‘A Melhor Mãe do Mundo’, de Anna Muylaert, será exibido no Festival de Berlim: ‘História universal’

Filme estrelado por Shirley Cruz e Seu Jorge fará parte da mostra Berlinale Special, fora da competição; diretora explica por que o longa foi o mais desafiador de sua carreira e celebra a seleção: ‘Muda muito o destino do filme’

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Foto do author Julia Queiroz
Atualização:

A Melhor Mãe do Mundo, novo filme da cineasta Anna Muylaert, será exibido pela primeira vez no Festival de Cinema de Berlim 2025, que ocorre entre os dias 13 e 23 de fevereiro. O longa fará parte da mostra Berlinale Special, fora da competição oficial. O anúncio foi feito na manhã desta quinta, 16, e na lista, que terá 21 filmes (nem todos foram relevados ainda), constam, também, Mickey 17, de Bong Joon Ho (Parasita), e Pa-gwa, de Min Kyu-dong (The Old Woman With the Knife).

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A protagonista da trama é Gal (Shirley Cruz), uma catadora de lixo que é violentada cotidianamente pelo marido, Leandro (Seu Jorge). Decidida a deixá-lo e sem apoio das autoridades, que ignoram suas queixas, ela pega os dois filhos, deixa sua casa no centro de São Paulo e parte em uma jornada até a periferia da cidade.

“É uma história universal”, afirma Muylaert, de 60 anos, sobre a produção.

A Melhor Mãe do Mundo, novo filme de Anna Muylaert, é estrelado por Seu Jorge e Shirley Cruz. Foto: Aline Arruda/+Galeria/Divulgação

“Não fico nervosa, mas tenho um ‘feeling’ quando o filme vai entrar ou não. É claro que, quando chega a confirmação, você fica feliz, porque [estar em um grande festival] muda muito o destino do filme, tanto internacionalmente quanto nacionalmente”, diz ela que achava que o filme, “pelo resultado artístico e pela temática” seria escolhido.

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O processo não é novo para ela: a diretora já esteve no festival alemão outras duas vezes, com o premiado Que Horas Ela volta?, em 2015, e com Mãe Só Há Uma, em 2016. “Cada vez é diferente, mas é uma alegria. Berlim é um festival grande, com gente da Europa inteira, são salas enormes, é o melhor som que eu já vi. É um festival que trata muito bem a direção. E, claro, o primeiro encontro com o público é sempre determinante. Então, é muito emocionante”, explica.

Muylaert também destaca que o filme é muito próximo da realidade do Brasil. Mais ainda da realidade paulistana: foi gravado durante seis semanas no final de 2023 pela capital paulista, em um percurso do Glicério, bairro na região central, até Itaquera, na zona leste, passando inclusive pela Cracolândia. É a rota que Gal percorre quando decide colocar os filhos em sua carroça de reciclagem e fugir da violência doméstica.

“Foi um filme muito físico. Eu fui assaltada, quebrei um dente, tive uma infecção, a gente andava no lixo, andava no sol, pegava chuva. Tinha cena que você fazia metade e começava a chover. Tinha uma coisa de uma luta mesmo, que a personagem passa e eu passei junto, vamos dizer assim”, lembra.

Tudo isso acompanhado do desafio de ter duas crianças no set de filmagens, à época com cinco e 11 anos (os atores Benin Ayo e Rihanna Barbosa interpretam os filhos de Gal). “Quando se filma com uma criança, você não tem tantas horas. E você nunca tem certeza se vai dar certo ou não, se a criança quer fazer ou não.”

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Financiamento e maratona de projetos

A Melhor Mãe do Mundo é também o retorno de Muylaert ao tema da maternidade, presente em muitos de seus filmes. Para Clara Ramos, diretora geral da produtora +Galeria, a seleção para a Berlinale (como é apelidado o Festival de Berlim), “reafirma a relevância e a potência da mensagem” do longa.

“O filme emociona e nos faz refletir sobre como as mulheres se reinventam na maternidade, destacando o impacto transformador dessas histórias em suas comunidades e na sociedade como um todo”, afirma ela. A produção foi realizada pela +Galeria em parceria com o grupo Telefilms e a Biônica Filmes.

A diretora Anna Muylaert. Foto: Marcio Fernandes|Estadão

É o primeiro filme de Muylaert feito 100% com financiamento privado, sem o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), associado ao Ministério da Cultura. “O roteiro é meu, a direção é minha, mas o investimento financeiro é deles. Isso muda, claro. Não sou sócia do filme”, explica ela. O benefício, no entanto, é a velocidade com que a produção é realizada.

Essa agilidade é importante também porque a diretora vive um dos momentos mais movimentados da carreira: ela lançou, no final do ano passado O Clube das Mulheres de Negócios, e embarca para a Alemanha logo depois de voltar do Acre, onde começa a rodar o filme Geni E O Zepelim, adaptação da canção de Chico Buarque.

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“Está sendo bem desafiador, estou bem exausta”, diz ela, narrando a maratona entre viagens, roteiros, filmagens e alguma tentativa de descanso. “Mas, ao mesmo tempo, é muito legal poder trabalhar tanto.”

Cinema nacional em destaque

A estreia de A Melhor Mãe do Mundo na Berlinale é a continuação de um bom momento para o cinema nacional no exterior. É claro que chama a atenção o sucesso de Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, vencedor de diversos prêmios, incluindo de melhor atriz dramática no Globo de Ouro para Fernanda Torres, mas 2024 foi um ano de muitos longas brasileiros em grandes festivais.

Baby, de Marcelo Caetano, em cartaz nos cinemas, esteve na Semana da Crítica do Festival de Cannes, e rendeu um prêmio ao ator Ricardo Teodoro. No mesmo festival, Motel Destino, de Karim Aïnouz, competiu pela Palma de Ouro. Manas, de Marianna Brennand, venceu o GdA Director’s Award em Veneza, e Cidade; Campo, de Juliana Rojas, foi premiado como a Melhor Direção na mostra Encounters, na própria Berlinale.

Em 'A Melhor Mãe do Mundo', novo filme de Anna Muylaert, Shirley Cruz é uma mãe que leva os filhos em uma jornada por São Paulo para escapar da violência doméstica. Foto: Aline Arruda/+Galeria/Divulgação

“A curadoria europeia recebe mais de cinco mil filmes. Quando você entra, é porque de alguma forma realmente interessou”, argumenta Muylaert. “Isso faz toda a diferença, tanto para a venda fora, para que outros países queiram lançar o filme - o que seria ótimo -, quanto [no Brasil], porque já desperta mais interesse nas pessoas aqui.”

A exibição é o primeiro passo de um longo caminho até que o filme chegue aos cinemas nacionais - a previsão é de que ele estreie em agosto de 2025 -, mas já dá ânimo e traz expectativa para que a recepção nacional seja boa, ainda mais em tempos de filmes como Ainda Estou Aqui e O Auto da Compadecida 2 conquistando mais de 3 milhões de espectadores. “Começamos com o pé direito”, celebra Muylaert.

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