Um equipe europeia de cientistas, liderada pelo português Pedro Lacerda, atualmente na Queen's University de Belfast, descobriu uma mancha avermelhada que possivelmente contém matéria orgânica - moléculas do mesmo tipo das que formam os seres vivos - na superfície do planeta-anão Haumea, que orbita o Sol a uma distância cerca de 50 vezes maior que a da Terra, além de Netuno e Plutão.
Diferente dos demais planetas e planetas-anões do Sistema Solar, Haumea não é um corpo esférico, mas alongado, como um ovo. Esse formato se deve à alta velocidade de rotação do planeta, que completa um giro completo em torno de si mesmo - o equivalente a um dia terrestre - em menos de 4 horas.
"À distância não é possível saber se apenas o manto é elongado, ou se o núcleo também é", diz Lacerda, explicando que o planeta-anão é denso demais para ser apenas uma bola de gelo no espaço, e deve contar com um núcleo rochoso. As conclusões sobre a mancha estão sendo apresentadas no Congresso Euro´peu de Ciência Planetária, que acontece ao longo desta semana na cidade alemã de Potsdam.
A superfície de Haumea é toda brilhante, como seria de e esperar de um corpo revestido de gelo, e o ponto vermelho, por ser mais escuro que o resto, se destaca nas leituras da chamada "curva de luz", que mede as variações na intensidade da luz refletida pelo astro.
Explicações possíveis para a presença da mancha incluem um acúmulo de minérios, a presença de um tipo diferente de gelo e a existência de matéria orgânica. Recentemente, um aminoácido, componente de proteínas, foi descoberto na poeira de um cometa, o Wild 2.
"Não é ainda possível saber qual a complexidade da matéria orgânica da mancha", diz Lacerda. "Nem sequer há garantia que seja matéria orgânica -- é apenas uma possibilidade. Mas sim, é possível que existam aminoácidos em Haumea -- porque não?"
O astrônomo lembra que alguns modelos teóricos sugerem que os grandes corpos do Cinturão de Kuiper - como é chamada a região do Sistema Solar que se localiza além da órbita do planeta Netuno - podem conter, ou ter contido, água em estado líquido. "Com água e carbono, sob a forma de metano, por exemplo, há material para fazer matéria orgânica", pondera.
Qualquer que seja o material responsável pela mancha, ele pode ter sido depositado na superfície de Haumea pelo impacto de um outro corpo. Lacerda espera realizar novas observações da mancha em 2010, agora com um espectroscópio, o que permitirá analisar a luz que vem dali em busca da composição química da região.
A descoberta da mancha vermelha em Haumea se segue à dos aminoácidos em Wild 2 e à de componentes do DNA em um meteorito. Matéria orgânica já foi detectada até mesmo em nuvens de poeira no espaço e em berçários de estrelas.
Haumea é o quinto planeta-anão conhecido. Os demais são Plutão, Eris, makemake e Ceres. Desses, apenas Ceres não faz parte do Cinturão de Kuiper, mas fica no interior do Cinturão de Asteroides entre Marte e Júpiter. A descoberta de Haumea foi anunciada em 2005, quando o astro recebeu o nome provisório de 2003 EL61. O nome Haumea - de uma deusa havaiana da fertilidade - foi adotado oficialmente em 2008. Tem cerca de 30% da massa de Plutão, e duas luas: Hiiaka e Namaka.
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