Já assistiu a Oppenheimer e ficou na dúvida sobre o que é cientificamente real ou inventado no filme?
O novo longa do diretor Christopher Nolan mescla ficção, história e ciência para retratar a Segunda Guerra Mundial.
Aqui, separamos sete questões científicas e históricas retratadas para você conferir se procedem ou não. Veja:
É verdade que Albert Einstein incentivou os EUA a desenvolver arma nuclear?
O site History vs Hollywood conferiu o que procede na história do filme de Christopher Nolan e fez uma lista com os fatos mais curiosos do longa. Na publicação original, o site compara desde fotos das figuras reais com os rostos dos atores caracterizados para a produção até curiosidades ou boatos relacionados aos filmes. E aí oferece a perspectiva histórica correspondente, seja ela verdadeira ou não.
Uma delas é a pergunta acima. A resposta é sim. O célebre físico teórico assinou uma carta apelidada de carta Einstein-Szilard em 2 de agosto de 1939. De autoria do físico Leo Szilard, a carta foi enviada ao presidente Franklin D. Roosevelt, recomendando que ele fornecesse financiamento para pesquisas sobre o potencial de uso da fissão nuclear como arma. A carta alertava que a Alemanha nazista poderia estar realizando pesquisas semelhantes para o desenvolvimento de armas nucleares. O próprio Einstein nasceu na Alemanha.
O nome do programa para criar a bomba atômica era mesmo Projeto Manhattan? Por quê?
Sim. Grande parte da pesquisa inicial tinha sido desenvolvida na Columbia University, a cargo do Corpo de Engenheiros do Exército com sede no Distrito de Engenharia de Manhattan, em Nova York, ganhando em 1942 o codinome “Manhattan”.
O projeto ganhou força com a entrada dos EUA na Segunda Guerra Mundial, em 7 de dezembro de 1941, quando Roosevelt, por medo dos avanços da Alemanha Nazista, ordenou que o programa fosse acelerado e colocado sob o controle do Departamento de Guerra.
Oppenheimer diz, pela primeira vez, a frase ‘Eu me tornei a morte, destruidor de mundos’ para a sua amante, Jean Tatlock?
Não. A frase é dita pela primeira vez por Robert Oppenheimer em um documentário para a televisão da NBC, de 1965. Citando o verso da escritura hindu ‘Bhagavad Gita’, o cientista revelou que o verso veio à sua mente enquanto assistia ao teste da experiência ‘Trinity’, que aconteceu duas décadas antes.
No filme, Oppenheimer diz o verso para a sua amante, Jean Tatlock (Florence Pugh), que lhe entrega o ‘Bhagavad Gita’ e pede que ele o leia, enquanto eles transam. A cena, além de falsa, foi condenada pelo governo indiano, considerada um ataque ao hinduísmo.
Los Alamos de fato existiu? E por que foi escolhida para o Projeto Manhattan?
Sim. Os envolvidos no Projeto Manhattan precisavam de um local isolado para conduzir o programa. Mas o diretor científico, Robert Oppenheimer, e o chefe militar do projeto, general Leslie Groves (Matt Damon), procuravam um lugar que fosse acessível, tivesse clima moderado, muita água ao redor e mão de obra próxima.
O membro do conselho de planejamento do Escritório de Pesquisa e Desenvolvimento Científico do governo dos EUA, Percival C. Keith, foi quem deu a ideia de Los Alamos, no Novo México. E tanto ele quanto Oppenheimer já conheciam a área por razões pessoais.
Porém, como é mostrado no filme, as condições da cidade eram precárias, quase tudo era de madeira, com pouca infraestrutura, bem parecida com uma cidade de um faroeste dos filmes do Clint Eastwood. Aos poucos, o Laboratório de Los Alamos foi ampliado e fortalecido. Hoje em dia, a cidade-laboratório ainda existe, mas agora pertence ao Departamento de Energia dos EUA, gerido pela Universidade da Califórnia e com mais de 10 mil colaboradores, mas os efeitos da radiação nuclear ainda estão presentes.
Era um temor entre cientistas que uma explosão atômica destruísse toda a vida na Terra?
Sim. No filme, o personagem de Cillian Murphy diz ao Groves (Matt Damon) que as chances de uma bomba nuclear destruir o mundo são “quase zero”. Mas, conforme o History vs Hollywood, J. Robert Oppenheimer considerou o que chamou de “terrível possibilidade” de que uma arma nuclear poderia incendiar a atmosfera e os oceanos, destruindo toda a vida na Terra.
