Aumento de mosquitos nos EUA tem pouca influência do clima

Estudo revela que urbanização e resíduos cada vez mais fracos de DDT foram os principais fatores para avanço dos insetos nos últimos 30 anos

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SÃO PAULO - As mudanças climáticas eram consideradas até agora a principal hipótese para explicar um aumento expressivo, nas últimas décadas, das populações de mosquitos existentes nos Estados Unidos. Mas, um novo estudo revela que, pelo menos nos últimos 30 anos, a principal causa do avanço dos insetos é a urbanização intensa e a redução gradual das concentrações de dicloro-difenil-tricloroetano (DDT) residual no meio ambiente. 

O 'Culex pipiens' é um mosquito comum em áreas urbanas da América do Norte. As populações de mosquitos cresceram 10 vezes nos últimos 50 anos nos Estados Unidos Foto: Ary Faraji

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Segundo os autores da pesquisa, publicada nesta terça-feira, 6,na revista Nature Communications, pelo menos 600 mil toneladas de DDT foram utilizadas no país entre 1940 e 1970 - e a concentração que resta no ambiente se reduz pouco a pouco. O veneno foi proibido em 1972.

De acordo com o líder da pesquisa, Marm Kilpatrick, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz (UCSC), nos Estados Unidos, as populações de mosquitos aumentaram dez vezes nos últimos 50 anos em Nova York, New Jersey e na Califórnia. Nesse período, o número de espécies de mosquitos também aumentou nessas áreas, de duas a quatro vezes.

"À primeira vista, aumentos recentes nas populações de mosquitos parecem estar ligados às temperaturas em elevação por conta das mudanças climáticas, mas análise cuidadosas dos dados do últimos século mostram que a principal explicação é a recuperação dos efeitos do DDT", disse Kilpatrick, que é professor de ecologia e biologia evolutiva.

O cientista afirma que os efeitos das mudanças climáticas no alastramento de doenças transmitidas por insetos continua sendo uma preocupação importante para a saúde pública. No entanto, o estudo encontrou poucas evidências de que as populações de mosquitos nessas áreas tenham respondido a mudanças de temperatura ou de quantidade de chuvas.

Segundo Kilpatrick, os efeitos das mudanças climáticas são bem evidentes nos limites do alcance geográfico de cada espécie de mosquito, quando espécies adaptadas a climas quentes se movem para o norte, ou espécies adaptadas ao frio, espera-se que elas se movam para o norte de seu alcance geográfico, enquanto as espécies que se adaptam a climas mais frios recuam das partes meridionais de seu habitat.

Levando em conta essa dinâmica, à medida que as temperaturas sobem, espécies tropicais como o Aedes aegypti poderiam expandir seu habitat para além de seu alcance geográfico original, chegando ao norte dos Estados Unidos.

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"No limite mais frio da distribuição de uma espécie, a temperatura importa muito. Em Washington, por exemplo, onde o Aedes aegypti não é comum neste momento, ele poderá se tornar comum se os invernos ficarem mais amenos. Enquanto isso na Flórida, a urbanização e os esforços para o controle dos mosquitos são os fatores que realmente determinam as populações desses insetos", explicou.

Segundo o cientista, a urbanização é um fator importante porque muda a composição das espécies em uma determinada área, favorecendo tipos de mosquitos que vivem próximos dos humanos, como o Aedes aegypti, levando outras espécies ao declínio - como as que são adaptadas a pântanos e florestas, por exemplo.

Os programas de controle de mosquitos ajudam a limitar as populações dos insetos em muitas áreas, mas as técnicas atuais não chegam a ser tão eficazes como o DDT, segundo Kilpatrick.

"Todo mundo sabia que o DDT era um inseticida extremamente eficaz, mas fiquei surpreso com o longo prazo de seus efeitos. Em algumas áreas, levou de 30 a 40 anos para que as populações de mosquitos se recuperassem", disse o pesquisador.

Em 1972, o DDT foi banido nos Estados Unidos por causa dos efeitos ambientais adversos, especialmente nas aves e em outros animais selvagens, além dos potenciais riscos à saúde humana. Ainda assim, o DDT continuou detectável no solo pelo menos até 2000 no Estado de Nova York, onde o veneno foi usado em quantidades muito maiores que nas outras duas regiões estudadas - New Jersey e Califórnia.

Nas três regiões, os pesquisadores constataram que a abundância de mosquitos e o número de espécies caiu radicalmente durante o período de uso de DDT e começou a aumentar gradualmente à medida que a concentração do veneno decaía no ambiente. 

Em Nova York, segundo o cientista, a concentração de DDT no ambiente é mais fortemente associada às flutuações das populações de mosquitos. Em New Jersey e na Califórnia, no entanto, as análises mostraram que a urbanização também foi um fator importante.

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Os cientistas ficaram surpresos com a fraca correlação entre as temperaturas médias anuais e as tendências populacionais dos mosquitos. "A precipitação foi mais importante que a temperatura, mas o uso da terra foi muito mais importante que esses fatores. Os impactos de longo prazo das mudanças do uso da terra nos ecossistemas às vezes são subestimados", disse Kilpatrick.