Sob temor de mais cheias, Bahia corre para tirar morador de área de risco

Número de mortes causadas por chuvas no Estado chega a 21; entre ribeirinhos, parte resiste a deixar casas com medo de saques ou por não acreditar no risco

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Por Heliana Frazão

SALVADOR - Sob o risco de novas cheias em várias cidades, a Bahia corre para tirar moradores de áreas de risco e monitora o nível das barragens no Estado. O número de mortos por causa das fortes chuvas chegou a 21 – um adolescente de 19 anos foi arrastado pela enxurrada anteontem em Ilhéus, no sul do Estado.

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O Corpo de Bombeiros divulgou comunicado ontem sobre o aumento do fluxo das águas, com a abertura das comportas da barragem Machado Mineiro, no Rio Pardo, região de Águas Vermelhas, em Minas Gerais, vindo em direção à Bahia. Segundo a corporação, há risco real de enchentes nas cidades de Itambé, Canavieiras, Mascote e Cândido Sales, já bastante atingidas pelas chuvas.

“A orientação às prefeituras é para que a população deixe as áreas de risco”, alerta o comandante-geral do Corpo de Bombeiros da Bahia, coronel Adson Marchesini. Ele diz ser preocupante o volume de água nas barragens do Estado, mas afirma que não há risco de rompimento – houve estruturas rompidas nas regiões de Vitória da Conquista e Jussiape. De acordo com Marchesini, as barragens que tiveram problemas nos últimos dias são bem menores e construções privadas, pertencentes a fazendeiros.

Moradores limpam suas casas inundadas em Itapetinga, na Bahia; milhares de pessoas estão desabrigadas na região Foto: Raphael Muller/AP

O trabalho para remover moradores das áreas de risco é complicado. Além do perigo de o nível da água subir, as equipes lidam com a resistência daqueles que não querem deixar suas casas para trás. Parte alega medo de saques caso o imóvel fique vazio; outros descartam a chance de uma enxurrada causar uma tragédia. No Estado, porém, já são 42 mil desalojados e 34 mil desabrigados desde novembro, quando começaram as fortes chuvas.

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Corrida contra o tempo

Aos 86 anos e com dificuldades de locomoção, Altina Silva não queria sair de casa em Ubaitaba, cidade com cerca de 20 mil habitantes a 375 quilômetros de Salvador. “Insistimos muito, para que ela entrasse no barco. Nós explicávamos que ela corria risco iminente de morrer, mas ela não acreditou e se recusou a sair”, relata Rui César Santos, chefe da Guarda Municipal de Ubaitaba.

Altina mora na Avenida Beira Rio, às margens do Rio de Contas, que transbordou. Pouco tempo depois, a guarda foi acionada por parentes da idosa, que já estava com a água pelo pescoço, para que fosse resgatá-la. “A retirada dela foi muito mais difícil, porque tivemos de praticamente nadar até o local onde ela estava para trazê-la até o barco”, descreve Rui César.

“Tudo feito com muito cuidado, porque uma pessoa mais jovem poderia nadar caso caísse na água, mas essa senhora, certamente morreria. Esse foi um resgate bem delicado”, acrescenta o chefe da Guarda.

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Em Ilhéus, Itabuna e outras cidades, as equipes têm usado botes e helicópteros para resgatar moradores ilhados, muitos com as residências submersas. Pelo menos quarenta rodovias tiveram um trecho destruído ou bloqueado nos últimos dias.

O governador Rui Costa (PT) afirmou ontem que a Bahia atravessa o “maior desastre natural de sua história” e comparou o cenário a um “bombardeio”. No total, cerca de 470 mil pessoas já foram afetadas, estima o governo, com 136 municípios em estado de emergência.

Reconstrução e ajuda

Costa disse que não será permitido que casas voltem a ser construídas em áreas de risco, que ficam perto de rios ou em áreas propícias a deslizamentos. Conforme o governo, a prioridade das obras serão pontes e estradas essenciais que ligam os municípios a outras regiões e que estejam em locais de mais fácil acesso.

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O governo afirmou prever auxílio financeiro às famílias que foram vítimas da tragédia, mas o Estado ainda calcula qual deve ser a quantidade total de beneficiários e qual é o valor possível.

À medida que a água baixa em alguns locais, é possível ver a montanha de escombros. Na cidade de Itapetinga, também no sul do Estado, Carlos Batista da Silva mostrava ontem a marca da água na parede, em cima da sua cabeça. Pouco depois de ele ter sido avisado sobre a chegada da enxurrada, viu seus objetos todos ficarem submersos. “Queríamos tirar os móveis, ao menos resgatar a televisão”, conta ele, que arrastava para a rua os restos do sofá, algumas cadeiras e o micro-ondas, destruído.

Para Itamaraju, uma das cidades mais prejudicadas pelos estragos, o governo estadual enviou 120 geladeiras para ajudar quem teve as casas engolidas pela correnteza. No município, houve quatro óbitos. Nos últimos dias, famosos e anônimos têm mobilizado campanhas de doações de dinheiro e pertences para ajudar as vítimas.

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