Podemos finalmente entender o que está acontecendo dentro de Urano e Netuno, e a resposta é bastante surpreendente: Eles podem conter cada um um oceano de água.
“Não sabíamos realmente nada antes”, sobre seus interiores, disse Adam Masters, cientista espacial e planetário do Imperial College London. “Essa hipótese é muito convincente.”
A ideia sobre os dois planetas gigantes gelados — assim chamados devido às condições de congelamento em que se formaram — foi proposta por Burkhard Militzer, cientista planetário da Universidade da Califórnia, Berkeley, e foi publicada na segunda-feira nos Anais da Academia Nacional de Ciências. Essa teoria poderia explicar os estranhos campos magnéticos de ambos os planetas que são diferentes de qualquer outro no Sistema Solar.
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O campo magnético da Terra é gerado em seu núcleo, produzindo um claro polo norte e sul conhecido como um dipolo que se alinha aproximadamente com o eixo do planeta. “É como se houvesse um grande ímã de barra dentro do planeta”, disse Heidi Hammel, astrônoma e cientista planetária na Associação de Universidades para Pesquisa em Astronomia. “Isso é verdade para Júpiter, Saturno, Terra e algumas das luas de Júpiter também.”
Quando a espaçonave Voyager 2 da Nasa, agência espacial americana, passou por Urano em 1986, no entanto, descobriu algo incomum. “O campo magnético estava muito inclinado e deslocado do centro do planeta”, disse Hammel.
Inicialmente, os cientistas pensaram que o campo desordenado poderia ser explicado por um impacto gigante suspeito no início da vida de Urano, que havia jogado o planeta de lado. Mas então a espaçonave passou por Netuno três anos depois e “seu campo magnético também estava significativamente inclinado”, disse Hammel.
A proposta de Militzer visa a encerrar esse debate. Ela é baseada na simulação do movimento de 500 átomos para modelar o interior dos dois gigantes gelados, e sugere que há uma camada de água com cerca de 8 mil quilômetros de espessura dentro dos dois planetas, situada abaixo de suas atmosferas externas.
“Acreditamos que seja um oceano”, disse Militzer. “Há hidrogênio misturado com ela, e isso tem alta condutividade, que é importante para o campo magnético.”
No entanto, esse oceano teria uma pressão 60 mil vezes maior do que a da superfície da Terra. Então, se comportaria mais como fluido supercrítico — uma combinação de gás e líquido — do que como água na Terra.
Crucialmente, essa água estaria separada, como óleo e água, de uma camada rica em carbono abaixo que divide o oceano do núcleo de cada planeta. No caso de Urano, o núcleo é do tamanho de Mercúrio e o de Netuno é um pouco maior, superior ao tamanho de Marte.
Anteriormente, os cientistas pensavam que os interiores dos dois planetas seriam mais misturados. “A novidade é que a água se separa do carbono”, disse Militzer.
Geralmente, ele acrescentou, “quando acumula hidrogênio por cima, a camada de água se dissolve”. Mas os gigantes gelados podem ter se formado com menos hidrogênio do que Júpiter e Saturno por causa de sua maior distância do sol.
Essa camada de água, e não os núcleos planetários, seria então responsável por produzir os campos magnéticos desordenados dos dois planetas.
A ideia de Militzer poderia explicar uma diferença chave entre Júpiter e Saturno, compostos principalmente de hidrogênio, e Urano e Netuno. “O primeiro passo para entender nosso sistema solar é a diferença entre os gigantes gasosos e os planetas terrestres”, disse Fran Bagenal, professora de Astrofísica e Ciências Planetárias na Universidade do Colorado, Boulder, e membro da equipe científica da Voyager, “depois os planetas de hidrogênio e os gigantes gelados.”
A descoberta também poderia informar um retorno proposto a Urano na próxima década pela Nasa. Essa espaçonave poderia levar instrumentos para medir a estrutura interna e o campo magnético de Urano, que seriam capazes de investigar a presença dessa camada de água.
“É apenas mais um motivo para voltarmos”, disse Bagenal.
Este artigo foi originalmente publicado em The New York Times.
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