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Exposição A Tragédia do Holocausto, no MIS, parte da vida de sobrevivente para expor horror nazista

Mostra imersiva usa cenários, sons e efeitos especiais para retratar a trajetória de Julio Gartner, polonês radicado no Brasil, que passou por esconderijos, guetos e campos de concentração. ‘O melhor jeito de contar essa história é humanizá-la’, diz um dos curadores

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Foto do author Julia Queiroz

Imagine sentir um pouco de como era o gueto de Cracóvia, onde milhares de judeus se esconderam após a invasão dos nazistas na Polônia. Ouvir os gritos e os vidros sendo quebrados durante a Noite dos Cristais. Ou ter uma ideia, ainda que em escala muito menor, de como eram os campos de concentração nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

É isso que pretende fazer a exposição A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner, que abre ao público neste sábado, 9, no Museu da Imagem e Som (MIS) de São Paulo. A partir da trajetória de um sobrevivente polonês radicado no Brasil, a mostra imersiva aproxima o visitante do universo de milhares de judeus e dos horrores a que foram submetidos entre a ascensão do nazismo e o Tribunal de Nuremberg.

A exposição 'A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner' abre neste sábado, 9 de março, no MIS. Foto: Werther Santana/Estadão

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“O melhor jeito de contar essa história é humanizá-la”, explica Marcio Pitliuk, escritor, cocurador da exposição, autor de O Engenheiro da Morte: A Participação da Elite Alemã no Holocausto (Vestígio) e cineasta por trás do filme Sobrevivi ao Holocausto, que conta a história de Julio Gartner. “Quando você fala em seis milhões de mortes, é um número. Quando você mostra as vítimas, as pessoas se sensibilizam mais. A forma que encontrei de fazer isso foi mostrando a história de um sobrevivente, do Julio.”

A mostra tem ainda um segundo ato, batizado de Anjos do Holocausto. No segundo andar, um espaço apresenta a história de sete pessoas que ajudaram a resgatar judeus durante aquele período: o britânico Nicholas Wilton, o alemão Oskar Schindler (que inspirou o filme A Lista de Schindler), o diplomata sueco Raoul Wallenberg, a ativista polonesa Irena Sendler, o médico polonês Janusz Korczak e os diplomatas brasileiros Luiz Martins de Souza Dantas e Aracy de Carvalho.

A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner

O Estadão visitou a exposição A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner ainda em seu momentos finais de montagem. O espaço, mesmo que em escala muito menor, cria a sensação de entrar em uma viagem no tempo pela vida de Julio, a partir de fotos, cenários, sons e efeitos.

Morto em 2018, aos 94 anos, ele tinha apenas 15 quando os alemães invadiram Cracóvia, sua cidade natal na Polônia. Tinha o sonho de jogar futebol profissionalmente, mas teve os planos interrompidos pela invasão nazista. É um pouco antes desse momento que começa a mostra: em uma reprodução do que era a sala de jantar da casa de Julio, onde ele vivia com os pais, Isidor e Paulina, e os irmãos, Henrique e Norberto.

Primeiro espaço da mostra 'A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner' reproduz sala de jantar da família.  Foto: Werther Santana/Estadão

Em seguida, uma representação do que foi a Noite dos Cristais, quando os alemães estimularam a população a atacar estabelecimentos e comunidades judaicas sob a desculpa de vingança pelo assassinato de um diplomata alemão em Paris. Além das fachadas com vidros quebrados e pichações, o ambiente é tomado pelo som alto de sirenes, gritos e objetos quebrando.

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“Estamos usando diversos elementos de cenografia, sons, imagens e visuais variados para que a pessoa se sinta naquele lugar. Isso, aliado a informação com textos e fotografias recuperadas”, explica André Sturm, diretor-geral do MIS e cocurador da exposição.

Noite dos Cristais também faz parte da mostra sobre o Holocausto no MIS. Foto: Werther Santana/Estadão

O caminho continua por um esconderijo, onde Julio ficou escondido com uma família de camponeses cristãos na cidade de Glewiec, e pelo gueto de Cracóvia, onde ele e o irmão, Henrique, ficaram por cerca de um mês. O espaço é preenchido por gritos e bebês chorando. O outro irmão de Julio, Norberto, fugiu para a Rússia com um tio. Os pais, Isidor e Paulina, foram levados para o campo de Majdanek, em Lublin, e foram assassinados na câmara de gás.

“O que diferenciou o Holocausto foi a construção de uma máquina industrial de extermínio, com milhares de pessoas trabalhando para isso, linhas de trem, construção de campos de concentração e das câmaras de gás. É isso que queremos mostrar para as pessoas. O objetivo é que elas entendam, a partir do sentimento, o que foi o Holocausto”, completa André.

Esses locais aparecem nos próximos passos da exposição. Depois de cruzar um vagão com roupas penduradas, o visitante se depara com dois caminhos. O primeiro acaba em um espaço sem saída, que com uma projeção e efeitos visuais, representa o que era a câmara de gás.

Espaço na exposição 'A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner' representa uma câmara de gás, onde prisioneiros dos campos de concentração eram mortos. Foto: Werther Santana/Estadão

O outro leva aos campos de concentração nazistas, onde vemos as beliches em os judeus dormiam em um ambiente quase claustrofóbico e, no espaço redondo - a área principal do MIS - a representação de dois campos de trabalho e um de extermínio. Uma escada de pedraria foi construída para representar os 186 degraus que Julio percorria carregando blocos de pedra ao longo de 12 horas por dia no campo de Mauthausen, na Áustria.

