Diversidade e Inclusão

O que ainda precisamos saber sobre a Síndrome de Down?

"Questões básicas de saúde e desenvolvimento permanecem sem respostas, desconhecemos as trajetórias de amamentação de bebês nos primeiros meses de vida, um aspecto fundamental", diz coordenador de estudo inédito no mundo, conduzido pelo Instituto Jô Clemente (IJC) com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo.

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Foto do author Luiz Alexandre Souza Ventura

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Usadas como símbolos de inclusão, abraçadas e aplaudidas, destacadas em vários setores, pessoas com síndrome de Down ainda enfrentam negligência, capacitismo e, em muitos aspectos, são consideradas desconhecidas, enigmáticas, retratadas de maneira estereotipada e sobrecarregadas de estigmas. O Brasil tem, segundo o Ministério da Saúde, aproximadamente 300 mil habitantes com essa condição, causada pela trissomia do cromossomo 21. Então, celebramos nesta sexta-feira, 21/3, o Dia Mundial da Síndrome de Down, mas num cenário que deveria ser coisa do passado, afinal, já atravessamos o primeiro quarto do século XXI.

Diante dessa contradição e também de muitas barreiras vencidas ao longo dos anos, o que ainda precisamos saber sobre a síndrome de Down? Uma pesquisa chamada 'Coorte de Nascimento T21 São Paulo, Estudo de Longo Prazo sobre a Saúde e Desenvolvimento de Crianças com síndrome de Down na Cidade de São Paulo', conduzida pelo Instituto Jô Clemente (IJC) com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e a Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, busca novas informações.

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O termo 'coorte' vem do latim 'cohors', que identificava um décimo das legiões de soldados romanos que marchavam juntos nas campanhas bélicas do Império. Em epidemiologia, identifica um grupo de pessoas com uma experiência em comum. Um estudo de coorte observa e analisa a relação entre fatores de riscos ou características e o desenvolvimento de enfermidades em grupos da população. É longitudinal, com participantes observados por um período de tempo pré-estabelecido, para verificar mudanças na ocorrência da enfermidade associadas ao fator de risco. Sendo a unidade de observação o indivíduo, o acompanhamento permite detectar as mudanças que ocorreram em todos os participantes do estudo.


"Trata-se da primeira pesquisa no mundo que determinará trajetórias de saúde e desenvolvimento com dados primários utilizando de desenho prospectivo nos primeiros anos de vida. Para ilustrar o pioneirismo. Existem apenas dois estudos de coorte existente com bebês com síndrome de Down. Os dois estudos limitam-se a um componente de saúde: o sistema cardiopulmonar, com algumas dezenas de variáveis", diz Fábio Bertapelli, coordenador do projeto.

A 'Coorte T21 São Paulo', explica Bertapelli, vai investigar pelo menos duas mil variáveis de saúde e desenvolvimento do bebê e da mãe em 25 áreas:

- Prevalência de nascimentos na cidade de São Paulo

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- Diagnóstico da síndrome de Down

- Momento da notícia da síndrome de Down

- Indicadores sociodemográficos

- Assistência social

- Acesso a serviços de saúde

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- Estimulação precoce

- Morbidade pré-natal e perinatal

- Estados de imunização

- Qualidade do sono da mãe e do bebê

- Padrões normativos de crescimento do bebê

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- Hábitos alimentares do bebê

- Aleitamento materno

- Saúde mental da mãe

- Qualidade de vida da mãe

- Medidas neuropsicomotoras globais

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- Marcos motores

- Níveis de atividade física da mãe e do bebê

- Saúde auditiva do bebê

- Saúde oftalmológica do bebê

- Sinais vitais da mãe e do bebê

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- Vínculo mãe-bebê

- Validação de índices de saúde

- Diretrizes de saúde e desenvolvimento

"O principal desafio reside na complexidade da vigilância epidemiológica referente à identificação de nascimentos com síndrome de Down na cidade mais populosa do País. Ainda há subnotificação de nascidos com síndrome de Down. Além disso, a maioria das pesquisas se inicia nas idades mais avançadas, um a dois anos de vida, por exemplo. A Coorte T21 iniciará nos primeiros três meses de vida. Precisamos que a informação chegue com a maior rapidez possível às famílias. Trata-se de um estudo longitudinal. A criança precisa ser identificada na idade certa para a participação no estudo", explica o coordenador.

De acordo com o Instituto Jô Clemente, o projeto começou em 2023 e está atualmente na fase de "Coleta para Construção da Ferramenta", na qual 80 famílias participam do desenvolvimento de questionários. A etapa de "Coleta Definitiva" deve ser iniciada em junho ou julho deste ano, com expectativa de primeiros resultados obtidos no mesmo período de 2026.

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"A construção de questionários, formulários de pesquisa e protocolos de testes deve incluir a participação ativa dos participantes da pesquisa: pais, mães e bebês. Essa abordagem representa uma boa prática científica, ainda pouco adotada por muitos centros e laboratórios, principalmente devido à complexidade envolvida em estudos dessa natureza. No entanto, ao envolver as famílias nesse processo, conseguimos desenvolver instrumentos de investigação mais alinhados com a realidade vivida por elas", afirma Fábio Bertapelli.

O coordenador diz que o método resulta em questionários mais precisos e relevantes, além de protocolos de testes menos invasivos e mais acessíveis para as mães e demais participantes, o que garante dados de alta qualidade, mas também respeito e valorização da experiência das famílias envolvidas.

"Somos os primeiros do Brasil a adotar sensores de última geração capazes de avaliar sinais vitais tanto dos bebês como das mães. Vamos monitorar o perfil cardiorrespiratório (ECG, frequência cardíaca e taxa respiratória) e a movimentação diurna e noturna durante os quatro mil minutos consecutivos em tarefas de vida diária de forma simples e acurada. Além disso, usaremos polissonografias consideradas padrão ouro para investigação do sono dos bebês assim como protocolos de avaliação auditiva em infraestrutura que permitirá examiná-los sem sedação", detalha Bertapelli.

Inclusão ampliada - No cenário atual, discussões sobre pessoas com deficiência passam por várias áreas fundamentais, especialmente educação e trabalho. Sendo assim, um estudo centralizado em "políticas públicas direcionadas à saúde de pessoas com síndrome de Down, além de abrir novos caminhos para futuras intervenções terapêuticas", como é descrito a 'Coorte T21', não seria excessivamente restrito a uma única área?

"Desconhecemos as trajetórias de amamentação de bebês com síndrome de Down nos primeiros meses de vida, um aspecto fundamental para a saúde e desenvolvimento. Embora a tecnologia de ponta desempenhe um papel importante na pesquisa, questões básicas de saúde e desenvolvimento ainda permanecem sem respostas. Atualmente, ainda não dispomos de referenciais precisos para avaliar um dos componentes mais básicos da saúde infantil: o peso corporal de forma acurada. A 'Coorte T21' propõe transformar essa realidade. O estudo busca desenvolver ferramentas de monitoramento de saúde de melhor precisão. Espera-se que os resultados gerem modelos de vigilância em saúde, intervenções direcionadas para a primeira infância e atenção ao principal cuidador, a mãe", responde Fábio Bertapelli.

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