Documentário ‘Dior e Eu’ registra a coleção de Raf Simons na maison

Dirigido por Frédéric Tcheng, longa acompanha preparativos para destile; veja galeria de fotos e trailer do filme

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Frédéric Tcheng ama a ficção, mas está, como se diz, documentarista. É o diretor de Dior e Eu, que estreia nesta quinta-feira, 27, na cidade. Tem no currículo outros documentários de moda – sobre a lendária Diana Vreeland, que antecedeu Meryl Streep em O Diabo Veste Prada como a bússola da moda nos EUA, e sobre Valentino. Dior e Eu é sobre o primeiro desfile de Raf Simons na célebre maison francesa. Durante dois meses, Tcheng, com uma equipe mínima (“para manter a intimidade”) documentou a chegada de Simons e os preparativos de sua primeira coleção chez Dior.

Essa parte até que foi fácil. “Precisava do aval dele e da maison, mas, francamente, não chegou a ser difícil. Eles gostaram de meus documentários anteriores. Depois de ganhar a confiança de Raf, tudo se passou com relativa facilidade.” Os problemas começaram depois, durante a edição. “Filmei durante dois meses, mas a montagem me tomou muito mais, vários meses. Não era apenas uma questão de selecionar o melhor material, e eu tinha 260 horas de rushes. Era essencialmente o dilema de selecionar o que mostrar, de concentrar as informações, trabalhar o ritmo. Foi trabalhoso, às vezes árduo, mas gostei.”

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Três documentários de moda, para quando uma ficção? “Trabalho atualmente num projeto de ficção, que espero filmar no ano que vem. Não, pode ficar tranquilo que não será sobre moda”, disse o diretor numa entrevista realizada durante sua passagem por São Paulo, aonde veio divulgar o filme. A moda interessa-lhe pela multiplicidade de focos. “É uma atividade econômica importante, envolve criatividade, audácia. E a moda lida com pressupostos estéticos, conceitos de beleza. A moda influencia e é influenciada por mudanças comportamentais. Acredite – tudo isso estará na minha ficção. Estou bem entusiasmado, mas nosso assunto agora é a Maison Dior e a coleção de Raf Simons. Vamos lá”, ele propõe.

Diretor esclarece como o documentário vira ficção em ‘Dior e Eu’

Para começar a falar sobre Dior e Eu talvez seja útil reportar-se aos documentários anteriores de Frédéric Tcheng sobre moda, e a seus títulos. Valentino – The Last Emperor e Diane Vreeland – The Eyes Has to Travel. Como ditadora da moda nos EUA, Diana tinha um olhar acurado e a proposta de Tcheng é fazer com que os olhos do público viajem no olhar da famosa colunista e editora. No caso de Valentino, há uma reverência. Ele foi o imperador da moda, mas não terá sido também, e antes dele, Christian Dior?

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O título do filme pega carona no título da própria biografia de Dior, que enlaça o público e o privado e mostra como o homem, transformado em mito, forçava o primeiro a acomodar-se/ajustar-se às dimensões épicas do segundo. Dior, lembra Tcheng, viveu uma existência relativamente curta, apenas 52 anos, entre 1905 e 57. Ele queria ser artista plástico. Seu pai, comerciante de fertilizantes, queria que o filho estudasse para ser diplomata. Em Paris, seus desenhos o incentivaram a produzir moda. Associado a um empresário, fundou, em 1947, a Maison Dior.

Na França – no mundo –, que se reconstruía após a destruição da guerra, o New Look de Dior instituiu uma mistura de beleza e extravagância. Muito tecido, e o consequente desenvolvimento da indústria têxtil francesa. Exatamente 55 anos depois da morte de Christian Dior, Raf Simons foi contratado pela maison para criar a coleção de 2012. “O que mais me impressionou foi constatar o grau de profissionalização da equipe que assessorou Raf. Todos cerraram fileiras, dedicados e competentes. Raf também me surpreendeu. Não imaginava que ele fosse tão tímido e controlado nem que conseguisse manter a calma para enfrentar as dificuldades que surgiram durante o processo”, relata o diretor.

