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Destaque da Mostra de SP: ‘Fogaréu’ é baseado em história pessoal da diretora

Filme de Flávia Neves tem sessão nesta terça, 25, na Cinemateca

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Há algo de Lúcio Cardoso, talvez de Luchino Visconti, na goianidade-mineira de Fogaréu. A diretora e corroteirista Flávia Neves baseou-se numa história da própria família, que é um dos destaques desta terça, 25, da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. A ‘boba’ da história é a mãe dela. Em torno dessa figura única, Flávia teceu sua trama de incesto, perversão e decadência. Barbara Colen chega à cidade em meio a uma celebração religiosa tradicional. Como Sandra/Claudia Cardinale em Vagas Estrelas da Ursa, de 1965, vem para investigar a própria origem, mas também para vingar-se. Como na reedição de alguma obra visceral de Lúcio Cardoso, ingressa num mundo de deformidade moral, e física.

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As ‘bobas’ da história fazem parte da tradição goiana. São os enjeitados que as famílias abandonam nas portas dos conventos e orfanatos. Essas crianças, adotadas pelas grandes famílias, passam a viver num regime de escravidão. De cara, Barbara pergunta ao primo, que veste a bata branca e o chapéu cônico associados às celebrações religiosas de Sevilha, na Espanha, se aquilo tem de ver com a racista Ku Klux Klan, terror da negritude no Sul dos EUA. Ele diz que não, mas, sim, metaforicamente, tem tudo a ver. As bobas são as novas escravas, numa estrutura patriarcal que é tóxica.



Barbara encontra o tio - Eucir de Souza - em plena campanha de reeleição. É o prefeito da cidade. O filho - seu primo - concorre a vereador. Quando o tio lhe cobra o que veio fazer, ela cita o inventário da mãe. Barbara foi adotada pela lésbica da cidade, irmã do prefeito, que a leva consigo ao ser expulsa. Em busca da sua origem - da mãe biológica -, ela descobre quem é o pai. Rebela-se. Toca fogo, senão em tudo, em prédios que representam a força das instituições nesse mundo senhorial, e bárbaro.

No Festival do Rio, o júri da Première Brasil - presidido por Antônio Pitanga, ator, e integrado por Cláudia Bessa, produtora, João Jardim, diretor, e Andréa Horta, atriz - atribuiu o Redentor de melhor filme, e também o de melhor atriz à trans Kika Sena, para Paloma, de Marcelo Gomes, que passa nesta terça, às 21h15, no Marquise. Fogaréu recebeu, quase que a título de consolação, somente um Redentor, o de melhor ator coadjuvante para Timothy Wilson, que faz o louquinho - outro enjeitado - da cidade.



Ele fez um agradecimento pungente - à diretora e ao festival - que lhe permitiram provar que um autista pode representar, e muito bem. Fogaréu passa às 15 h de terça, 25, na Cinemateca. Na saída da primeira sessão do filme na Mostra, a produtora Vânia Catani, da Bananeira Filmes, disse que a estreia ocorrerá possivelmente em abril do ano que vem.

São seis meses para que o longa da estreante Flávia Neves tente uma carreira internacional. Se entrasse agora seria talvez o melhor filme brasileiro do ano. O elenco todo, a par de Barbara, Eucir e Timothy, conta com excepcionais participações de Fernanda Vianna, do Grupo Galpão, que faz Arlete, a mulher do patriarca, e Nena Inoue, inesquecível na composição de Mocinha.

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