Oumuamua é lixo espacial alienígena, asteroide ou cometa? Estudo dá pista sobre visitante misterioso

Dois astrônomos dos Estados Unidos dizem ter descoberto “uma explicação surpreendentemente simples” para o objeto encontrado em 2017 no Havaí

PUBLICIDADE

Por Dennis Overbye
Atualização:

Era lixo espacial alienígena? Um asteroide interestelar errante? Ou um cometa estranho de outro Sol? Desde 2017, quando astrônomos no Havaí descobriram um objeto que chamaram Oumuamua (“batedor”) atravessando o Sistema Solar, eles discutiram sobre o que era. Os telescópios viram apenas um ponto em movimento que já estava voltando para a escuridão interestelar. Os astrônomos deduziram que era avermelhado, em forma de charuto ou panqueca, e talvez com algumas centenas de metros de comprimento. Até o momento, todos os cometas observados em nosso sistema solar variaram de cerca de meia milha a centenas de quilômetros de diâmetro. (O cometa Halley tem cerca de 11 quilômetros de largura.)

PUBLICIDADE

Inicialmente, o Oumuamua foi classificado como um asteroide, pois não exibia nenhum dos chiados e flashes típicos dos cometas. (Os cometas são basicamente bolas de neve sujas; quando aquecidos pela luz solar, eles emitem jatos de vapor, dióxido de carbono e poeira, que criam caudas brilhantes ou comas.) Não havia evidência de gás ou de poeira ao redor do objeto, e os radiotelescópios não ouviram nada semelhante.

Mas uma análise mais aprofundada revelou que algo estava fazendo Oumuamua acelerar ao sair do Sistema Solar, deixando os cientistas com um delicioso quebra-cabeça.

Agora, dois astrônomos descobriram o que chamam de “uma explicação surpreendentemente simples” para o comportamento de Oumuamua: o objeto era um cometa, afinal, impulsionado por quantidades minúsculas de gás hidrogênio jorrando de um núcleo gelado.

Publicidade

Ilustração mostra o visitante interestelar rebelde 'Oumuamua (pronuncia-se oh-MOO-ah-MOO-ah) correndo em direção aos arredores de nosso Sistema Solar.  Foto: NASA, ESA and Joseph Olmsted and Frank Summers of STScI/Handout via Reuters

“Mostramos que esse mecanismo pode explicar muitas das propriedades peculiares de Oumuamua sem ajuste fino”, escrevem Jennifer Bergner, astroquímica da Universidade da Califórnia, em Berkeley, e Darryl Z. Seligman, da Universidade de Cornell, em um artigo publicado na quarta-feira na Nature. “Isso fornece mais evidências de que Oumuamua se originou como uma relíquia planetesimal amplamente semelhante aos cometas do Sistema Solar.”

Em um comunicado divulgado pela Universidade da Califórnia, em Berkeley, Seligman disse: “O que é bonito na ideia de Jenny é que é exatamente o que deveria acontecer com os cometas interestelares. Tínhamos todas essas suposições estúpidas, como icebergs de hidrogênio e outras coisas malucas, e é apenas a explicação mais genérica.”

Em um e-mail, Karen Meech, especialista em cometas do Instituto de Astronomia da Universidade do Havaí, que estudou Oumuamua exaustivamente, chamou o artigo de “uma explicação muito interessante”. “Não estou disposta a dizer que ‘resolve’ as coisas - a prova cabal seria detectar hidrogênio espectroscopicamente”, acrescentou ela. “Mas é muito plausível, e se outro objeto for descoberto que se pareça com Oumuamua, então todos esses modelos e explicações fornecem muita orientação para as observações. Estou impressionada com a quantidade de trabalho necessário para explicar esse único objeto – muito esforço criativo foi feito para obter o melhor entendimento possível.”

A controvérsia não deve desaparecer tão cedo. Avi Loeb, um astrônomo de Harvard que propôs que Oumuamua poderia ter sido uma vela solar ou algum outro artefato alienígena, foi rápido em discordar do novo estudo. “Os autores do novo artigo afirmam que era um cometa de gelo de água, embora não tenhamos visto a cauda do cometa”, disse Loeb em um e-mail. Ele acrescentou: “Isso é como dizer que um elefante é uma zebra sem listras.”

Publicidade

Bergner e Seligman começaram a colaborar em uma solução para o mistério de Oumuamua como pós-doutorandos na Universidade de Chicago. “Nunca vimos um cometa no Sistema Solar que não tivesse um coma de poeira”, disse Seligman. “Portanto, a aceleração não gravitacional era realmente estranha.”

Bergner, especialista na química do gelo no espaço sideral, questionou se o gás hidrogênio molecular, o elemento mais leve, abundante e volátil do Universo, poderia ser o responsável pela propulsão do cometa. Mas de onde teria vindo o gás? Ele descobriu que experimentos de laboratório feitos desde a década de 1970 mostraram que, quando o gelo é atingido por partículas de alta energia, suas moléculas podem se separar, deixando pequenas bolhas de gás hidrogênio presas a vários metros de profundidade no gelo. “Um cometa viajando pelo meio interestelar basicamente está sendo cozido pela radiação cósmica, formando hidrogênio como resultado”, disse Bergner em um comunicado divulgado pela Universidade da Califórnia, em Berkeley.

Ela acrescentou em um e-mail: “O gelo de água em sua forma amorfa tem uma estrutura fofa contendo bolsas onde outras moléculas voláteis podem ficar presas. À medida que o gelo é aquecido, ele se reorganiza em uma estrutura mais estável e compacta”. Esse processo, disse ela, “leva ao colapso desses bolsões e à formação de canais dentro do gelo, através dos quais o gás aprisionado pode escapar”.

Para um cometa de tamanho normal, essa liberação de gás teria um efeito insignificante, disse Bergner. “Mas porque Oumuamua era tão pequeno é que achamos que realmente produziu força suficiente para alimentar essa aceleração.”

E qualquer poeira no gelo ficaria presa ali, tirando grande parte do espetáculo da cauda do cometa. De fato, nos últimos anos, astrônomos como Seligman e seus colegas detectaram meia dúzia de cometas “escuros”: pequenos corpos que exibem aceleração, mas não têm comas ou caudas observáveis. Os jatos de hidrogênio provavelmente não são os culpados em todos os casos, disse Bergner, mas “juntos, eles revelam que há muito a ser aprendido sobre a natureza dos pequenos corpos no Sistema Solar”.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.