O STF concluiu, após quase dois anos, a votação da ação de inconstitucionalidade movida pela OAB relativa ao financiamento de campanhas eleitorais por parte de empresas privadas. É uma vitória da cidadania. Em primeiro lugar porque o dinheiro privado nunca fluiu de maneira igualitária para os partidos. Alguns recebem muito mais recursos de doadores do que outros, o que cria, na prática, uma competição profundamente desigual no processo eleitoral. Inúmeros estudos acadêmicos e matérias de imprensa já demonstraram que quanto maior o volume de dinheiro que um candidato tem em sua campanha, maior a chance de se eleger. Em segundo lugar, o financiamento privado institui uma competição desigual no momento pós-eleição. Numa democracia, todos os atores políticos buscam, e isso é legítimo, exercer influência sobre os governantes eleitos e sobre os parlamentares. Mas é óbvio que grandes empresas, que jorram milhões de reais nas campanhas eleitorais, conseguem ter muito mais proximidade e influência sobre os gestores públicos e sobre os legisladores do que o cidadão comum. Este, ainda que a lei permita que possa também fazer doações a partidos e candidatos, via de regra só tem mesmo o seu voto como arma na democracia. E isso, infelizmente, tem contado menos nos processos de tomada de decisão na Administração Pública que o poder de barganha dos grandes interesses econômicos. Com a decisão do STF, a presidente Dilma Rousseff tem agora mais força política e argumentos para vetar a proposta, aprovada na Câmara dos Deputados, que constitucionaliza as doações privadas de dinheiro para as campanhas eleitorais. Lembremos ainda que o projeto já havia sido derrubado no Senado, antes de ser novamente aprovado na Câmara. Escudada na decisão do STF e na sinalização que os senadores já haviam dado, espera-se que Dilma vete a proposta, e inagure, assim, uma nova era nas campanhas eleitorais em nosso país. Obviamente que sempre haverá o risco de partidos e candidatos continuarem recebendo recursos por parte de doadores privados, mas isso poderá ser combatido com intensa fiscalização. Aqueles que fizerem campanhas eleitorais muito suntuosas certamente despertarão a desconfiança de toda a comunidade política, e dos eleitores inclusive, já que daqui por diante partidos e candidatos terão de se virar somente com os recursos do fundo partidário, publicamente conhecidos. A partir da decisão de hoje do Supremo, e com o provável (e esperado) veto da Presidente Dilma à proposta aprovada na Câmara, deveremos ter, já a partir de 2016, campanhas eleitorais mais baratas, sem tanta pirotecnia e tanta ostentação, como temos visto nas últimas duas décadas. Campanhas que retomem o cerne de uma disputa eleitoral, que revalorizem aquilo que é mais importante na democracia: o debate franco e aberto sobre os temas de interesse público. * Wagner Iglecias é doutor em Sociologia e professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP
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