido de cidadania por descendência pode ser solicitado de três formas: administrativa via consulado, judicialmente na Itália ou por residência na Itália.
Na via administrativa junto aos consulados, o tempo de espera para ser chamado na fila durava cerca de dez anos. Recentemente, os consulados modificaram a forma de convocação - de fila por agendamento. “Porém esse agendamento depende da disponibilidade de datas pelos consulados, o que torna o processo mais moroso e burocrático”, afirma.
Roberta também lembra que cada consulado atende pessoas de regiões específicas do País. Portanto, para melhor entender qual seria o consulado responsável por seu pedido, visite o site da embaixada e veja a rede consular.
Na via judicial, o processo pode levar em média dois anos, esse prazo dependerá do Tribunal competente e do juiz que julgará a ação. A definição da competência do Tribunal é o local de nascimento do italiano que dá causa ao processo. Atualmente, é a forma solicitada, analisando custo-benefício.
Segundo Roberta, esta é a forma mais fácil por conta da demora do processo quando é feito por via administrativa. “Existe uma lei que determina que eles sejam concluídos em até dois anos, mas por conta da demanda, da falta de servidores, o fato de ter muitos pedidos, tudo isso tem levado a atrasos”, diz a advogada. No caso da via judicial, o processo é menos demorado porque é feito lá na Itália, geralmente em parceria com advogados italianos. Aqui é importante lembrar que os honorários desses advogados também entram no custo final.
Já o processo por residência dos descendentes de italiano pode levar de 6 meses a 1 ano, sendo necessário fixar residência por, pelo menos 90 dias, e seguir todos os trâmites necessários do Comune onde o processo tramitará. Nessa modalidade, o idioma não é um requisito obrigatório - apesar de ser um diferencial. Uma vez morando por lá e com todos os documentos necessários em mãos, o requerente terá que esperar a visita do Comune para atestar a cidadania. Nesse caso, é preciso considerar os gastos com moradia e alimentação, o que pode tornar o processo mais caro. “Lembrando que você não pode estar ‘morando’ num Airbnb, hotel, pousada”, diz Roberta.
Quanto custa tirar uma cidadania italiana?
A média de investimento para um requerente varia de R$ 11 a 50 mil dependendo do processo, documentações e retificações, se necessário, diz Rodrigo. Os valores não podem ser contabilizados absolutamente porque envolvem vários trâmites, desde a busca da árvore genealógica, passando pela regularização dos documentos, tradução e abertura do processo, que pode ou não envolver gastos com honorários de advogados estrangeiros.
Roberta e Rodrigo concordam em um ponto: grupos familiares tem um benefício de ingressar no mesmo processo pois isso ajuda a dividir alguns custos e taxas. Dessa forma, quanto mais interessados entrarem no mesmo processo, mais barato fica por pessoa.
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