Neste 86º episódio da coluna Vencer Limites na Rádio Eldorado (FM 107,3 SP), comentários sobre a MP que prevê a venda da Raspadinha exclusivamente por pessoas com deficiência.
A proposta de ressurreição da Loteria Instantânea Exclusiva (Lotex), mais conhecida por Raspadinha, e a venda somente por pessoas com deficiência, por enquanto, é totalmente vazia e incompreensível. Está longe de ser uma ação para geração de renda e de emprego.
O que há de concreto até este momento é a redação provisória da MP, com um parágrafo do artigo número três que diz "na operação da Lotex, a comerciallzação das apostas deverá ser reallzada por Pessoas com Deficiência". Não há absolutamente nenhum detalhe sobre como isso funcionaria. Está prevista uma licitação, ou seja, uma empresa vence essa concorrência e tem domínio sobre o negócio, mas o texto não explica qual seria a relação de trabalho entre a pessoa com deficiência e o dono do negócio. É CLT, MEI, RPA, bico, free-lancer ou uma autorização do governo para exploração de mão de obra pagando muito pouco?
Dessa forma, toda e qualquer especulação pode se tornar fato.
Esse texto precisa ser detalhista e exato, esclarecer ponto a ponto qual pessoa com deficiência se pretende atingir, porque nivelar todas as pessoas com deficiência no mesmo patamar econômico, social e intelectual é completamente errado.
Se esse projeto é direcionado especificamente para pessoas com deficiência de baixa renda, essa informação tem de constar no texto.
Tenho conversado com José Francisco Manssur, secretário executivo do Ministério da Fazenda, responsável pela medida provisória. Ele afirma que dialoga com instituições de pessoas com deficiência e que a MP está em construção.
Foi divulgada nesta segunda-feira, 1, uma carta aberta à sociedade e ao governo brasileiro, assinada por nove instituições de pessoas com deficiência: ABRA (Associação Brasileira de Autismo), CBCP (Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos), CBDV (Confederação Brasileira de Desportos de Deficientes Visuais), CPB (Comitê Paralímpico Brasileiro), CRPD (Comitê Brasileiro de Organizações Representativas das Pessoas com Deficiência), FCD/BR (Federação das Fraternidades Cristãs de Pessoas com Deficiência do Brasil), FENAPESTALOZZI (Federação Nacional das Associações Pestalozzi), ONCB (Organização Nacional de Cegos do Brasil) e ONEDEF (Organização Nacional de Entidades de Pessoas com Deficiência Física).
Nesse manifesto, essas organizações declaram "apoio irrestrito à proposta que estabelece a comercialização da Lotex, popularmente conhecida como raspadinha, exclusivamente por pessoas com deficiência".
E tem uma publicação do Movimento Down totalmente contrária à proposta da Raspadinha, compartilhada por várias associações e pessoas. "Ainda acham que pessoas com deficiência são dignas de pena e caridade, pedintes e vendedoras de bilhetes de loteria", destaca o post.
O enfrentamento da exclusão no trabalho não é feito com a distribuição de esmolas. O governo tem de construir uma política pública de fortalecimento da empregabilidade da população com deficiência, sem nenhuma característica de benevolência ou ação social em contrapartida ao lucro. Inclusão no trabalho não é um favor para a pessoa com deficiência, mas uma obrigação do poder público. Pessoas com deficiência ainda são availadas como custo por empresas públicas e privadas. É essencial o governo coloque em prática ações que modifiquem esse pensamento ultrapassado e capacitista, para ampliar o acesso a oportunidades de emprego de qualidade e equidade.
José Francisco Manssur, secretário executivo do Ministério da Fazenda, disse que já conversou sobre essa proposta com a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, comandada atualmente por Anna Paula Feminella, e que faz parte do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, liderado por Silvio Almeida.
Sendo assim, pedi para entrevistar a secretária Anna Paula Feminella ou um representante da secretaria sobre quais avaliações esse órgão faz a respeito da proposta das Raspadinhas, ou que a assessoria de imprensa enviasse um posicionamento oficial.
Não recebi nenhuma resposta.
O governo Lula está patinando das temáticas das pessoas com deficiência e precisa, com urgência, acertar o prumo. Porque parece que somente nas questões da população com deficiência a atual gestão tem autorização para ser pior do que a anterior.
"Art. 39. A Lei n° 13.155, de 4 de agosto de 2015, passa a vigorar com as segulntes alterações:
Art. 28-A. Na operação da Lotex, a comerciallzação das apostas deverå ser reallzada por Pessoas com Deficiência, observadas as disposições da Lei n° 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e de ato do Poder Executivo.
Parágrafo único. Enquanto não efetivado o processo licltatórlo de concessão, a Caixa Econômica Federal fica dispensada, na operação da Lotex, da obrigatoriedade de comercialização das apostas por Pessoas com Deficiência".
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