Acusada de crimes ambientais pelo Ministério Público do Rio, a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA) está processando por danos morais dois pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e uma bióloga da Universidade do Estado do Rio (Uerj). A CSA, inaugurada há 16 meses em Santa Cruz, na zona oeste do Rio, alega que as ações são motivadas por "declarações públicas contendo acusações graves e infundadas". Estudo preliminar da Fiocruz indica a possibilidade de que danos à saúde de moradores de Santa Cruz tenham sido causados por poluição resultante de atividades da siderúrgica. A primeira ação foi ajuizada em 18 de julho contra o pneumologista Hermano de Castro, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP), da Fiocruz. As outras duas, no dia 14 de outubro, contra o engenheiro-sanitarista Alexandre Pessoa, pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), da Fiocruz, e a bióloga Mônica Lima, da Faculdade de Ciências Médicas da Uerj. Castro e Pessoa integram a equipe responsável pela "Avaliação dos impactos socioambientais e de saúde em Santa Cruz decorrentes da instalação e operação da empresa ThyssenKrupp CSA". Um relatório técnico preliminar foi divulgado em 22 de setembro pela Fiocruz, apresentando, entre outras informações, a caracterização química do material particulado lançado pela siderúrgica e a avaliação clínica de moradores. Mônica foi responsável pelo atendimento de moradores no Hospital Universitário Pedro Ernesto. Indagada sobre a possível relação entre a divulgação do relatório da Fiocruz com a decisão de processar os pesquisadores, a CSA informou que houve "coincidência" e que "uma coisa não tem nada a ver com a outra". A empresa ressaltou que "está questionando pessoas físicas" e não a instituição. Segundo a CSA, as ações foram motivadas por declarações dadas à imprensa ou em audiências públicas. A CSA não especificou as declarações, citando genericamente casos em que houve menção ao "alto potencial cancerígeno e alterações genéticas e fetais" resultantes de atividades da siderúrgica na região, o que a empresa rechaça. Intimidação. A bióloga Mônica Lima classificou a decisão da CSA como "ameaça". "Estão tentando nos calar. Mas não vou parar de exercer o meu trabalho como técnica. Não falei nada que não seja verdade. Minha participação é técnica e política, porque coloco minhas opiniões." Segundo ela, ainda que tivessem apenas grafite e ferro, como alega a empresa, as emissões "podem causar danos à população, como estão causando, e câncer a longo prazo". Alexandre Pessoa disse que o relatório foi demandado por denúncias e que a empresa "foi multada por órgãos ambientais e está sendo processada por crime ambiental". Ele acrescentou que "a população não sabe o que está respirando. Não é só grafite e ferro. O material que produz ferro-gusa também está sendo lançado no solo e prejudicando a agricultura." A empresa afirma que o material, emitido em duas ocasiões, é "inerte e não inalável", composto de grafite (70%) e ferro. Também procurado, Castro não deu entrevista. A direção da Fiocruz informou que "ratifica a garantia de manifestação individual de seus pesquisadores" e "o respeito pela competência técnico-científica, postura ética e compromisso social que os qualificam como profissionais de referência". E afirmou que a via jurídica escolhida pela CSA "repercute como cerceamento a essa liberdade de expressão". A instituição acrescentou que será criado um grupo de trabalho multidisciplinar, vinculado à presidência da Fiocruz, para "examinar possíveis problemas socioambientais e de saúde decorrentes da instalação e operação da indústria siderúrgica".
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