Ter um paladar que prefere comida cozida e ser capaz de transportar alimentos de um lugar para outro para cozinhá-los não é uma habilidade apenas dos seres humanos. Pesquisadores das universidades de Yale e Harvard constataram que chimpanzés também têm essas características, entendem a transformação de comida crua para cozida e mais: têm a capacidade cognitiva para cozinhar. O novo estudo foi publicado nesta quarta-feira, 3, na revista Proceedings of the Royal Society B.
Os resultados da pesquisa mostraram que a habilidade de cozinhar surgiu cedo na evolução humana e que os chimpanzés têm todos os requisitos para realizar a atividade - exceto a capacidade para controlar o fogo. Estudos anteriores eram mais focados na capacidade humana de controlar o fogo e em como o cozimento permitiu a evolução da espécie, já que os alimentos se tornaram mais fáceis de serem digeridos, permitindo uma maior extração de energia por meio da alimentação.
"Nós pensamos que uma forma de chegar a essa questão é investigar se os chimpanzés, em princípio, têm a capacidade cognitiva crítica para cozinhar. Se nosso parente evolutivo mais próximo possui essas habilidades, isso sugere que uma vez que os primeiros humanos foram capazes de usar e controlar o fogo, eles também puderam usá-lo para cozinhar", explicou à publicação Felix Warneken, coautor da pesquisa.
Em 2011, os estudiosos realizaram uma série experimentos com animais da espécie na República do Congo. No primeiro teste, eles ofereceram batata-doce crua e uma versão cozida por um minuto sem óleo ou manteiga para os animais, que preferiram a segunda opção. O experimento mostrou ainda que os macacos aceitavam esperar pelo cozimento do alimento para obtê-lo.
O teste seguinte tinha como objetivo verificar se os animais eram capazes de compreender o processo de transformação de comida crua para cozida e se eles tentariam cozinhar espontaneamente. Dois dispositivos foram apresentados aos chimpanzés. Um deles transformava a batata-doce crua em fatias cozidas e o outro mantinha o alimento sem alterações.
No procedimento, os animais viram a colocação da batata crua em ambos e tinham de escolher o resultado de uma delas sem ver o "prato pronto". Quase todos os chimpanzés optaram pelo produto do dispositivo que era capaz de cozinhar.
Mas foi o terceiro teste que comprovou que os animais podiam cozinhar. A tarefa era receber o alimento e optar por colocá-lo no dispositivo apropriado para cozimento. Segundo Alexandra Rosati, também autora do estudo, várias pesquisas já haviam mostrado que os chimpanzés tinham problema de autocontrole quando expostos a alimentos, pois tendiam a comê-los. Entretanto, eles escolheram preparar a batata-doce.
Novos testes. Os resultados foram tão animadores que Warneken e Alexandra voltaram ao local no verão seguinte para testar se os chimpanzés eram capazes de repetir o procedimento com outros alimentos. Assim, eles trocaram a batata-doce por cenoura. "Eles ainda eram capazes de generalizar o processo", afirmou Alexandra à publicação.
A percepção de que só alimentos podem ser cozidos também foi constatada quando os pesquisadores deram batata e um pedaço de madeira para os chimpanzés, que levaram as batatas para o dispositivo.
As duas últimas baterias de testes revelaram que os animais conseguem transportar a comida para ser preparada e guardar o alimento para cozimento posterior. No primeiro experimento, ao receber a batata em uma cabine, alguns animais andaram quatro metros para levá-los para o dispositivo de cozimento. No segundo, os estudiosos davam o alimento e voltavam com o dispositivo somente três minutos depois. Embora alguns chimpanzés tenham se precipitado e comido, outros conseguiram esperar o retorno do equipamento.
A conclusão dos estudiosos é de que os mecanismos cognitivos para cozinhar estavam nos primeiros humanos e que eles se desenvolveram a partir do controle do fogo. Eles sugerem ainda que o ato de cozinhar pode ter influenciado na necessidade humana de controlar o fogo.
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