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As movimentações do governo federal e do Congresso Nacional para aprovação dos projetos de lei da reforma tributária e do corte de gastos mostram que os direitos das pessoas com deficiência, embora garantidos em lei, inclusive na Constituição, são facilmente moldados aos interesses políticos do Legislativo e do Executivo.
Nas propostas para isenções na compra de carro novo e para as regras mais apertadas do Benefício de Prestação Continuada (BPC), se é realmente voltado ao social, nesses dois projetos, o governo foi um verdadeiro amigo da onça para a população com deficiência.
Houve muita articulação e pressão da Associação Nacional de Apoio às Pessoas com Deficiência (ANAPcD) para que os projetos fossem modificados e, na avaliação do presidente da entidade, Abrão Dib, as conquistas obtidas são resultado desse trabalho durante meses em Brasília.
"Conseguimos a apresentação de 14 emendas para a reforma tributária, sendo 13 acatadas parcialmente ou na integra", diz Abrão Dib. "Temos muitas vitórias, como a retirada da exigência de adaptação externa para os veículos, redução do período para a troca do carro de quatro para três anos, elevação de R$ 120 mil para R$ 200 mil no teto do preço do automóvel com isenção proporcional de ICMS e isenção total de PIS e COFINS para essa diferença (embora o teto de R$ 70 para isenção total de ICMS, travado há 15 anos, tenha permanecido), além de valores reajustados anualmente de acordo com o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor)", detalha o presidente da ANAPcD.
A associação também conseguiu defender em encontro com o relator da reforma tributária na Câmara, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que as mudanças feitas pelo Senado, no que diz respeito aos direitos das pessoas com deficiência, são positivas e precisam ser mantidas
BPC e o corte de gastos - "Se há algum erro na concessão do Benefício de Prestação Continuada, está na própria estrutura do governo, e a ANAPcD não aceita que o BPC de milhares de pessoas com deficiência seja cortado durante algum tipo de pente fino, por tempo indeterminado, e depois seja exigido que essa pessoa com deficiência vá presencialmente ao INSS (Instituto Nacional de Seguro Social) para reaver o benefício. Muita gente vai morrer antes de recuperar essa renda", ressalta Abrão Dib.
A associação levou à Câmara um sugestão de alteração que, segundo Abrão Dib, resultou na emenda de autoria de Daniela Reinehr (PL-SC), coautoria de Marco Feliciano (PL-SP), General Girão (PL-CE), José Medeiros (PL-RN) e Maria Rosas (Republicanos-RJ), além de subscrição de Paulo Bilynskyj (PL-SP), Sostenes Cavalcante (PL-AL), Adilson Barroso (PL-MG), Professor Alcides (PL-GO), Bibo Nunes (PL-RS), Evair Vieira de Melo (PP-ES) e Silvia Waiãpi (PL-AP).
O grupo defende as seguintes atualizações:
"Dê-se aos artigos 1° e 6° do projeto de lei em epígrafe a seguinte redação:
Art. 1° - O cadastro biométrico poderá ser utilizado como ferramenta complementar para a gestão dos benefícios sociais, devendo ser oferecidas alternativas acessíveis, como atendimentos remotos, domiciliares ou itinerantes, para garantir a universalidade de acesso.
Art. 6°- A Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, passa a vigorar com as seguintes alterações:
Art. 20, § 2º - Para fins de concessão administrativa ou judicial do benefício de que trata o caput, a pessoa com deficiência é aquela que enfrenta barreiras de natureza física, mental, intelectual ou sensorial que limitam sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme definido pela Lei nº 13.146/2015. O registro do código da Classificação Internacional de Doenças (CID) será exigido, considerando-se critérios biopsicossociais na avaliação da deficiência.
§ 3°-B - Bens improdutivos ou de baixo valor econômico, assim como patrimônios que não gerem renda efetiva, não serão considerados no cálculo de renda familiar para a elegibilidade ao benefício.
§ 3°-C - O Poder Executivo deverá assegurar alternativas acessíveis de atualização cadastral para famílias em regiões de difícil acesso ou em áreas com infraestrutura inadequada, incluindo atendimentos itinerantes ou domiciliares".
"Precisaríamos de 103 assinaturas de deputados federais em apoio e já temos 110 assinaturas. Não vamos aceitar esse endurecimento no BPC", completa o presidente da ANAPcD.
Ainda sobre movimentos em defesa das pessoas com deficiência que recebem o BPC, a Coalizão Nacional Inclusiva pelo Autismo (CONIA), formada por seis entidades nacionais de defesa dos direitos das pessoas autistas (Associação Brasileira de Autismo, Movimento Orgulho Autista Brasil, Onda Autismo, FENAPAES, FENAPESTALOZZI e UMANAS), também está em Brasília, tem feito reuniões e articulações, inclusive nos ministérios da Saúde, da Educação e da Assistência Social, com lideranças de partidos solicitando a retirada dos pontos do projeto do corte de gastos que tratam do BPC, apoia a sugestão de emenda feita pela ANAPcD, tem enviado ofícios, mobilizado as redes sociais e dialoga com parlamentares do Congresso Nacional.
"Temos duas conselheiras da Abra em Brasília, mais a Fenapestslozzi e o MOAB. São senhoras muito aguerridas e estão a postos para mobilização local", diz a advogada Flávia Marçal, integrante da coalização. "Precisa haver concessão quando ao número de benefícios por residência e sobre a renda das famílias, mas ainda existe divergência em relação entre o relator e o autor do PL sobre o conceito da pessoa com deficiência. Para a coalização, e o conceito biopsicossocial, previsto na Lei Brasileira de Inclusão", afirma Flávia Marçal.
Nesta segunda-feira, 16, a Reunião Ampliada do Conselho de Participação Social da Presidência da República, encontro online na noite desta segunda-feira, 16, foi 'invadida' por pessoas com deficiência, que usaram a área de comentários para pedir mudanças no PL 4614/2024, do corte de gastos, que restringem o acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC). O evento teve presença de integrantes do Ministério da Fazenda e, oficialmente, há membros de entidades de pessoas com deficiência entre os conselheiros.
O grupo 'invasor' usou o chat para alertar a respeito dos prejuízos com o aperto das regras do BPC proposto pelo governo.
"Foi unânime, todos pediram que não haja nenhum ataque ao BPC", relatou com exclusividade a Vencer Limites um dos 'invasores'.
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