Com a eclosão da SP-Arte, as galerias paulistanas apuram a programação para o público especializado que vem à cidade no período. E uma das características do circuito que vem se fortalecendo é que São Paulo vira um polo para produções de destaque de artistas latino-americanos. Em cartaz agora, as obras da colombiana Johanna Calle, na Marilia Razuk, do mexicano Bosco Sodi, na Luciana Brito, e do chileno Alfredo Jaar, na Luisa Strina, atestam a força das obras dos egressos dos países vizinhos.
“Acho importante fortalecer esses laços com o restante do continente. No caso da Johanna, sua obra tem uma grande delicadeza, é sutil, mas tem um forte conteúdo político”, afirma a galerista Marilia Razuk, que, em sua galeria no Itaim, apresenta em suas salas expositivas pela terceira vez a obra da colombiana. Em ascensão no circuito internacional, Johanna foi um dos destaques da 31.ª Bienal de São Paulo, em 2014, e participou da Bienal de Sydney, no ano passado. Para a individual Babel, Johanna escolheu três séries para apresentar. Para quem lembra de Perímetros, série de desenhos que ela exibiu no Pavilhão da Bienal, no Ibirapuera, as 60 peças da série Minúsculas de hoje são próximas. Com uma apresentação formal com fortes elos com o obsessivo, ela datilografa sobre papel japonês com mínimos espaços entre linhas e letras. De longe, são vistas as manchas negras sobre a superfície, mas de perto o observador pode ler relatos variados, em geral de forte conotação política, com comentários sobre a condição feminina e a luta pela terra na Colômbia natal.
As outras duas séries exibidas na galeria podem se enquadrar na linguagem do desenho, mas encarada de um modo mais expandido. Os 12 trabalhos da série Párrafos são marcados por linhas de aço que configuram uma espécie de partitura sobre as bases de MDF, com intervalos em branco e presenças de antigas fontes tipográficas. Não se encerram textos completos em cada peça e o conjunto parece denotar uma certa crise da linguagem. Já em Simbiontes, Johanna se interessa pelos bastidores - tanto no sentido literal do aparelho para bordar como no modo de exposição da série, em que é mostrado o verso de telas de aço, destacando-se as costuras internas do conjunto.
Também no Itaim, a Luciana Brito Galeria exibe pela primeira vez uma individual do mexicano Bosco Sodi. Vivendo entre o México e Nova York, já expôs na poderosa Pace Gallery, em 2011, e criou um projeto especial para a antiga casa modernista tombada onde agora fica a galeria, a Residência Castor Delgado Perez, projeto de Rino Levi (1901-1965) datado de 1958. “Acho importante essa internacionalização do circuito. Em outros anos, fizemos na feira solos de artistas do exterior representados por nós. Agora, optamos pela individual na galeria, que ganhou um novo local”, conta Luciana.
Em Voragine, o artista utilizou a particular espacialidade da casa, que recebe muita luz em diversos ambientes, para dispor a multifacetada produção. Entre os momentos mais interessantes da mostra, está aquele em que Bosco utilizou os pequenos nichos de vidro que delimitam os jardins internos da residência. A instalação foi preenchida por rochas vulcânicas banhadas em esmalte cerâmico de ouro. “Acabo me interessando mais por propostas site specific e, nesse sentido, a casa tinha muitas possibilidades”, diz ele.
Nos Jardins, a Luisa Strina exibe pela segunda vez na galeria a obra do chileno Alfredo Jaar. Um dos nomes latino-americanos mais fortes do circuito internacional, com presença em edições da Documenta de Kassel (em 1987 e 2002), da Bienal de Veneza (em quatro mostras, de 1987 a 2013) e da de São Paulo (três: 1987, 1989 e 2010), a individual A Política das Imagens centra o foco nos limites da representação. A instalação O Som do Silêncio (2006) traz a história do fotojornalista sul-africano Kevin Carter (1960-1994) por meio de uma videoprojeção e luzes de forte intensidade, num ambiente cênico e de forte carga política.
Veteranos. Outras duas galerias, a Marcelo Guarnieri e a Baró, optaram por nomes veteranos não tão incensados no circuito. Na Guarnieri, depois de uma elogiada sala na 32.ª Bienal de SP, a carioca Sonia Andrade (1935), uma das pioneiras da videoarte no País, apresenta a individual Cristais, Pedras e Vídeos. Diferentemente de Hydragrammas (1978-1993), presente no Pavilhão da Bienal no ano passado e que pode ser resumido como um inventário pessoal que falava sobre o processo artístico, entre diversas outras coisas, na individual nos Jardins Sonia habilmente constrói pontes entre o audiovisual e o instalativo.
Na Baró Jardins, o baiano Almandrade (1953) traz a individual O Conceito entre o Verbo e a Visualidade. “É uma espécie de minirretrospectiva. Como o espaço é pequeno, não haverá trabalhos grandes, mas não deixaremos de expor instalações, pinturas e objetos”, conta ele, cuja obra ganha cada vez mais interesse institucional e de coleções por conta da particular síntese entre palavra, signos visuais e conceito. “Cada vez vem mais gente de fora visitar meu ateliê em Salvador. Acredito que esse tipo de produção, nas bordas da escrita e do visual, está gerando um interesse em nível mundial”, acredita ele, que lançará no sábado, 8, às 17h, na SP-Arte, um álbum de tiragem limitada e com dez poemas visuais em serigrafia.
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