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Opinião | O adoçante sucralose modula resposta imune: uma pista para futuros remédios?

Cientistas resolveram estudar o que ocorre em camundongos quando eles são alimentados com a dose máxima de sucralose, todo dia, por toda a vida. A resposta pode oferecer pistas a novos tratamentos

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Foto do author Fernando Reinach
Atualização:

Tentando controlar meu peso, sou um ávido consumidor de adoçantes sintéticos. Essas moléculas se ligam a um receptor em nossas papilas gustativas provocando uma sensação muito semelhante à ingestão de açúcar, ou seja, adoçam os alimentos. Meu adoçante preferido é a sucralose porque quase não deixa um gosto ruim na boca.

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A sucralose é uma molécula de sacarose (o nosso açúcar comercial) onde três átomos de carbono foram substituídos por cloro. A sucralose é 600 vezes mais doce que o açúcar. Isso quer dizer que precisamos colocar no café 600 vezes menos sucralose que açúcar. Ou seja, consumimos muito pouca sucralose. Além disso, a sucralose não é metabolizada no nosso corpo (por isso não engorda) e 85% sai nas fezes sem ser absorvida no intestino.

Da parte que é absorvida, a maioria é excretada na urina. Ela é uma molécula muito bem estudada e considerada segura. Por esse motivo, os órgãos de saúde dos EUA e da Europa aprovaram seu uso contanto que as pessoas consumam menos de 5 a 15 miligramas de sucralose por dia, por quilo de peso. Uma pessoa de 80 kg teria que consumir por volta de 800 mg de sucralose por dia para atingir o limite.

A sucralose é 600 vezes mais doce que o açúcar. Isso quer dizer que precisamos colocar no café 600 vezes menos sucralose que açúcar Foto: VALERIA GONCALVEZ/ESTADAO - 08-01-2019

Como um envelope de adoçante contém aproximadamente 12 mg de sucralose, uma pessoa de 80 kg teria que consumir 66 saquinhos por dia, todo dia, para chegar perto do limite considerado seguro.

A novidade é que os cientistas resolveram estudar o que ocorre em camundongos quando eles são alimentados com a dose máxima de sucralose, todo dia, por toda a vida. Para conseguir que os camundongos ingerissem essas altas doses, a sucralose foi adicionada à água fornecida aos camundongos durante três meses. E esses camundongos foram comparados com camundongos que bebiam água pura.

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Os cientistas concentraram sua análise no efeito da sucralose sobre o sistema imune. O que eles descobriram é que em situações normais, quando o sistema imune não é desafiado, a enorme maioria dos parâmetros de funcionamento do sistema não é alterado pela sucralose. Mas quando o sistema imune é desafiado, a sucralose retarda a ativação das células T. Assim, quando o camundongo é submetido a uma infecção intestinal a resposta das células T é retardada e demora mais para o sistema imune responder.

O mesmo ocorre quando o sistema imune é desafiado a responder a células de outro organismo, como ocorre em um transplante ou tem que combater tumores. Em todos esses casos a resposta é mais lenta. Os experimentos mostram que a sucralose em doses muito altas afeta a estrutura da membrana das células T e dificulta sua ativação, alterando a entrada de cálcio na célula, o que é necessário para a ativação. Esse efeito é restrito às células T.

Num primeiro momento, esses resultados parecem ser uma espécie de condenação do uso de sucralose, ou ao menos uma advertência de que a sucralose pode inibir o sistema imune. Mas, como os cientistas enfatizam no trabalho, isso só ocorre em doses muito altas nos camundongos (é bom lembrar que esses estudos ainda não foram repetidos em humanos). E as doses usadas regularmente pelos consumidores muito provavelmente não tem esse efeito.

O mais interessante dessa descoberta é o uso potencial da sucralose como um medicamento para tratar doenças causadas por uma ativação exagerada do sistema imune. Essa ativação exagerada ocorre nas doenças autoimunes e nos transplantes. Nesses casos, o sistema imune fica por demais ativado e passa a atacar o próprio corpo.

Um exemplo desse tipo de doença é o diabetes de tipo 1, onde o sistema imune ataca as células que produzem insulina no pâncreas. No mesmo trabalho, os cientistas demonstraram que, em uma linhagem de camundongo que desenvolve diabetes tipo 1, o tratamento com doses altas de sucralose retarda o aparecimento do diabetes.

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A conclusão do trabalho é que a sucralose, nas doses que é consumida como adoçante, continua a ser muito segura, mas que em altas doses retarda a ativação do sistema imune. Esse efeito é prejudicial nos casos em que nossa saúde precisa de um sistema imune rápido e eficiente, mas pode ser muito benéfico quando uma resposta exacerbada do sistema imune é a causa da doença.

De minha parte, vou continuar a usar sucralose em doses baixas para adoçar meu cafezinho e esperar o dia em que talvez a sucralose, em doses cavalares, se torne um remédio útil para combater doenças autoimunes. Esse é mais um exemplo do velho ditado que diz que a dose é o que separa o remédio do veneno.

Mais informações: The dietary sweetener sucralose is a negative modulator of T cell-mediated responses. Nature https://doi.org/10.1038/s41586-023-05801-6 2023

Fernando Reinach é biólogo

Opinião por Fernando Reinach

Biólogo, PHD em Biologia Celular e Molecular pela Cornell University e autor de "A Chegada do Novo Coronavírus no Brasil"; "Folha de Lótus, Escorregador de Mosquito"; e "A Longa Marcha dos Grilos Canibais"

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