E, para Tcheng, qual foi a maior contribuição de Simons? “Como o próprio Christian Dior, ele tem a natureza de um artista plástico, de um grande pintor. Trabalha a cor, mas também a linha. A arte de um grande designer de moda consiste em fazer a linha sonhar”, ele define. Além dos próprios documentários, Tcheng estreia – na verdade estreou, em abril do ano passado, no Tribeca Festival de Robert De Niro – seu filme na trilha aberta por diversas ficções que também focaram figuras míticas da moda. Duas ficções sobre Coco Chanel (Coco Antes de Chanel, de Anne Fontaine, com Audrey Tautou, e Coco Chanel & Igor Stravinski, de Jan Kounen, com Anna Mouglalis) e duas sobre Yves Saint Laurent (a de Jalil Lespert com Pierre Niney e a de Bertrand Bonello com Gaspard Ulliel), mais o documentário O Louco Amor de Yves Saint-Laurent, de Pierre Thoreton, sobre a ligação do estilista com Pierre Bergé.

Embora a versão de Lespert tenha levado a melhor no César, o Oscar francês, inclusive valendo a Niney o prêmio de ator, Tcheng concorda com o repórter – a versão de Bonello é superior, e até o ator dá de dez, Ulliel. “Admiro muito Bonello, que possui um verdadeiro temperamento de cineasta, e de autor. Ele pegou uma fase mais criativa da vida de Yves, tem soluções visuais mais ousadas. O filme dele é uma verdadeira ficção sobre a moda de um artista”, avalia. Todos esses filmes estrearam nos cinemas brasileiros e estão disponíveis no mercado de home entertainment.

Tcheng poderia ficar horas falando sobre todos esses filmes, mas é bom retornar a seu Raf Simons – que, como bom francês, carregando na pronúncia, ele chama de Símôns. “Conviver com ele durante dois meses me revelou não apenas o magnífico artista que é, mas também o ser humano.” Tcheng admite que se preparou muito, pesquisando sobre a persona de Simons. Apesar da calma aparente, deu-se conta da tremenda pressão que ele estava sofrendo. “Não é que eu esperasse isso, pensando que seria bom para o filme, mas tornou-se evidente que ele estava chegando a seu limite. Sabia que ele iria ter um colapso. Ninguém com sensibilidade consegue resistir a tanto estresse. Comecei a me preparar, e a preparar a equipe para esse momento.”

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E ele veio. Num momento, Simons colapsa. Chora. “Foi muito, muito forte. Eu estava atento a suas mínimas reações e percebi que seria naquele momento. Tirei o olho do visor e o encarei. Foram apenas alguns segundos, quatro ou cinco, e ele desabou chorando. Nem que eu tivesse planejado a cena, e ele fosse o melhor ator do mundo, o efeito seria tão fulminante. Simons, o artista, se humanizou e vulnerabilizou completamente diante da minha câmera. Mas não quis ser invasivo. Ele se afasta e eu continuo filmando a distância, para que tenha seu momento de solidão.”

Em seu tempo, Christian Dior vestiu algumas das mulheres mais ricas (e célebres) do mundo. O fascínio da marca não diminuiu com o tempo. Celebridades como Jennifer Lawrence, Marion Cotillard – uma aficionada da maison – e Sharon Stone adentraram o universo de Raf Simons chez Dior. “Mas não fui eu que as filmei. Para isso, havia as câmeras dos fotógrafos e cinegrafistas.” Um grande documentário? “Confesso que hesito um pouco em assimilar a definição. Sei que é um documentário, porque não inventei nada, mas ao mesmo tempo é uma ficção porque tem a arte, o suspense da coleção, da acolhida. Não sou nenhum (Alfred) Hitchcock, mas, para mim, o filme tem suspense até para satisfazer o mestre.”

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