Osso 'decorado' revela rituais de canibalismo no Paleolítico

Encontrado em caverna no sudoeste da Inglaterra, osso de mais de 15 mil anos apresenta cortes em zigue-zague, fraturas e marcas de dentadas humanas; padrões dos cortes indica que antropofagia era ligada a ação ritualística

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Cientistas britânicos descobriram um osso com marcas que, segundo eles, revelam rituais de canibalismo entre os homens do período Paleolítico. A pesquisa, publicada hoje na revista científica Plos One, foi liderada por Silvia Bello, doMuseu de História Natural do Reino Unido.

O osso - o rádio de um antebraço humano - foi encontrado na caverna de Gouhg em Somerset, no sudoeste da Inglaterra e pertenciam a indivíduos que faziam parte da cultura Magdaleniana, a mais tardia da era paleolítica, conhecida pelas pinturas rupestres de Lascaux (França) e Altamira (Espanha), que dominou parte da Europa de 19 mil a 14 mil anos atrás, aproximadamente.

Osso de indivíduo que viveu no Paleolítico, encontrado em caverna na Inglaterra, apresenta padrões gravados em zigue-zague, que jamais haviam sido observados antes, além de cortes, marcas de percussão e de dentadas humanas. Foto: Bello et al (2017)

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De acordo com os autores do estudo, ossos humanos com cortes e sinais de fraturas são frequentemente encontrados em sítios arqueológicos Magdalenianos da Europa. Na caverna de Gough, onde foram descobertas algumas das maiores coleções de ossos humanos desse período, os cientistas já haviam encontrado vestígios de canibalismo anterioremente.

Entretanto, os pesquisadores até agora não sabiam se os entalhes encontrados nos ossos eram intencionais - o que indicaria ligação com algum tipo de ritual -, ou se eram apenas marcas deixadas casualmente pelos 'açougueiros' antropófagos. 

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O novo osso, segundo os autores do estudo, confirma que o canibalismo entre os homens do Paleolítico fazia mesmo parte de um ritual com vários estágios. De acordo com eles, o osso apresenta, em um dos lados, padrões em zigue-zague que jamais haviam sido observados antes, além de cortes, marcas de percussão e de dentadas humanas. 

"A sequência de modificações produzidas nesse osso sugerem que a gravação era um componente intencional da prática antropofágica, rico em conotações simbólicas. Embora análises anteriores tenham sido capazes de indicar que o canibalismo era praticado como um ritual simbólico na caverna de Goughs, este novo estudo fornece a mais forte evidência disso até agora", disse Silvia.

Artefatos da cultura Magdaleniana encontrados em caverna na Inglaterra: para investigar se os cortes em zigue-zague eram resultado de uma gravação intencional, os cientistas as submeteram a análises morfométricas e compararam os resultados com os de marcas deixadas em utensílios do mesmo período. Foto: Bello et al (2017)

Para investigar se os cortes em zigue-zague eram resultado de uma gravação intencional, os cientistas as submeteram a análises macro e micro-morfométricas e compararam os resultados com os de marcas deixadas em outros artefatos do mesmo período. A cultura Madgaleniana se destacava por produzir utensílios entalhados em ossos.

Os pesquisadores dizem que só podem fazer especulações sobre o significado das gravações encontradas nos ossos humanos, mas afirmam que elas representam um exemplo único e precoce de comportamento funerário canibalístico que não havia sido reconhecido antes no período Paleolítico.

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