Como as aves voaram pela primeira vez? Entenda o que os dinossauros têm a ver com isso

Demorou 150 milhões de anos para que os dinossauros emplumados dominassem o voo e se tornassem os pássaros que vemos hoje

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Por Carl Zimmer

THE NEW YORK TIMES - Em 1993, “Jurassic Park: Parque dos Dinossauros” ajudou a inspirar Stephen Brusatte, de 9 anos, a se tornar um paleontólogo. Por isso, Brusatte ficou entusiasmado por aconselhar os produtores do filme do ano passado “Jurassic World: Domínio” sobre o que os cientistas aprenderam em relação aos dinossauros desde que ele era criança.

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Ele ficou especialmente feliz ao ver uma das descobertas mais importantes chegar às telas: os dinossauros que ostentavam penas. Mas, a julgar pelos e-mails que ele recebeu, alguns espectadores não compartilharam sua empolgação.

“Muitas pessoas acharam que aquilo foi inventado”, disse Brusatte, professor da Universidade de Edimburgo. “Elas acharam que eram os cineastas tentando fazer algo maluco.”

Longe de ser algo maluco, os dinossauros com penas tornaram-se um fato bem estabelecido, em grande parte graças a um tesouro de fósseis notáveis que foram desenterrados no nordeste da China desde meados da década de 1990. Agora Brusatte e outros paleontólogos estão tentando determinar exatamente como os dinossauros com penas conseguiram voar e se tornaram os pássaros que voam hoje – um mistério evolutivo que se estende por mais de 150 milhões de anos.

Âmbar ajudou a preservar o fóssil de dinossauro com penas Foto: AFP

A primeira grande pista sobre a origem das aves surgiu em 1861, quando trabalhadores de uma pedreira em Solnhofen, na Alemanha, encontraram um fóssil espetacular de uma ave de 145 milhões de anos que veio a ser chamada de Archaeopteryx. Ela tinha asas com penas como pássaros vivos, mas também tinha características encontradas em répteis, como dentes, garras e uma longa cauda óssea.

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Charles Darwin, que havia publicado “A Origem das Espécies” dois anos antes, ficou encantado. O Archaeopteryx se parecia com o que Darwin teria previsto se os pássaros tivessem evoluído de ancestrais reptilianos. “É um grande caso para mim”, disse ele a um amigo.

Por mais grandioso que tenha sido, o Archaeopteryx não encerrou o caso. Ele não revelou, por exemplo, qual grupo de répteis deu origem aos pássaros, nem rastreou como esses ancestrais desenvolveram asas do nada.

Na década de 1970, John Ostrom, paleontólogo da Universidade de Yale, identificou semelhanças entre os esqueletos de pássaros e dinossauros terrestres chamados terópodes, um grupo que inclui o Velociraptor e o Tyrannosaurus rex. Mas nenhum fóssil de terópode preservou asas, muito menos penas. Sem mais evidências, Ostrom e outros paleontólogos discutiram intensamente sobre a origem das aves por décadas.

Em 1996, Pei-ji Chen, paleontólogo do Instituto de Geologia e Paleontologia de Nanjing, na China, compareceu a uma reunião de paleontologia no Museu Americano de História Natural de Nova York, onde entregou um pacote de fotografias a Ostrom.

As fotos mostravam um fóssil de dinossauro com uma franja do que pareciam penas rudimentares. Ostrom ficou tão surpreso que teve que se sentar.

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O fóssil de 125 milhões de anos, agora conhecido como Sinosauropteryx prima, veio da província de Liaoning, no nordeste da China. Foi primorosamente preservado em um manto de cinzas semelhante ao de Pompeia. Desde então, um fluxo constante de fósseis de dinossauros emplumados emergiu da região.

“Existem muitos milhares de dinossauros com penas agora”, disse Brusatte.

À medida que mais fósseis surgiram, os paleontólogos perceberam que os terópodes não eram os únicos dinossauros com penas. Outras espécies tinham versões simples, que pareciam mais fios do que a complexa rede de filamentos interligados encontrados nas penas das aves hoje.

A pesquisa da Universidade de Bristol determinou que o dinossauro não era verde. O Sinosauropteryx possuía cerdas simples, percussoras das penas, em um tom alaranjado com listras brancas na cauda Foto: Jim Robins/AP

Os paleontólogos agora suspeitam que o ancestral de todos os dinossauros tinha penas. E descobertas recentes sugerem que as penas precederam os dinossauros.

Os parentes mais próximos dos dinossauros eram os pterossauros, que voavam como morcegos com membranas que se estendiam das mãos para os lados. Mas eles também tinham penas simples.

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As primeiras penas simples podem ter servido originalmente como isolamento. Os maiores dinossauros podem ter sido capazes de usar o grande volume de seus corpos para reter o calor, razão pela qual parecem ter perdido penas – assim como os elefantes perderam a maior parte de seus pelos.

