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Análise: Mesmo no que parece mais do mesmo, 'Jason Bourne' não cessa de surpreender

Saga prossegue à sombra de Edward Snowden, numa aventura de cortar o fôlego, de tão intensa

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Passaram-se nove anos desde O Ultimato Bourne, em 2004. Houve até um outro Bourne, interpretado por Jeremy Renner, mas não marcou muito. E eis que Matt Damon volta ao papel. O ator foi peça-chave na realização do novo filme. Exortou o diretor Paul Greengrass a retomar a direção. Nestes 12 anos, muita coisa mudou. O cinema de espionagem, por certo. James Bond ficou mais denso e sombrio com Sam Mendes e Daniel Craig, e a verdade é que o êxito da trilogia Bourne estabeleceu um standard, de ação inclusive, que repercutiu no universo de 007. O próprio mundo mudou. O Ultimato era sobre a administração George W. Bush e a guerra ao terror, e por isso tinha cenas em Londres, Nova York e Madri, cidades que haviam sido alvos de ataques espetaculares. A persistir nessa linha, Jason Bourne, que estreia nesta quinta, 28, deveria se passar em Paris, ou pelo menos na França, alvo preferencial dos jihadistas na atualidade.

Jason Bourne muda um pouco o foco. No pós-Edward Snowden, Greengrass e Damon estão mais preocupados com a digitalização dos sistemas de vigilância e o grande risco que representam para as liberdades individuais. O mundo mudou, essa é a verdade. Uma cena do começo de Jason Bourne, supostamente passada na fronteira da Grécia com a Macedônia, teve de ser filmada nas Canárias, depois que a situação começou a ferver na região, em consequência da crise econômica e das tensões entre imigrantes. É o novo quadro – na última década, como Matt Damon diz a Julia Stiles, como Nicky Parsons, ele não tem feito outra coisa senão sobreviver. Ela viola sistemas de segurança da CIA, descobre segredos sobre o recrutamento do herói que ainda o atingem. A violação permite a ascensão da cyber generation nos quadros da agência de espionagem. Lá dentro o choque é agora entre o velho dirigente, Tommy Lee Jones, e a arrivista da nova geração, representada por Alicia Vikander.

Na estreia. O casal Joanna e Paul Greengrass, o diretor Foto: L. E. Baskow/Reuters

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Jason Bourne é uma grande, excepcional aventura. Super bem feita. Ninguém, como Greengrass, sabe filmar esses combates de rua – você vai se sentir no meio de uma batalha que seria campal, se não fosse urbana. Antes de O Ultimato Bourne, o diretor fez Bloody Sunday, Domingo Sangrento, sobre a explosiva situação na Irlanda. Toda a trilogia Bourne criou novos patamares de ação física brutal em espaços exíguos. Tudo isso é bem administrado, Matt Damon não é mais nenhum garoto, tem a cara marcada – pelo tempo e pelas dificuldades de quem vive on the road, na estrada. No fim do Ultimato, Bourne descobria o segredo da própria identidade, David Webb, e agora descobre mais, sobre o envolvimento do pai em programas secretos do governo norte-americano e sobre seu recrutamento para virar o agente letal em que se transformou.

Alicia, como Heather Lee, é visceral nessa história. No começo, tem de ganhar a confiança de Tommy Lee Jones e, por isso, toma atitudes em relação a Bourne que a tornam antipática para o espectador. Depois, muda, no que parece uma crise de consciência. Na verdade, ela tem uma agenda própria, que executa com rigor profissional. Bourne é o eterno sobrevivente. Paul Greengrass não tem ilusões quanto ao estado do mundo. Democracia, liberdade, patriotismo? Você deve estar brincando. Poder – político, econômico, militar. Nesse quadro, a vida humana não vale nada. O que mais se ouve é – ‘Pode matar’. Só que não é fácil, é praticamente impossível matar alguém com as habilidades de Jason Bourne. Seu antagonista, Vincent Cassel, que o diga. A perseguição em Vegas é de tirar o fôlego. Mesmo no que parece mais do mesmo, Bourne não cessa de surpreender.