Inspirados na notável capacidade dos animais para se adaptar a lesões e ferimentos, cientistas da França e Estados Unidos criaram robôs capazes de se adaptar a defeitos em menos de dois minutos,recuperando sozinhos a capacidade de efetuar suas tarefas originais. Em um experimento, descrito na edição desta quarta-feira, 27, da revista Nature, um robô de seis pernas conseguiu se adaptar para manter sua trajetória mesmo quando duas das pernas estão quebradas. Outra demonstração foi feita com um braço robótico que, mesmo com várias juntas quebradas, aprendeu sozinho a modificar os movimentos para colocar um objeto no lugar correto.
O feito foi possível graças ao desenvolvimento de um novo algoritmo batizado de Tentativa e Erro Inteligente. Com o algoritmo, os robôs conseguem realizar rápidos experimentos, depois da ocorrência de um defeito, até que descubram um comportamento inédito que compense as limitações impostas pelos defeitos.
De acordo com os autores, a inovação se baseou nas estratégias dos animais para se adaptar a danos. O princípio é o mesmo utilizado por uma pessoa que, depois de machucar o tornozelo, rapidamente encontra uma maneira de andar apesar do ferimento - ou um cão de três pernas que ainda é capaz de correr. Com o novo algoritmo, os cientistas esperam que no futuro os robôs possam superar uma de suas principais limitações, que consiste em parar de funcionar por conta de danos.
"Quando são feridos, os animais não começam a aprender do zero. Em vez disso, eles têm intuições sobre diferentes maneiras de se comportar. Essas intuições permitem que eles selecionem, de forma inteligente, alguns poucos comportamentos diferentes para testar. Depois desses testes, eles escolhem um que funcione apesar do ferimento. Nós fizemos robôs que conseguem fazer isso", disse um dos autores do estudo, Jean-Baptiste Mouret, da Universidade Pierre and Marie Curie (UPMC), na França.
Ao ser programado para uma tarefa, o robô usa uma simulação computacional de si mesmo para criar um mapa detalhado do espaço onde desempenhará sua tarefa. Esse mapa representa as "intuições" do robô sobre diferentes comportamentos possíveis e sobre a eficiência de cada um deles. Quando o robô sofre um dano, ele usa essas intuições para orientar o algoritmo de tentativa e erro, que conduz rápidos experimentos até descobrir o comportamento compensatório.
"Assim que é danificado, o robô se torna como um cientista. Ele tem expectativas prévias sobre os diferentes comportamentos que poderiam funcionar - e começa a testá-los. No entanto, essas previsões vêm das simulações de um robô não danificado. Então ele ainda tem que encontrar qual delas vai funcionar de fato, não apenas em relação à realidade, mas em relação ao dano", disse outro dos autores, Antoine Cully, também da UPMC.
Tentativa e erro. Segundo Cully, cada comportamento testado pelo robô é como um experimento. Se um deles não funciona, o robô é inteligente o suficiente para descartá-lo e tentar outra opção. "Por exemplo, se andar apoiado com ênfase nas pernas de trás não estiver funcionando bem, ele tentará andar com ênfase nas pernas da frente. O que nos surpreendeu foi a rapidez com que ele consegue aprender uma nova maneira de andar", disse Cully.
O mesmo algoritmo permite que robôs se adaptem a situações imprevistas, como se adaptar a novos ambientes e inventar novos comportamentos. A nova técnica, segundo os autores, ajudará a desenvolver robôs mais robustos, eficientes e autônomos no futuro.
"Ela pode permitir a criação de robôs que ajudem equipes de resgate dispensando uma atenção contínua. Pode também tornar mais fácil a criação de robôs de assistência pessoal que continuem a ser úteis mesmo quando têm uma peça quebrada", disse outro dos autores, Danesh Tarapore, da UPMC.
Possibilidades de uso. Segundo ele, no futuro os robôs poderão ser úteis para atuar em situações como o acidente nuclear de Fukushima, substituindo voluntários humanos que foram submetidos a altas doses de radiação. Eles também poderiam combater incêndios florestais e ajudar em tarefas domésticas. Cully declarou que uma de suas principais motivações para desenvolver novos robôs é ajudar pessoas enfermas, ou cuidar de idosos.
Para outro autor, Jeff Clune, da Universidade de Wyoming (Estados Unidos), a inovação é um importante passo em direção a robôs capazes de trabalhar fora de ambientes confinados e controlados, como laboratórios e fábricas.
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