ALCATRAZES - O baú de tesouros biológicos dos Alcatrazes, no litoral norte de São Paulo, parece não ter fundo. A mais nova joia na coroa de biodiversidade do arquipélago é um coral pink, de cor vibrante e pólipos arredondados, parecidos com pedras preciosas. Ainda sem nome, a espécie foi descoberta no início deste ano, dentro de um cânion submarino, a pouco mais de 30 metros de profundidade. Esse fica bem abaixo de um dos pontos mais famosos de mergulho de Alcatrazes - chamado Matacões -, mas não costuma ser visitado por causa das condições adversas que prevalecem nessa profundidade, de águas frias e túrbidas. O pesquisador Marcelo Kitahara, mesmo já tendo mergulhado mais de 300 vezes na região, nunca tinha conseguido entrar nele. Até que um dia a oportunidade surgiu, em abril.
Era um dia de águas especialmente claras e calmas, e Kitahara aproveitou para desbravar o cânion, acompanhado do amigo e biólogo Leo Francini - outro veterano de Alcatrazes, que também nunca tinha descido até ali. Os pólipos cor-de-rosa, com cerca de 2 centímetros cada um, logo lhe saltaram aos olhos, incrustados a uma massa bege de cracas e moluscos.
"Nunca tinha visto nada com essa cor", lembra Kitahara, professor do Departamento de Ciências do Mar da Universidade Federal de São Paulo (DCMar-Unifesp) e colaborador do Centro de Biologia Marinha da Universidade de São Paulo (Cebimar-USP).
Autorizado a fazer coletas no local, ele removeu alguns pólipos para análise em laboratório.
"Quando subi no barco já tive o feeling de que poderia ser uma espécie nova."
De volta ao Cebimar, em São Sebastião, alguns pólipos foram dissecados e outros, colocados em aquários para observação. As análises genéticas e morfológicas indicam se tratar de uma espécie do gênero Coenocyathus, que tem oito espécies conhecidas no mundo - apenas uma no Brasil. Um artigo científico está sendo preparado para oficializar a descoberta e dar nome à espécie.
"Ainda temos muito o que descobrir em Alcatrazes", diz o cientista.
Quando subi no barco já tive o feeling de que poderia ser uma espécie nova
Marcelo Kitahara, pesquisador
Invasores
Curiosamente, a descoberta aconteceu em um dia em que os pesquisadores estavam em Alcatrazes para se livrar de uma outra espécie de coral - neste caso, uma espécie exótica invasora: o coral-sol.
Originário do Indo-Pacífico, o coral-sol desembarcou no Brasil no fim da década de 1990 e chegou a Alcatrazes em 2011, causando grande preocupação entre cientistas e ambientalistas, por sua capacidade de ocupar o ambiente, em detrimento das espécies nativas. Para evitar a proliferação no arquipélago, o ICMBio realiza desde 2013 um trabalho de monitoramento.
Mutirões periódicos são organizados para fazer uma limpa nos costões das ilhas. Mais de 300 mil colônias de coral-sol, pesando mais de meia tonelada, já foram removidas do arquipélago nos últimos anos. A extirpação é feita manualmente, na base da força bruta, com talhadeira e martelo. O coral-sol tem uma capacidade impressionante de regeneração, e por isso as colônias têm de ser arrancadas por inteiro das rochas.
"Essas campanhas têm sido essenciais para suprimir o aumento dessa população no arquipélago, dando maior chance para as nativas", diz a pesquisadora Kátia Capel, do Cebimar-USP.
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