Grande geleira do ‘Juízo Final’ corre maior risco de derreter do que cientistas acreditavam

Pesquisa mostra que água salgada e quente passa por cavidades da geleira e pressiona os blocos de gelo

PUBLICIDADE

Foto do author Ramana Rech

A grande geleira Thwaites, conhecida como “Geleira do Juízo Final” e situada na Antártida, corre maior risco de derreter do que cientistas acreditavam. Água salgada e quente passa por vários quilômetros abaixo dela, o que pode torná-la ainda mais vulnerável.

PUBLICIDADE

A conclusão faz parte de uma pesquisa realizada por uma equipe de glaciologistas das Universidade de Califórnia (Estados Unidos), Universidade de Waterloo (Canadá). O artigo foi publicado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences, na segunda-feira, 20.

A nova informação é alarmante porque o derretimento da Thwaites pode provocar um aumento de 65 centímetros do nível do mar.

A geleira Thwaites corre maior risco do que os cientistas acreditavam Foto: NASA/Jim Yungel

De acordo com a pesquisa, água quente do oceano ganhou acesso às cavidades de geleiras por conta do aumento da intensidade de ventos vindos do oeste. Esses ventos, por sua vez, são resultado da combinação entre o rápido aquecimento global e o esfriamento da segunda camada da atmosfera na Antártida.

Publicidade

A água acumulada nas cavidades e dutos das geleiras cria pressão suficiente para elevar os blocos de gelo.

Outro ponto de preocupação é que a água salgada precisa de uma temperatura mais baixa para congelar do que a doce. Apesar da diferença não ser grande – a água doce congela a 0ºC enquanto a salgada a -2ºC – ela é suficiente para provocar grande derretimento das geleiras.

Os pesquisadores reuniram dados de março a junho de 2023 pela missão de satélites comerciais da Finlândia, ICEYE. A frota de satélites da missão forma uma constelação na órbita polar ao redor do planeta. Com a ferramenta, os pesquisadores puderam obter dados em longo prazo. Antes disso, eles tinham apenas informações esporádicas.

Com os novos recursos, foi possível concluir que a geleira apresenta um recuo de 0,5 km por ano. O dado é consistente com os 0,6km/ano observados entre 2011 e 2010 e é metade da taxa observada entre 1992 e 2011 de 1 km/ano.

Publicidade

O autor líder do estudo e professor da Universidade da Califórnia e cientista da Agência Aeroespacial dos Estados Unidos (Nasa), Eric Rignot, acredita que o estudo irá trazer benefícios a longo prazo para modelos de interação entre o oceano e as geleiras.

“Se nós pudermos adicionar o processo destacado no artigo, que não é incluso na maioria dos modelos, as reconstruções devem concordar muito melhor com as observações”, diz.

Os pesquisadores ainda não sabem quanto tempo pode levar até que a intrusão de água na Thwaites se torne irreversível. Eles pretendem aprimorar os modelos para poder predizer se é questão de décadas ou séculos.

Em 2019, uma pesquisa da Nasa encontrou uma caverna de 300 metros de altura que crescia no centro da geleira. O buraco era grande o suficiente para caber 14 bilhões de toneladas de gelo. Mas a maior parte dele havia derretido apenas nos últimos três anos

Publicidade

Derretimento de geleiras atinge recorde

Um relatório publicado em 2023 pela Organização Meteorológica Mundial (OMM) indicou que a taxa de aumento médio do nível global do mar dobrou entre a década de 1993 e 2022 e a década encerrada em 2022, o que representa um recorde.

Além disso, 58% da superfície de do oceano experimentou ao menos uma onda de calor marinho em 2022. Esse número também ultrapassou os anos anteriores.

A Organização das Nações Unidas (ONU) alertou que o aumento do nível do mar significa uma sentença de morte para os países mais vulneráveis a esse crescimento. Quase 900 milhões de pessoas vivem em áreas costeiras baixas.

“As comunidades baixas e países inteiros poderiam desaparecer, o mundo testemunharia um êxodo em massa de populações inteiras em escala bíblica e a competição por água doce, terra e outros recursos se tornaria cada vez mais acirrada”, afirmou o secretário-geral da ONU António Guterres.

Publicidade

Leia o estudo completo na revista PNAS.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.