Em Hitchcock/Truffaut, o documentarista Kent Jones faz uma celebração – e investigação – do trabalho cinematográfico em torno de um encontro em 1962, que durou dias, entre um jovem diretor francês, François Truffaut, e Alfred Hitchcock, cujo 47º filme, Psicose, foi o maior sucesso de bilheteria e chocou o público quando foi lançado, em 1960.
Ouvir Hitchcock, o mestre do suspense, desconstruindo seu próprio trabalho não é apenas um grande prazer, mas uma revelação. Jones selecionou um grupo de cineastas contemporâneos, como Wes Anderson, Olivier Assayas, Peter Bogdanovich, Arnaud Desplechin, David Fincher, James Gray, Kiyoshi Kurosawa, Richard Linklater, Paul Schrader e Martin Scorsese – que oferecem suas próprias impressões sobre Hitchcock, seu impacto, sua influência, suas obsessões. Abaixo, trechos de entrevista por telefone com Kent Jones que, além de produzir filmes, é diretor artístico da World Cinema Foundation e diretor do New York Film Festival:
Você tinha em mãos 27 horas de áudio. Foi algo avassalador produzir um filme de menos de 90 minutos a partir de conversas que duraram uma semana?
Há momentos das 27 horas em que eles gravaram durante o almoço. No filme, quando estão discorrendo sobre o primeiro “O homem que sabia demais”, você ouve ruído de copos, talheres de prata e objetos. De modo que há muito deste tipo de ruído, pessoas entrando e saindo da sala. Mas, na maior parte, todo este tempo envolveu conversas sobre coisas realmente substanciais.
Alguma coisa que outros cineastas disseram o surpreendeu, que fosse algo inesperado?
Bem, eu diria que eles só me surpreenderam. Quero dizer, havia algumas coisas que sabia que iria ouvir. Sabia que James (Gray) achava que a cena de Kim Novak saindo do banheiro (em Um corpo que cai) foi o maior momento da história do cinema. Mas tudo o que eles disseram me surpreendeu. A descrição de Peter (Bogdanovich) de quando foi à primeira exibição de Psicose é muito bonita.
Você não entrevistou mulheres cineastas no documentário. Procurou alguma?
Sim. Contatei três e por várias razões elas não puderam participar. Infelizmente, temos menos mulheres diretoras. Não podemos tirar cineastas mulheres do nada. Não queria apenas dizer que ‘preciso de uma mulher’. Banalizaria o que é essencialmente uma questão muito complexa que tem um sentido muito mais profundo do que um simples filme.
Truffaut é um cineasta muito diferente de Hitchcock. A Nouvelle Vague francesa teve a ver com liberdade, espontaneidade. E Hitchcock muito mais com controle. Mas havia uma incrível admiração de parte a parte. E os diretores com quem você conversou sobre Hitchcock, cada um deles vem de um lugar diferente também.
Não acho que a ideia de como um diretor influencia outro está retratada de modo preciso (na mídia). Cézanne foi grande admirador de Tintoretto. Você reconheceria isto contemplando seu trabalho?/ TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
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