A senadora Mara Gabrilli (PSD-SP) esteve em Nova York, nos Estados Unidos, nos últimos dias para conhecer e testar um exoesqueleto da startup francesa Wandercraft, um dos mais avançados do mundo. Segundo sua equipe e a médica que a acompanhou na viagem, Linamara Rizzo Battistella, que também é professora titular de fisiatria da Universidade de São Paulo (USP), a ideia é trazer a tecnologia para o Brasil.
O robô funciona como um esqueleto fora do corpo. A pessoa veste o equipamento e consegue se levantar, andar e fazer movimentos multidimensionais. Ele também tem um sistema central de equilíbrio que impede que a pessoa caia ou necessite do apoio de andador, como é o caso dos exoesqueletos usados hoje no Brasil. “É um universo de possibilidades que se abre”, disse a parlamentar, que ficou paraplégica em um acidente em 1994.
Segundo Linamara, um projeto de estudo clínico do robô no Brasil já vem sendo desenvolvido pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) após a conversa com a empresa, que manifestou interesse em trazer seu produto para o País.
Com o estudo, será possível avaliar efetivamente os ganhos da tecnologia para o quadro clínico de pessoas que têm lesão medular, entre outras condições que causam paralisia ou perda parcial de movimentos. Além disso, os pesquisadores pretendem analisar as possibilidades de o SUS em implementar o equipamento na rede.
Em entrevista ao Estadão, a médica disse que a ideia é tentar parceria com a Wandercraft para que a empresa abra um polo industrial no Brasil para produzir a tecnologia internamente, em conjunto com os cientistas brasileiros que já vêm trabalhando nesse tipo de desenvolvimento robótico. Isso, segundo ela, baratearia os custos do robô e colaboraria para o desenvolvimento da ciência brasileira.
A médica defende que o Atalante, que ela chamou de “o mais completo do mercado,” seja disponibilizado no SUS para atender a pacientes, em especial para tetraplégicos, na reabilitação e em centros de atividades físicas contínuas. “Hoje, a pessoa faz a reabilitação por determinado tempo e depois para. Isso faz com que ela perca a evolução, pois o corpo precisa de movimentos constantes para que haja qualidade de vida”, diz ela, idealizadora da Rede Lucy Montoro, estrutura de apoio à reabilitação do governo paulista.
Diferentemente de outros exoesqueletos, o modelo do Atalante não é acionado pelo impulso cerebral. Não há eletrodos conectados ao cérebro do paciente,
Alto custo é uma das barreiras
Diferentemente do Atalante, os exoesqueletos que existem hoje no Brasil não são modulares, por isso, não podem ser ajustados para todos os tipos de pacientes, e custam cerca de US$ 180 mil (R$ 900 mil). Pelo alto custo, ficam restritos a centros especializados e focados nos trabalhos de reabilitação, que não é contínuo.
João Antônio Matheus Guimarães, presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT) diz que a tecnologia é de ponta e veio para ficar. Ele reconhece os ganhos para os pacientes, em especial por permitir que as pessoas fiquem em pé, o que traz benefícios para o funcionamento de alguns órgãos, como o pulmão.
No entanto, o representante da SBOT acredita que a tecnologia provavelmente não caberá no orçamento do SUS. “Temos dificuldade de implementar até mesmo as medidas de prevenção desse tipo de quadro, como prevenção de acidentes de trânsito - que são a principal causa dos traumas - e de acidentes vasculares cerebrais, quanto mais para disponibilizar tecnologias tão avançadas como essa”, diz.
Guimarães pontua que o robô, ao chegar no Brasil, deve ir primeiro para a rede privada e centros de referência do SUS, como é o caso do Hospital das Clínicas. Mas, se de fato houver um polo industrial interno, os preços podem se tornar mais acessíveis, havendo uma possibilidade de expansão. O preço do Atalante não foi divulgado.
No Brasil, um dos projetos mais famosos nesta área é do neurocientista Miguel Nicolelis. Ele prometeu, na abertura da Copa do Mundo de 2014, fazer uma paraplégico levantar da cadeira de rodas, caminhar no gramado da Arena Corinthians e chutar uma bola usando uma veste robótica (exoesqueleto) controlada pelo cérebro. A apresentação, porém, frustrou uma parte da comunidade científica, uma vez que o jovem levado ao estádio fez apenas um pequeno movimento no dia da estreia do torneio.
Dois anos depois, Nicolelis e a equipe publicaram artigo na revista Scientific Reports dizendo que seis homens e duas mulheres que haviam perdido completamente o uso das pernas haviam apresentado avanços significativos no processo de retomar funções motoras. Parte deles havia recuperado até a vida sexual.
Após a repercussão nas redes sociais do vídeo em que Mara Gabrilli testa o exoesqueleto, Nicolelis publicou nas redes sociais uma fotografia do novo equipamento que, segundo ele, está em desenvolvimento com colegas da Universidade de Duke (EUA). Ainda conforme o pesquisador, o robô de baixo custo responde à atividade elétrica do cérebro do usuário, que usa apenas um iPhone para controle eletrônico e digital do sistema.
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