Depois de nove meses em reforma, a Fundação Casa de Jorge Amado, em Salvador, reabriu suas portas com novidades para turistas e moradores da capital baiana. A principal delas é uma expansão: o centro cultural que fica no Largo do Pelourinho, coração do Centro Histórico da cidade e local que remete aos primeiros anos do período colonial brasileiro, agora conta com três casas interligadas - antes, o complexo era formado por dois casarões.
A primeira mudança é a anexação da Casa de Exu, que fica no número 47, logo atrás do famoso casarão de fachada azul, incrustrado no Largo do Pelourinho. A nova aquisição veio através de uma negociação com a Conder, órgão do governo do Estado da Bahia, que, entre outras funções, desempenha um papel crucial na gestão, recuperação e preservação do Centro Histórico de Salvador. Antes de ser oficialmente anexada ao complexo, o antigo casarão abandonado foi palco de uma ocupação com uma exposição em homenagem ao orixá, um dos mais conhecidos das religiões de matriz africana e patrono da casa, escolha do próprio Jorge Amado.
O casarão passou por uma reforma e, agora, será a sede administrativa da Fundação, além de transformar a ocupação em uma exposição permanente. Entre as peças, estão imagens da divindade e obras de arte de inúmeros artistas. “Durante um tempo, a fundação editou a revista literária chamada Exu - foram 35 números. Os artistas doavam obras de arte representando o Orixá e a gente fazia delas capa dessas revistas”, conta Angela Fraga, diretora executiva da Fundação. As obras estão expostas no espaço que também conta com uma projeção de VJ baiano Gabiru.
A casa 47 também vai guardar o acervo de Jorge Amado e Zélia Gattai com um espaço para receber escolas, estudantes universitários e pesquisadores que queiram estudar a vida do casal de escritores. Enquanto isso, os antigos espaços administrativos deram lugar a novas áreas expositivas, quando a vida e obra do autor baiano ganhou destaque.
“Além de preservar e estudar os acervos bibliográficos e artísticos do escritor, a instituição tem como missão incentivar estudos e pesquisas da literatura feita na Bahia e ajudar na valorização do Centro Histórico como espaço pulsante de nossa cultura. A reforma que realizamos contribui para o cumprimento dessa missão”, diz Angela, que afirma cumprir um desejo do autor quando idealizou o espaço. “É a razão maior de existir da fundação, nossa missão mais nobre é a guarda do acervo e disponibilização para pesquisa”, continua.
Mais espaço para novas histórias
Com a expansão, a instituição ganhou mais espaços dedicados à vida e ao trabalho de Jorge Amado. Um dos principais escritores baianos e brasileiro tem revista sua trajetória desde a infância, no sul da Bahia, passando por sua juventude e vida adulta, o período em que foi ativamente militante comunista, além, é claro, sua dedicação à literatura e à sua companheira Zélia.
Com curadoria de Angela e Ticiano Martins, a exposição permanente sobre a trajetória de Amado é acompanhada pela instalação de um cacaueiro, que percorre algumas salas, fazendo menção ao fruto que se tornou ouro do sul da Bahia, principalmente da região de Ilhéus, onde o escritor viveu sua infância. Um “galho” da árvore segue até encontrar com outra planta esculpida que também tem importância para compor a mítica em torno do casal: a mangueira que está no jardim da casa onde o casal viveu no bairro do Rio Vermelho - que também está aberta à visitação - e onde foram enterradas as cinzas dos dois.
A sala dedicada a esta conexão, onde o cacaueiro e a mangueira se encontram, replica o jardim, o banco sob a árvore - “espaço instagramável” onde visitantes poderão fazer fotos - e os azulejos de Carybé ajudam a compor o ambiente cotidiano do escritor.
Apesar de ambas terem como objeto de exposição a vida do casal, a sede da fundação e a Casa do Rio Vermelho são espaços diferentes. As duas mostram a vida do autor: o casarão no Pelourinho se dedica mais à vida profissional de Amado, enquanto a casa em que viveu com Zélia aborda a vida doméstica do escritor.
Para além de Jorge
Além de contar a história do autor, os novos espaços abertos com a reforma da instituição garantiram também homenagens a outros pontos da vida de Jorge Amado e também outras pessoas. É o caso de Myriam Fraga, escritora e jornalista baiana, e uma das grandes incentivadoras da criação de um espaço que guardasse o acervo do artista. Em suas colunas em um periódico local, ela defendia a importância da Fundação como uma forma de manter o legado do escritor. O acervo da poeta também está sob guarda da Fundação.
Outra área é dedicada aos ilustradores, que ajudaram a dar vida aos livros do autor, com imagens que foram publicadas, principalmente em edições mais antigas. As viagens do casal, as versões traduzidas das histórias de Jorge também têm destaque, bem como as adaptações para o audiovisual das obras literárias do artista baiano.
Jorge Amado é um dos autores brasileiros com o maior número de adaptações para o audiovisual. São mais de dez livros que se tornaram filmes. Terras Violentas (baseado em Terras do Sem-Fim, 1948), Seara Vermelha (1963), Capitães da Areia (dois filmes, 1970 e 2010), Os Pastores da Noite (1975), Gabriela (1983) e Tieta do Agreste, filmado em 1996.
Dona Flor e seus Dois Maridos, de 1979, tem destaque. Uma cama foi instalada em um dos espaços e uma imagem mostra a personagem vivida por Sonia Braga ao lado de seus companheiros Vadinho (José Wilker) e Teodoro (Mauro Mendonça). Na sala, telas mostram trechos das produções, além de pôsteres dos filmes.
A reforma da fundação ainda contemplou uma trasnformação no café e na lojinha do centro cultural. Algumas salas continuam abertas, como o Mirante das Letras, que tem uma vista de mais de 180 graus para a Baía de Todos os Santos e para o Centro Histórico de Salvador.
Quem quiser visitar a nova Fundação Casa de Jorge Amado (Largo do Pelourinho - Centro Histórico de Salvador), pode fazer isso de segunda a sexta-feira das 10h às 18h, e sábados das 10h às 16h. A entrada custa R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia), com exceção das quartas, que é gratuita.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.