As mudanças climáticas têm provocado aumento de turbulências difíceis de serem detectadas, segundo pesquisas. Esses eventos, que resultam em danos na estrutura dos aviões e ferimentos nos passageiros e tripulantes, têm se tornado cada vez mais comuns. Dados mostram que o Brasil também não passa incólume ao aumento de turbulências.
Nesta semana, um voo operado pela Singapore Airlines que viajava entre o Reino Unido e Cingapura passou por uma turbulência severa. Em poucos minutos, o avião caiu 2 mil metros. Um britânico de 73 anos morreu e dezenas de passageiros ficaram feridos. A queda acentuada de altura devido à turbulência aconteceu enquanto o avião estava sobre o Mar de Andamão, perto de Myanmar. O voo precisou desviar de rota e fazer um pouso de emergência em Bangkok, na Tailândia.
Turbulências são impactos no avião provocados por correntes de ar instáveis que aparecem de forma imprevista. Quando ocorrem em áreas sem nuvens e longe de tempestades são chamadas de turbulência de ar puro.
Sem aviso, as aeronaves são sacudidas por esses fenômenos. Objetos não-fixados e passageiros e tripulantes sem cinto de segurança podem ser arremessados, provocando ferimentos graves e, até mesmo, fatalidades.
Um dos grandes desafios em relação às turbulências de ar puro é prevê-las. Métodos de sensoriamento remoto da aeronave e meteorologistas de aviação enfrentam dificuldades para observar com antecedência o fenômeno.
E as turbulências de ar puro têm se tornado cada vez mais comuns e severas. Os números têm relação com os efeitos do aquecimento global.
Estudo de 2023 publicado na revista Geophysical Research Letters observou que a concentração de gás carbônico aumentou cerca de 30% entre 1979 e 2020 na região norte do Oceano Atlântico. No mesmo período e área, as turbulências de ar puro cresceram 37%.
Os Estados Unidos e o Atlântico Norte tiveram os maiores aumentos do fenômeno, até por terem grande parte das rotas mundiais de voo. Mas, outras regiões, inclusive o Brasil, foram citados no trabalho como locais de crescimento significativo de turbulências de ar puro.
Na costa norte brasileira, a probabilidade de turbulências de ar puro moderada ou grande dobrou nas últimas quatro décadas em termos relativos. Outras áreas que tiveram alto crescimento desses fenômenos durante 1979 e 2020 são Europa, Oriente Médio, sul do Atlântico e parte oriental do Oceano Pacífico.
Segundo a pesquisa, a probabilidade de turbulências médias e grandes é maior nas latitudes médias do hemisfério norte do que na região correspondente do sul. Mas, nas regiões montanhosas do sul, como os Andes, essa probabilidade volta a crescer. Uma das possíveis explicações para o cenário é a quebra de ondas pela montanha.
De acordo com o Conselho Nacional de Segurança nos Transportes (NTSB, sigla em inglês), as turbulências foram as causas de 37,6% de todos os acidentes em grandes empresas aéreas comerciais dos Estados Unidos. A Administração Federal de Aviação, outra agência norte-americana, disse que houve 146 ferimentos graves por turbulência de 2009 a 2021.
As turbulências no futuro
Outro estudo, também publicado na Geophysical Research Letters, em 2017, diz que o volume de turbulências de ar puro irá aumentar ainda mais. A pesquisa utilizou modelos de simulação de mudanças climáticas para estudar as turbulências de ar puro na segunda metade deste século, entre 2050 e 2080.
Os autores encontraram grandes aumentos relativos do fenômeno, em especial nas latitudes médias dos dois hemisférios. No cenário projetado, os locais com maiores números de voos internacionais enfrentarão mais e maiores turbulências. Na América do Norte, na Europa e no norte do Pacífico o volume de turbulências de ar puro severas pode dobrar.
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Além disso, as turbulências de ar puro severas irão aumentar mais do que as moderadas. Na região norte do Oceano Atlântico, isso chegará a um ponto em que as turbulências severas passarão a ser tão comuns quanto as moderadas.
As conclusões do estudo indicam a necessidade de construção de aeronaves que levem em conta a maior presença de turbulências. Muitos dos aviões que estarão em uso na segunda metade do século estão em fase de design e precisam ser preparados para uma atmosfera mais turbulenta, conclui a pesquisa.
A Singapore Airlines informou na sexta-feira, 24, que suspenderá os serviços de refeição e fará com que toda a tripulação de cabine coloque o cinto de segurança quando os aviões passarem por turbulências, como parte das medidas mais rígidas na cabine. Os passageiros descreveram o “terror absoluto” do Boeing 777-300ER tremendo, com itens soltos voando e pessoas feridas e deitadas no chão do avião. A aeronave estava com 211 passageiros e 18 membros da tripulação a bordo.
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