ORLANDO - Andar pelos parques da Universal em Orlando é avistar, o tempo todo, personagens de diferentes marcas e criadores. Em uma caminhada rápida, você pode se deparar com o Beetlejuice tirando fotos em um canto e, logo depois, cair dentro do mundo mágico de Harry Potter. Depois, caminhar mais um pouco e entrar na selva de Jurassic Park enquanto vê, ao longe, as ativações de Os Simpsons. Como fazer um filme aqui?
Foi essa resposta que o longa-metragem Dois é Demais em Orlando precisou responder ao longo de quase uma década. “Era um projeto de 10 anos e um sonho”, diz o diretor Rodrigo Van Der Put, em entrevista ao Estadão dentro do parque em Orlando. “[A dificuldade] era a logística de filmar aqui. Muitos filmes gravaram uma cena ou outra dentro do parque, mas nós gravamos quase tudo. A preparação para gravar demorou muito, muito, muito.” O filme chega aos cinemas nesta quinta, 28.
Entre direitos autorais
Realmente, não tinha como encontrar outra saída para Dois é Demais em Orlando senão rodar o filme todo nos parques. Afinal, o longa-metragem conta a história de João (Eduardo Sterblitch), um rapaz apaixonado pelo mundo de Jurassic Park e que sonha em conhecer o complexo de Orlando para ver a Velociraptor do filme de perto. O que ele não esperava é que sua chefe iria pedir para levar junto o filho dela - para entregá-lo ao pai. Tem como dizer não?
Mas o menino é mimado, o pai não aparece para buscá-lo e João vira baby-sitter e aprende a conviver com as diferenças para salvar seu emprego e superar um trauma de infância.
Para essa ideia ganhar vida, a produtora Luciana Boal Marinho conta que o filme passou por algumas mudanças. Inicialmente, a ideia é que João fosse apaixonado por Harry Potter – hoje, talvez, ainda a atração mais badalada dos parques, com gente passeando pelos cenários o tempo todo. Só que não conseguiram a autorização. Foi aí que partiram para a ideia de colocá-lo como um apaixonado por Jurassic Park.
Era um pesadelo jurídico”, explicou Luciana, enquanto a reportagem aguardava a entrada para a exibição do filme em Orlando. “Era preciso aprovar tudo com vários escritórios, com diferentes estúdios. E muita coisa não imaginávamos: não era permitido usar uma camiseta dos Minions, por exemplo, e uma pantufa de Jurassic Park. Precisávamos pensar em tudo.”
Mas funcionou: o filme acabou colocando como protagonista, ao lado de Edu e Pedro, a nova montanha-russa VelociCoaster. Inspirada no universo de Jurassic Park, ela conta com loopings que deixam até mesmo a tradicional montanha-russa do Hulk alguns degraus abaixo. O grande desafio do personagem, assim, é enfrentar o brinquedo – a reportagem do Estadão ficou esperando o grupo andar na montanha-russa do lado de fora, sem coragem de enfrentar subidas e descidas do carrinho.
Gravações entre horários
Outro ponto de preocupação que surgiu era simples: como gravar o filme sem atrapalhar o funcionamento do parque, mas, também, sem fazer com que soasse artificial - sem, por exemplo, ter visitantes passando por ali? Era preciso ter uma agenda afiada para unir os dois mundos.
“Acordávamos muito cedo. Chegávamos aqui duas, três, no máximo quatro da manhã. Depois, o almoço era às sete da manhã. Era o único jeito de conseguirmos filmar”, conta Sterblitch. A ideia, assim, era gravar os atores em brinquedos ou em determinadas áreas do parque com ele fechado, depois cenas do exterior com o público andando por ali. “Era uma estratégia mesmo. Mas foi interessante, já que tivemos a sensação de trabalhar no parque.”
Pedro Burgarelli, de apenas 14 anos, viveu um sonho durante as gravações: morou no parque durante os 40 dias de filmagem – e sequer conhecia Orlando antes do filme. “Foi muito diferente. Uma experiência única mesmo”, diz o ator-mirim. “Mas eu gostava de acordar às 2h, ver o pessoal nos bastidores, repondo os estoques.”
Um bom resultado
E deu tudo certo. Dois é Demais em Orlando é bonito e engraçado. A relação entre João e Carlos Alberto, o filho da chefe, convence – e dá para dar boas risadas, principalmente na rivalidade que criam com Dr. Anderson Cabelo (Daniel Furlan), um outro visitante.
Sterblitch, aliás, se reafirma como um dos grandes nomes do humor: ele traz toda sua bagagem em uma comédia que lembra Jim Carrey, enquanto aposta em boas tiradas em um humor que não ofende. “Esses atores que fazem filmes que vimos 60 mil vezes, como Jim Carrey, Robin Williams, Peter Sellers, Eddie Murphy, fazem comédias que vemos várias vezes e veremos para sempre”, diz. “Eu quis me inspirar nessa sensação que eu tinha quando vi esses filmes. Eu acho interessante essa saudade que se dá vendo um filme.”
‘Só consigo trabalhar feliz’
Quem olha de longe, não faz ideia. Mas Eduardo Sterblitch parece ser uma pessoa tímida – durante o tapete vermelho nos Estados Unidos de Dois é Demais em Orlando, no início do mês, o ator parecia até um pouco desconfortável com tanta atenção. Dá para dizer até que ele nem esperava estar onde está hoje, pensando que começou com o humor mais escrachado do Pânico, como Freddie Mercury Prateado e Poderoso Castiga.
Hoje, sua carreira está diversificada e cada vez mais interessante. Em entrevista ao Estadão em Orlando durante a promoção de seu novo filme, ele diz o que mais deseja: se comunicar para toda a família, sem barreiras. Hoje, além do trabalho dramático em Os Outros, também é a estrela do musical Beetlejuice, agora nos teatros de São Paulo. Com o novo filme, busca se comunicar com a família toda – incluindo os pequenos. E, em breve, estará nos esperados Auto da Compadecida 2 e Grande Sertão.
O que o motiva hoje? “A gente sempre recebe projetos, a gente sempre recebe convites. E eu aceito rápido os que a gente tem que aceitar”, diz Eduardo. “[O que me atraiu neste filme] foi poder falar sobre todas essas questões que o filme fala de uma maneira muito simples, fácil de digerir. Isso me pegou. E também trabalhar com uma criança: isso renovou minha comédia, minha forma de trabalhar. Me dá uma nova energia. Eu sempre trabalho assim, com coisas que eu vou ficar apaixonado fazendo. Eu só consigo trabalhar feliz.”
Nessa toada, em buscar o que o deixa feliz, Sterblitch trilha uma carreira diversa, com mais projetos acertados do que equivocados. “Isso é para mostrar para a TV Globo que posso trabalhar em qualquer função”, diz ele, rindo. “Crio provas de Big Brother, carrego coisas. Eu só não quero ficar desempregado.”
*O repórter viajou a convite da H20 Films, MPC Filmes e Universal Orlando Resort.
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