A dúvida era se uma bomba de fissão nuclear criaria temperaturas tão intensas que faria com que os átomos de hidrogênio no ar e na água se fundissem em hélio, semelhante ao sol, provocando uma reação descontrolada que acabaria engolindo a Terra, transformando-a em uma estrela em miniatura.
Vários cientistas respeitados expressaram esse medo, incluindo o físico húngaro-americano Edward Teller, que agora é conhecido como “o pai da bomba de hidrogênio”. Porém, os cientistas designados para calcular os riscos chegaram à conclusão de que uma bomba nuclear não atingiria as temperaturas e condições necessárias para incendiar a atmosfera.
Após a guerra, Oppenheimer se manifestou contra a proliferação nuclear?
Sim. Assim como no filme, o físico entendeu os perigos e o potencial de fim do mundo da proliferação nuclear. Após a Segunda Guerra Mundial, ele solicitou regulamentações internacionais sobre energia nuclear em um esforço para evitar uma corrida armamentista nuclear com a União Soviética. Ele também se manifestou contra o desenvolvimento da bomba de hidrogênio.
Os esforços de Oppenheimer, porém, não tiveram sucesso. Suas polêmicas declarações contrárias às armas nucleares resultaram em vários inimigos e o fizeram perder sua influência política, além de ter tido suas credenciais de segurança cassadas pelo governo americano.
Christopher Nolan realmente explodiu uma bomba atômica durante as gravações do filme?
Não. Por mais óbvia que essa resposta possa parecer, como o diretor Christopher Nolan revelou que não utilizou CGI durante a explosão da experiência ‘Trinity’, alguns fãs assumiram que o cineasta teria detonado uma bomba atômica. Em entrevista ao The Hollywood Reporter, Nolan explicou que a explosão foi recriada usando miniaturas, como nos filmes clássicos de Star Wars. Em um estúdio criado para o efeito prático, junto com magnésio, gasolina, propano e pó de alumínio, o supervisor de efeitos especiais Scott R. Fisher e o diretor de Batman: O Cavaleiro das Trevas recriaram o experimento.
Oppenheimer quase matou Niels Bohr com uma maçã envenenada?
Não. Esse é o fato mais controverso retratado no filme. Na cena, vemos que Oppenheimer injeta cianeto na maçã verde que se encontra na mesa de seu professor, Patrick Blackett. Só que, minutos depois, o estudante recebe a visita do físico Niels Bohr, que é interrompido por Oppenheimer quando vai comer a fruta. Só que, na vida real, não existem relatos de que Bohr tenha visitado Blackett e quase comido a maçã envenenada.
A tentativa de envenenamento, por outro lado, parece ter acontecido, mas os biógrafos acreditam que Oppenheimer pode ter injetado alguma substância mais leve na maçã, sem o objetivo de matar Blackett, já que o admirava e desejava a sua aprovação. O professor nunca comeu a fruta, mas a faculdade soube da tentativa de envenenamento e pediu a expulsão do estudante, que foi salvo graças aos pais.
Oppenheimer era comunista?
Não. O filme mostra, de forma bem fiel, o interesse do físico pelas causas sindicais e o apoio ao antifascismo durante a Guerra Civil Espanhola, mas Oppenheimer sempre negou ter se filiado ao comunismo, apesar de seu irmão, sua amante e sua esposa terem relações com o partido comunista.
Porém, o posicionamento do cientista é realmente complexo. Oppenheimer, até os 20 anos, se considerava apolítico, mas anos depois, ele se autodenominava um ‘companheiro de viagem’ do Partido Comunista, apesar de afirmar que nunca foi membro. A frase se originou na União Soviética, e significava alguém simpatizante de uma causa sem realmente fazer parte dela.
Lewis Strauss foi condenado por conta do discurso de David Hill?
Não. No filme, David Hill (Rami Malek) é a testemunha chave para representar toda a comunidade científica na audiência contra Lewis Strauss (Robert Downey Jr.), fazendo com que o governo americano bloqueasse a sua nomeação como parte do gabinete presidencial. Só que esse não foi o testemunho crucial para essa decisão. David Inglis, chefe da Federação de Cientistas Americanos e um dos envolvidos no Projeto Manhattan, testemunhou contra o ex-secretário interino de comércio dos EUA.
Apesar de sua postura, Strauss não traiu Oppenheimer, nem era um espião do Projeto Manhattan. Eles era colegas na Comissão de Energia Atômica dos Estados Unidos, mas tinham opiniões divergentes sobre o desenvolvimento e o uso de armas nucleares, já que Strauss queria construir a bomba de hidrogênio, coisa que Oppenheimer se opunha veementemente.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.