Entenda o que é o ‘oxigênio negro’, a descoberta que pode alterar a teoria sobre a origem da vida

Pesquisadores identificaram a formação no mar profundo do Oceano Pacífico a partir de nódulos polimetálicos

PUBLICIDADE

Por Pedro Pannunzio

O mundo científico foi surpreendido nesta semana com uma descoberta que pode romper paradigmas. Pesquisadores encontraram, nas profundezas do Oceano Pacífico, na costa do México, oxigênio formado a partir de nódulos polimetálicos. Essa é a primeira vez que um estudo encontra indícios de produção de oxigênio que não é formado por seres vivos.

PUBLICIDADE

“Para a vida aeróbica começar no planeta, tinha de haver oxigênio. E nosso entendimento era de que o suprimento de oxigênio da Terra começou com organismos fotossintéticos. Mas, agora, sabemos que há oxigênio produzido no fundo do mar, onde não há luz”, disse Andrew Sweetman, o pesquisador que liderou o estudo, em comunicado divulgado pela Associação Escocesa de Ciências Marinhas, instituição a que é vinculado.

“Portanto, precisamos revisitar questões como: onde a vida aeróbica poderia ter começado?”, acrescenta o pesquisador.

Paulo Sumida, diretor do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP), explica que os nódulos metálicos “são pequenas bolinhas do tamanho de uma batata, ricas em manganês, ferro e outro metais raros que são importantes para a indústria da tecnologia, para fazer baterias ou painéis solares”.

Publicidade

Descoberta de 'oxigênio negro' em pedaços de metal no fundo do mar pode resultar em nova explicação sobre a vida marinha. Foto: Escritório de Exploração e Pesquisa Oceânica da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA

A descoberta ocorreu durante a realização de estudos para avaliar possíveis impactos da mineração em águas profundas. Na região em que o estudo foi feito, os nódulos polimetálicos ficam a cerca de 4 mil metros abaixo da superfície.

Com base no estudo publicado na revista científica Nature Geoscience, Sumida diz que a formação de oxigênio se daria a partir de um processo de eletrólise, em que as moléculas de água são quebradas e divididas em hidrogênio e oxigênio.

De acordo com o comunicado da Associação Escocesa de Ciências Marinhas, para que esse processo de quebra ocorra, uma voltagem de pelo menos 1,5 volts precisa ser alcançada.

A equipe identificou, na superfície de alguns nódulos, 0,95 volts, o que indicaria que voltagens significativas podem ser atingidas quando os nódulos estão agrupados.

Publicidade

Os pesquisadores “tamparam” alguns nódulos com um equipamento que impediu a entrada e saída de qualquer substância, com o intuito de avaliar o consumo de oxigênio.

“Se tampa, a tendência é que o oxigênio seja consumido, mas eles viram que ao invés disso, houve aumento de oxigênio. Em alguns casos, o aumento foi bastante significativo”, diz Sumida.

O ineditismo da descoberta causou desconfiança no meio científico, que, inicialmente, não acreditou que esse processo seria possível, conta Sumida. “Eu conversei com o Andrew (Sweetman) e ele me disse ‘eu estou tentando publicar, mas o pessoal não acredita. Os editores da revista acham que é um erro.’”

No começo da elaboração do estudo, o próprio Sweetman não acreditou no que estava vendo. “Quando recebemos esses dados pela primeira vez, pensamos que os sensores estavam com defeito, porque todos os estudos já realizados em águas profundas identificaram o oxigênio sendo consumido, não produzido. Voltávamos para casa e recalibrávamos os sensores, mas, ao longo de 10 anos essas leituras estranhas de oxigênio continuaram aparecendo”, conta.

Publicidade

Paulo Sumida acredita que a descoberta pode alterar significativamente a forma como compreendemos a vida marinha, já que, se comprovado que o processo ocorre em larga escala, o oxigênio produzido pode ser imprescindível para a sobrevivência desse ecossistema. “Pode ser que se isso não existisse (formação de ‘oxigênio negro’), os níveis de oxigênio do mar profundo fossem menores e isso poderia impactar toda a fauna marinha.”

O diretor Instituto Oceanográfico, no entanto, diz que é preciso ter cautela e, antes de qualquer conclusão definitiva, é preciso compreender em quais proporções o fenômeno ocorre. “A gente tem que botar o pé no chão, porque não é uma descoberta que está ratificada e é preciso fazer mais estudos. A gente ainda não sabe o quão significativo ele é.”

Leia aqui o estudo completo.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.