“A exposição é bem sensorial para que a pessoa acompanhe a história do Julio, que é a história do Holocausto. Ele teve o azar de passar por todas essas fases. A gente espera que as pessoas saiam impactadas e agoniadas de ver o que foi esse genocídio”, comenta Marcio Pitliuk, que conheceu o polonês em 2008 e atuou como uma espécie de agente nos dez anos seguintes, marcando palestras e entrevistas para o sobrevivente.

Na exposição, uma escada de pedraria foi construída para representar os 186 degraus que Julio percorria carregando blocos de pedra por 12 horas por dia no campo de Mauthausen, na Áustria. Foto: Werther Santana/Estadão

Julio também passou pelo campo de Melk, onde, por sorte, trabalhava dentro de túneis. O frio no local era tanto que quem era obrigada a trabalhar ao ar livre morria em pouco tempo. Com os Aliados próximos, os prisioneiros foram transportados - a pé, sem água, comida ou descanso - para o campo de Ebensee. Depois de três semanas, foram libertados.

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As memórias do filho

Para Paulo Gartner, 65 anos, um dos filhos de Julio, contar a história do pai é fazer com que as pessoas não esqueçam do que foi o Holocausto: “Meu pai falava: ‘o mundo não aprende’. Vivemos o Holocausto durante a Segunda Guerra e vários genocídios ao longo do tempo. Acho muito importante transmitir esses acontecimentos históricos para as gerações que estão vindo porque aprendemos com a História”.

Paulo e Marcio lembram que Julio, mesmo com tudo que havia passado, queria sempre olhar para frente. Acreditava que era importante seguir a vida. Com o fim da guerra, passou um período na Itália antes de se mudar para o Brasil. Aqui, tornou-se comerciante, casou-se e teve um casal de filhos. Já no final da vida, passou a contar a sua história para mais pessoas ao redor do País.

'Estadão' visitou a exposição 'A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner' na quinta-feira, 7, em seus momentos finais de montagem e nesta sexta-feira, 8, em apresentação exclusiva para imprensa. Foto: Werther Santana/Estadão

“Ele tinha um senso de que isso podia ajudar e é por isso que ele fazia [palestras e falava sobre o que ele passou]. Ele não tinha ego nenhum para satisfazer. Ele queria levar para as pessoas o que foi a História. Se a gente conseguir transmitir o que aconteceu e trouxer mais pessoas para entender que esse não é o caminho, sei que ele ficaria feliz”, diz Paulo.

Anjos do Holocausto

O segundo ato da exposição, chamado de Anjos do Holocausto, foi pensando por André Sturm depois de tomar conhecimento da história de Nicholas Winton (1909 - 2015), britânico filho de judeus que salvou 669 pessoas organizando fugas de Praga em vagões e subornando soldados nazistas.

Ele nunca havia contado essa história para ninguém, nem para a própria família. O feito foi revelado em 1998, em uma programa da BBC, que reuniu judeus salvos por Winton. A sua história é lembrada na mostra, com uma projeção do episódio que revelou a história.

Além dele, outras seis pessoas ganham destaque:

  • Oskar Schindler (1908-1974), alemão que inspirou o filme A Lista de Schindler e escondeu famílias de origem judaica nas fábricas que gerenciava para o governo nazista.
  • Raoul Wallenberg (1912-1947), diplomata sueco que vinha de família rica e usou seus contatos para expedir passaportes especiais para judeus sob a classificação de “suecos à espera de repatriação”.

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Segundo ato da exposição é chamado de 'Anjos do Holocausto' e fica no segundo andar do MIS. Foto: Werther Santana/Estadão
  • Irena Sendler (1910-2008), ativista polonesa que retirou cerca de 2,5 mil crianças de guetos e as salvou do Holocausto sob novas identidades em casas adotivas, orfanatos e conventos.
  • Janusz Korczak (1878 ou 1879 - 1942), médico polonês que cuidou de centenas de crianças no Gueto de Varsóvia, teve um salvo-conduto, mas escolheu acompanhar os meninos e meninas presos pelos nazistas. Foi morto no campo de Treblinka, em 1942, com as crianças.
  • Luiz Martins de Souza Dantas (1876-1954), diplomata brasileiro que foi embaixador do Brasil na França e concedeu mais de mil vistos diplomáticos para perseguidos pelo governo nazista.
  • Aracy de Carvalho (1908-2011), diplomata e responsável pelo departamento de imigração do consulado brasileiro em Hamburgo durante a Segunda Guerra, e companheira do escritor Guimarães Rosa. Escondeu judeus em sua casa e emitiu vistos ajudando-os a fugir para o Brasil.

“É uma homenagem a pessoas que, mesmo correndo risco de vida, salvaram judeus e pessoas que não conheciam porque achavam que tinham que fazer o bem”, finaliza André. Pessoas como Julio Gartner.

Serviço - A Tragédia do Holocausto: A Vida de Julio Gartner

  • Data: a partir de 9 de março
  • Ingressos: R$ 20 (inteira); R$ 10 (meia); gratuito às terças e para crianças até 7 anos
  • Classificação indicativa: 16 anos
  • Museu da Imagem e do Som – MIS Avenida Europa, 158, Jardim Europa, São Paulo| (11) 2117 4777 | www.mis-sp.org.br
  • Horário: terças a sextas: 10h às 19h / sábados: 10h às 20h / domingos e feriados: 10h às 18h (Permanência até 1h após o último horário)

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