A franquia de Invocação do Mal até pode dar medo, mas dificilmente alguém vai dizer que é uma saga de terror realmente original, com personalidade. Os personagens de Ed e Lorraine Warren são planos, enfrentando demônios com uma facilidade absurda, enquanto os vilões são criaturas do submundo que, geralmente, desaparecem após um confronto final retumbante. No entanto, que sorte seria a nossa se A Freira 2 fosse apenas banal como o restante da saga: o longa-metragem, que estreia nesta quinta-feira, 7, é realmente ruim.
A trama, de certa forma, continua de onde o outro longa-metragem parou: a freira Irene (Taissa Farmiga) seguiu com sua vida, indo para outro convento depois dos acontecimentos do primeiro filme; o simpático Maurice (Jonas Bloquet) se tornou um faz-tudo em uma escola para meninas; e o Padre Burke simplesmente morreu - claramente Demián Bichir não quis continuar na franquia. Tudo bonito, claro e radiante na vida dos dois jovens? Claro que não: sem muitas explicações, o demônio Valak volta e precisa ser enfrentado de novo.
Um roteiro sem qualquer inspiração
O roteiro preguiçoso de Ian Goldberg (A Autópsia), Richard Naing (Eli) e Akela Cooper (Maligno) é a gênese de todos os problemas de A Freira 2. Pra começar, não tenta explicar como a freira demoníaca voltou - até faz lembrar a nova vida que Palpatine recebeu em Star Wars: A Ascensão Skywalker. “De alguma forma, Palpatine está de volta”, disse Poe Dameron, em uma cena que virou meme. Aqui, a freira voltou. E é isso. Ponto final.
Desenvolvendo a história, o trio de roteiristas parece ter medo de contar uma história coesa, que avança. Os personagens ficam correndo de lá pra cá o tempo todo: seja no sentido literal da coisa, como reproduções de cenas de Scooby-Doo, com freiras e crianças fugindo de um bode demoníaco com cara de humano (juro que tem isso no filme!), ou no sentido literal, com Irene tendo que viajar pela Europa para descobrir o paradeiro da freira. Perde-se muito aquele senso de urgência e Valak, assim, se torna onisciente e onipresente.
Além disso tudo, é preciso destacar como o filme flerta em se transformar, sem razão alguma, em uma espécie de O Código da Vinci do terror, em uma subtrama que envolve os olhos de Santa Luzia e descendentes da santa que ainda vivem por aí. É, mais uma vez, a preguiça dos roteiristas em encontrar soluções decentes para os absurdos que criam.
O pior de tudo: a direção de Michael Chaves
Tudo isso poderia ser aceitável se Michael Chaves, que antes já dirigiu os fraquíssimos A Maldição da Chorona e Invocação do Mal 3, soubesse domar esse roteiro e colocar um pouco de personalidade. Mas não é isso que acontece: ele tira bastante do ar gótico que existe no primeiro filme, e acaba investindo em algo mais sanguinolento. São várias as cenas com sangue espirrando e que, até então, não tinham dado as caras na franquia.
Só que isso não basta. As habilidades de Michael Chaves para dar sustos são reduzidas e até mesmo copiadas de coisas que deram certo em outros filmes da franquia - a bola que volta rolando do escuro (visto no ótimo Annabelle 2), Valak aparecendo do nada em quadro (Invocação do Mal 2) e por aí vai. Quando tenta algo mais criativo, como uma cena em que a freira aparece nas páginas de uma revista, deixa tudo constrangedor, desconfortável.
Pior: Valak, neste seu segundo filme, nada mais é do que uma coadjuvante de luxo. Não dá pra saber se isso aconteceu por conta do processo que a atriz Bonnie Aarons moveu contra a Warner Bros., mas ela quase nunca aparece aqui para movimentar a história. Ela surge para um jumpscare e, logo em seguida, quando é para seguir com a jornada de Irene e de Maurice, é outro personagem (uma pessoa possuída) que toma as rédeas dos sustos.
A Freira 2 é um filme pra lá de estranho. Talvez seja a explicação mais clara do que motivou a Warner Bros. Discovery a cancelar o projeto de spin-off de Invocação do Mal, O Homem Torto, além de não ter certezas sobre o futuro de Annabelle e da Freira. São muitos filmes ruins em sequência - falta James Wan voltar para, quem sabe, colocar ordem no caos.
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