Nos terópodes, por outro lado, desenvolveram-se penas mais elaboradas. Algumas pareciam uma penugem felpuda. Outros desenvolveram penas complexas que poderiam formar camadas – as primeiras asas.

Os terópodes não podiam usar suas primeiras asas para voar. Algumas espécies do tamanho de cavalos ostentavam asas do tamanho de telas de laptop. Brusatte especulou que os dinossauros usavam essas penas mais elaboradas para se exibirem durante o acasalamento.

Por volta de 160 milhões de anos atrás, os terópodes explodiram em uma mistura bizarra de formas emplumadas. Julia Clarke, paleontóloga da Universidade do Texas, e seus colegas estudaram fósseis descobertos na província de Hebei, na China, de uma espécie impressionante e bizarra chamada Caihong juji. Pigmentos fossilizados nas penas sugerem que seu corpo era preto, enquanto sua cabeça e ombros eram como um arco-íris iridescente.

É difícil descobrir como o Caihong juji usou suas penas. Os pássaros modernos têm penas assimétricas nas asas, que ajudam a direcionar o fluxo de ar para gerar sustentação. Mas o Caihong juji tinha penas assimétricas apenas na cauda.

Os terópodes podem ter inicialmente usado suas penas para gerar sustentação enquanto corriam. Essa habilidade pode ter permitido que eles escalassem encostas mais rapidamente ou até mesmo escalassem as laterais das árvores. Dinossauros com penas como o Caihong juji não tinham músculos para voar como pássaros, mas eles podem ter saltado e planado de maneiras que os cientistas ainda não descobriram.

“Esses organismos são simplesmente estranhos e acho que desafiam nossa lógica”, disse Jingmai O’Connor, paleontólogo do Field Museum em Chicago.

Dinossauros com penas eram mais do que apenas intermediários no caminho para os pássaros como os conhecemos. Eles sobreviveram por dezenas de milhões de anos. “Eles eram claramente bons em tudo o que faziam”, disse Clarke.

O Archaeopteryx pertencia a um ramo da árvore dos dinossauros que mais tarde se adaptou para voar distâncias maiores. Mas os paleontólogos ainda estão divididos sobre o quão bem ele poderia voar. Embora o Archaeopteryx tivesse penas assimétricas em suas asas, ele não tinha um esterno que pudesse ancorar poderosos músculos de voo.

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Mais tarde, cerca de 130 milhões de anos atrás, os primeiros pássaros se dividiram em dois ramos principais, os quais evoluíram independentemente para voadores. A linhagem que deu origem a todas as aves vivas é conhecida como ornituromorfos. Mas foi o outro ramo, chamado de enantiornithes, que dominou os céus por dezenas de milhões de anos.

Em um nível superficial, os enantiornithes se parecem muito com os pássaros de hoje. Mas O’Connor e seus colegas estão descobrindo muita biologia estranha dentro deles.

Aves vivas, por exemplo, normalmente nascem sem penas ou apenas com uma penugem felpuda, e depois suas penas crescem por todo o corpo. Elas gradualmente trocam as penas quando adultas, para que nunca percam a pelagem que mantém seus corpos aquecidos.

Mas as aves enantiornithes parecem ter desenvolvido penas de maneira radicalmente diferente, como O’Connor e seus colegas argumentaram em um estudo recente. Elas eclodiram com corpos nus, mas com asas totalmente emplumadas. À medida que amadureciam, cresciam plumagens em seus corpos. Mas, quando adultas, trocavam as penas do corpo de uma só vez. Até que suas novas penas crescessem, elas tinham que sobreviver sem sua plumagem isolante.

Essa linhagem de pássaros sobreviveu até 66 milhões de anos atrás, quando um asteroide atingiu a Terra. Cerca de três quartos de todas as espécies do planeta foram exterminadas, incluindo todos os dinossauros com penas, exceto os ornituromorfos.

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O’Connor e outros paleontólogos estão investigando por que essas aves sobreviveram quando todos os outros répteis com penas desapareceram. Os destroços do impacto causaram incêndios florestais generalizados, seguidos de escuridão e uma queda nas temperaturas. Os ecossistemas terrestres entraram em colapso. Dinossauros com penas que comiam folhas ou pequenos animais podem ter morrido de fome. Mas os pássaros desenvolveram bicos que lhes permitiam comer as vastas quantidades de sementes enterradas no solo.

O’Connor acha que outros fatores também podem estar em jogo. Depois de prosperar por 70 milhões de anos ou mais, os enantiornithes podem ter se tornado repentinamente vulneráveis no clima frio após o asteroide, quando mudaram todas as suas penas de uma só vez.

“Você os joga em um inverno de impacto, onde agora as temperaturas globais diminuíram e há escassez de recursos, isso vai levá-los ao limite”, disse O’Connor. / TRADUÇÃO LÍVIA BUELONI GONÇALVES

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