Os artigos sobre Harvey Weinstein e o subsequente movimento #MeToo desencadearam uma avalanche de acusações contra figuras poderosas e, em última instância, reconfiguraram a forma como a imprensa cobre as histórias de poder e abuso sexual.
Segundo Ronan Farrow, cujo trabalho de jornalismo investigativo foi chave para a queda de Weinstein, “a disposição para noticiar esse tipo de crime é mais forte nas redações do que há cinco anos”.
“Parece que estamos em uma era realmente promissora em relação à vontade de repórteres e editores de ir atrás de vacas sagradas e confrontar instituições poderosas”, declarou o colaborador da revista The New Yorker.
As revelações de Farrow sobre Weinstein lhe renderam em 2018 um prêmio Pulitzer - que ele compartilhou com Jodi Kantor e Megan Twohey, duas repórteres do jornal The New York Times.
Após as primeiras histórias publicadas por esses dois veículos, em outubro de 2017, a cobertura midiática do #MeToo e de casos de abuso sexual aumentou 52% no ano seguinte, segundo a organização feminista Women’s Media Center. “Esse foi um ano em que a mídia e a própria verdade estiveram sob assédio”, disse a presidente da organização quando o estudo foi publicado.
“Ao expor práticas individuais e institucionais horríveis, vemos uma oportunidade para nova transparência e mudanças permanentes em direção a uma maior igualdade e poder para as mulheres.”
Nova era
Depois do caso de Weinstein, as denúncias de atos criminosos de figuras importantes como o financista Jeffrey Epstein e o cantor R. Kelly foram reexaminadas à luz de uma nova era, e as acusadoras foram levadas muito mais a sério.
Para Scott Berkowitz, presidente e fundador da Rainn, organização americana contra violência sexual, “uma das grandes consequências do #MeToo tem sido mostrar às pessoas que elas não estão sozinhas, que isso é algo que acontece a milhões de pessoas”.
A Rainn gerencia a linha telefônica nacional de agressão sexual dos Estados Unidos e, segundo Berkowitz, nos cinco anos desde #MeToo, as chamadas duplicaram. “Acredito que ver mais conversas sobre o tema faz com que se sintam mais seguras de falar o que viveram”, diz ele.
Desde a criação da Rainn, há quase 30 anos, “há uma melhora constante na maneira como é feita a cobertura do tema”, explicou Berkowitz à AFP. “A mídia como um todo é agora muito mais consciente de que há um sobrevivente por trás da história” e, portanto, cobre isso “com empatia e compreensão”, garante.
Investigações
Além disso, explica Farrow, nos últimos anos os jornalistas passaram a considerar que a violência sexual merece ser investigada como, por exemplo, os crimes corporativos ou os relacionados à segurança nacional.
“Acredito que parte do problema que surgiu em torno dessa questão em particular é que houve uma espécie de silenciamento da violência sexual, que era vista como um tema menos refinado do que outros tipos de reportagens sobre crimes”, aponta ele.
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