PUBLICIDADE

Tráfico x milícia no Rio: estudo revela onde há mais tiroteios

Polícias estiveram em 49% dos tiroteios registrados no Grande Rio entre 2017 e 2023

PUBLICIDADE

Foto do author Marcio Dolzan
Atualização:

Entre os territórios dominados por grupos armados no Rio de Janeiro e na região metropolitana, 62% estão sob influência do tráfico de drogas e 38%, da milícia, segundo estudo do Instituto Fogo Cruzado em parceria com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni), da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Os dados consideram tiroteios e confrontos armados entre 2017 e 2023 na Grande Rio. A proporção de tiroteios em regiões dominadas pelo tráfico é muito maior. Dos locais com presença do tráfico, 70% tiveram confronto com a polícia em um período de sete anos. Já entre as áreas de milícia, essa taxa cai para 31,6%.

Operação da Polícia Militar na Rocinha, realizada em 2018; em sete anos, agentes do Estado estiveram em 49% dos tiroteios registrados no Grande Rio Foto: Wilton Junior/Estadão

PUBLICIDADE

As forças de segurança estiveram envolvidas em 4 de cada 10 tiroteios nas áreas com presença do tráfico. Quando a troca de tiros ocorre em áreas controladas por milícias, a polícia esteve em 4 de cada 100.

A dinâmica de ocupação dos territórios do Grande Rio por grupos armados vem mudando nos últimos anos. Milícias chegaram a comandar a maior parte deles, mas recentemente o Comando Vermelho expandiu seu controle e já está em mais da metade dessas áreas.

Para Maria Isabel Couto, diretora de Dados e Transparência do Instituto Fogo Cruzado, era esperado que os confrontos com a polícia fossem mais numerosos em áreas de tráfico, uma vez que o domínio territorial é maior. Chama a atenção, contudo, a enorme diferença apontada.

“Há várias hipóteses - separadamente ou em conjunto - possíveis para explicar esse cenário. Resultante do viés da própria política de segurança, que pode estar mais voltada para o enfrentamento armado ao tráfico do que às milícias. Pode também ser resultante de diferentes dinâmicas dos grupos armados, que talvez sejam mais reativas por parte de facções do tráfico”, afirma ela.

“Ou podem, inclusive, indicar relações de conivência e corrupção das forças policiais, dada a estrutura de fundação das milícias, muitas vezes compostas por agentes do Estado”, considera a pesquisadora.

Publicidade

“Compreender o porquê dessa discrepância exigirá estudos mais aprofundados e, inclusive, de investigações das autoridades. Mas, cabe ressaltar, a discrepância em si deve servir como alerta às mesmas autoridades de que algo está errado com a política de segurança”, avalia Maria Isabel.

Região Metropolitana do Rio teve média de 17 tiroteios por dia

O estudo do Fogo Cruzado e do Geni mostra que o Grande Rio apresentou, em média, 17 tiroteios por dia entre 2017 e 2023 - ao todo, foram 38.271 no período. Mas, esses registros não acontecem de forma igual: nos sete anos, 67,1% dos bairros que compõem toda a região metropolitana apresentaram alguma disputa por território. E em “apenas” 3,71% dos casos os confrontos foram de alta intensidade.

O sociólogo Daniel Hirata, da UFF, lembra que esses casos costumam ocorrer em áreas de intensa disputa por controle de territórios, cujos envolvidos podem mudar ao longo dos anos - às vezes entre facções, outras vezes entre facções e milícias, e outras ainda entre as próprias milícias. É o caso da região da Praça Seca, na zona oeste carioca, local de intensas disputas nos últimos anos - e até o momento, sem solução.

“Me parece que as operações policiais nunca foram instrumentos eficientes de enfrentamento das facções do tráfico de drogas e também não são com relação às milícias”, avalia Hirata. “A questão não é exatamente o maior ou menor enfrentamento eficaz de cada grupo armado, mas sim uma atuação repressiva mais ou menos intensa para cada um desses grupos.”

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.