Em dezembro de 1938, três cientistas que trabalhavam em um laboratório em Berlim, na Alemanha, fizeram uma descoberta que alteraria para sempre o curso da história: eles conseguiram dividir um átomo de urânio. A energia liberada nessa divisão, ou fissão, seria suficiente para criar uma bomba infinitamente mais poderosa do que as existentes na época. Mas antes que essa arma pudesse ser construída, vários problemas técnicos teriam ainda que ser superados.
Quando Albert Einstein (1879-1955) soube que os alemães estariam no caminho de superar tais obstáculos e criar um explosivo de potência inédita, ele escreveu uma carta ao então presidente dos Estados Unidos Franklin D. Roosevelt alertando para os riscos de os nazistas terem em mãos uma arma tão poderosa. A carta de Einstein, escrita em 1939, acabou levando o governo americano a criar, dois anos depois, o Projeto Manhattan, cujo objetivo seria desenvolver uma bomba atômica preferencialmente antes dos alemães.
Nesta quinta-feira, 20, chegou aos cinemas o filme Oppenheimer sobre a história do físico teórico americano Julius Robert Oppenheimer (1904-1967) e o seu papel na criação da bomba atômica. Ele liderou o Projeto Manhattan, responsável pelo desenvolvimento das primeiras armas nucleares, e se tornou mundialmente conhecido como “o pai da bomba atômica”. O lançamento do filme, por consequência, renovou a curiosidade sobre a trajetória de Albert Einstein.
“Quando os alemães anunciaram que tinham conseguido quebrar o núcleo de um átomo, todos imediatamente perceberam que estavam diante de uma fonte de energia que não se igualava a nenhuma outra”, contou o físico Olival Freire, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e especialista em história da Ciência.
“Ora, a guerra já estava em curso na Europa, a Alemanha estava sob o controle dos nazistas, o país era uma potência científica e tinha um dos maiores nomes da física da época, Werner Heisenberg (1901-1976). Havia um receio real de que eles pudessem chegar à bomba primeiro.”
Duas outras descobertas científicas, feitas em 1940 e 1941, demonstraram conclusivamente que o desenvolvimento da bomba era factível, fazendo com que o governo dos EUA fizesse da fabricação da arma uma prioridade absoluta: a determinação da massa crítica de urânio necessária para criar o explosivo e a confirmação de que o plutônio também poderia ser submetido à fissão e igualmente ser usado numa bomba.
“Depois que entenderam o processo de fissão, faltava ainda saber o quanto era necessário para enriquecer o urânio e qual seria a massa crítica necessária para gerar um processo descontrolado, em cadeia”, explicou a física nuclear Debora Peres Menezes, diretora do CNPq e integrante da Academia Brasileira de Ciência (ABC). “A massa vai ter um quilo ou uma tonelada? Até então ninguém sabia.”
O escritório de inteligência das Forças Armadas dos EUA, no entanto, negou uma autorização de segurança necessária para que Albert Einstein trabalhasse no projeto por conta de seu ativismo político de esquerda. As centenas de cientistas que trabalharam no projeto também foram proibidas de consultar o físico alemão sobre o desenvolvimento da bomba.
“Einstein não trabalhou efetivamente no desenvolvimento da bomba, seu papel nessa história foi, de fato, enviar a carta a Roosevelt”, contou Olival Freire. “Mas ele era a personalidade científica mais conhecida do mundo, estava exilado nos EUA, tinha uma influência política muito grande.”
Embora nunca tenha trabalhado diretamente no desenvolvimento da bomba atômica, Einstein é frequentemente associado erroneamente à criação de armas nucleares. Sua famosa equação E = mc2, de fato, explica a energia liberada por uma bomba atômica, mas não explica como construí-la.
Repetidamente o físico alemão lembrava às pessoas: “Não me considero o pai da liberação da energia atômica. Minha parte nisso foi bastante indireta”.
Mesmo assim, com muita frequência, ele era questionado sobre o seu papel no desenvolvimento da bomba. A resposta de Einstein era sempre a mesma, que seu único papel na história tinha sido escrever ao presidente sugerindo que os Estados Unidos pesquisassem as armas nucleares antes que os alemães dominassem a tecnologia letal.
Posteriormente, inclusive, ele se disse arrependido. “Se eu soubesse que os alemães não conseguiriam desenvolver a bomba, eu não teria feito nada.”
De fato, por inúmeras razões, os alemães não chegaram nem perto de conseguir criar uma bomba atômica, enquanto os americanos acabaram conseguindo fabricá-la em tempo recorde. Em 6 de agosto de 1945, os EUA lançaram uma bomba atômica sobre a cidade japonesa de Nagasaki e, três dias depois, a vizinha Hiroshima também foi bombardeada. Até o fim daquele ano, estima-se que 200 mil pessoas tenham morrido nas duas cidades.
Correções
Diferentemente do informado na versão original da matéria, o lançamento das bombas atômicas no Japão foi nos dias 6 e 9 de agosto de 1945.
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