Diversidade e Inclusão

Sônia Maria de Jesus

Episódio 105 da coluna Vencer Limites, que vai ao ar toda terça-feira, às 7h20, ao vivo, no Jornal Eldorado, da Rádio Eldorado (FM 107,3 SP).

PUBLICIDADE

Foto do author Luiz Alexandre Souza Ventura
Sônia estava protegida e recebendo aulas de Libras e português.  


Antes de tudo, lembre-se: ela tem nome, é Sônia Maria de Jesus, mulher negra, com deficiência auditiva, resgatada em junho da casa de um desembargador em Florianópolis (SC), onde foi, segundo as polícias Civil e Federal, e o Ministério Público do Trabalho (MPT), submetida a 40 anos de escravidão (situação análoga à escravidão).

PUBLICIDADE

Sônia estava, até semana passada, protegida, recebendo aulas de Libras, a Língua Brasileira de Sinais, de língua portuguesa, artes e educação física, mostrava uma boa velocidade de aprendizado, inclusive de escrita, já conseguia contar algumas situações da própria vida, mas ainda não tem possibilidades de manifestar sua opinião de forma livre e informada, como exige a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

A decisão do STJ é contraditória porque a família do desembargador alegou que Sônia tem de deficiência intelectual, embora ela não demonstre nenhum sinal dessa condição, e não conseguia fazer nada sozinha, mas o STJ argumentou que ela é adulta, com total capacidade de tomar decisões.

Há uma enorme pressão sobre os auditores fiscais do trabalho que atuam no caso. O coordenador da ação está sendo processado criminalmente, com risco de perder o emprego, e foi afastado de suas funções no caso por determinação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o mesmo STJ que mandou Sônia Maria de Jesus de volta para a casa onde ela foi escravizada durante 40 anos.

A Associação Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (ANAFITRA) publicou uma moção de apoio a Humberto Monteiro Camasmie, o fiscal afastado.

Publicidade

Nessa publicação, a associação repudia "as constantes tentativas de desconstruir a ação fiscal materializada em articulação com outros órgãos parceiros, as quais resultaram na decisão do Supremo Tribunal Federal - STF, em favor da família do desembargador. A ANAFITRA, outrossim, presta sua solidariedade ao Auditor-Fiscal do Trabalho, Humberto Camasmie, que atuou - como sempre o foi no exercício das suas funções de AFT, nos limites da legislação que regula a matéria e exatamente no sentido do que uma sociedade realmente livre, justa e solidária dele, servidor público federal, espera. E, finalmente, a ANAFITRA solicita, de maneira encarecida, esclarecimentos acerca dos encaminhamentos que já foram dados ao caso do afastamento do citado AFT de suas funções nessa ação de combate ao trabalho análogo ao de escravo".



Ganhou força nos últimos dias o movimento de repúdio à decisão do STJ, confirmada pelo ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Publicidade

Nesta segunda-feira, 11, o Instituto Trabalho Digno, composto por auditores fiscais do trabalho, publicou uma carta aberta às ministras e ministros do Supremo.

PUBLICIDADE

"Grave fato ocorrido nos últimos dias, quando a senhora Sônia Maria de Jesus, mulher negra, com deficiência (surda), resgatada de condição análoga à de escravizado, acolhida pelo sistema de proteção social e em processo de ressocialização (de modo a fornecer-lhe instrumentos e capacidades básicas para comunicação e integração à sociedade), foi abruptamente retirada da instituição de acolhimento, sem que ao menos tivesse a possibilidade de rever sua família, e devolvida a seus algozes, os escravocratas Ana Cristina Gayotto de Borba e Jorge Luiz de Borba, que por quase 40 anos mantiveram Sônia privada dos mais elementares direitos laborais e sociais, explorando-a desde a infância, impondo-lhe o analfabetismo, à falta de acesso a uma educação adequada à sua condição de pessoa com deficiência e à incapacidade de exercício pleno das faculdades e direitos sociais", diz o ITD (leia a publicação completa).

Três dias atrás, imediatamente após a decisão da Justiça, uma página no Facebook dedicada ao tema, chamada, Trabalho Infantil Brasil, compartilhou questionamentos ao desembargador Jorge Luiz de Borba. "Excelência, como é ser da família sem ser da família? Como é ser da família e não ter acesso à escola? Como é ser da família e dormir em lugar apartado? Como é ser da família e fazer as refeições com os outros empregados? Como é ser da família, sem o nome da família? Como Sônia pode ser da família se nunca lhe foi oferecido o direito de ser?".

O PSB Inclusão também se manifestou. "O caso de Sônia Maria de Jesus é um exemplo grotesco de abuso de poder e violação dos direitos humanos. É especialmente indignante que esta situação tenha ocorrido sob a proteção de um desembargador, alguém que deveria ser um guardião da justiça e dos direitos humanos. A história de Sônia Maria de Jesus é um triste lembrete de que a escravidão moderna ainda persiste em nossa sociedade, especialmente afetando aqueles que são mais vulneráveis, como as pessoas com deficiência".

O Estadão publicou na semana passada matéria com depoimentos sobre o caso, que revelaram puxões de cabelo, quarto mofado, pus no ouvido, dores de dente, massagem nos pés da patroa, roupas "nojentas" e assaduras sob os seios (leia aqui).

Publicidade



Comentários

Os comentários são exclusivos para cadastrados.