Ricardo Darín concordou plenamente com Pedro Almodóvar de que é um paradoxo premiar em Cannes um filme que não chegará aos cinemas. Mas reconheceu: “Estamos inaugurando novas etapas e é preciso ter a mente sempre aberta para levar o público ao cinema”. Segundo ele, é necessário saber como enfrentar uma nova era que já está aqui, na qual será preciso revisar conceitos estabelecidos. “Não se pode dar as costas ao avanço tecnológico e às redes sociais à disposição do espectador.” “É uma luta continuar fazendo as pessoas saírem de casa para assistir a um filme na telona, em uma sala na qual se reúnem muita gente que não se conhece”, disse o ator argentino em Cannes, onde apresenta na seção Um Certo Olhar o filme A Cordilheira, de seu compatriota Santiago Mitre. A tendência, ressaltou Darín, “é que ninguém mais saia de casa e, num aparelhinho, decida a que filme e quando assistir”. Por isso, insistiu em que “entende perfeitamente a posição de Pedro Almodóvar”, que chamou de “valente” por sua defesa do cinema, sobretudo por fazer isso da posição de presidente do júri da competição oficial de Cannes. “Mas precisamos estar atentos e abertos para ver como ficamos frente a essa nova era”, acrescentou Darín, muito à vontade numa entrevista coletiva com jornalistas espanhóis.
Sem levar muito a sério o fato de ser responsável por alagumas das maiores bilheterias do cinema em língua espanhola, pediu desculpas por levar tanta gente às salas de exibição e não ir buscá-las em seguida, deixando-as, segundo ele, perderem-se pelo caminho. Brincou com uma das companheiras de elenco do filme, Érica Rivas, com a qual faz também uma peça de teatro, dizendo que poderiam ser um casal na vida real. Assegurou que “concorda em tudo” com Nicole Kidman - a única diferença entre eles é a de altura: “Ela tem 37 centímetros mais que eu”, afirmou, desta vez, muito sério. Respondeu assim a uma pergunta sobre declarações de Nicole em Cannes, quando a atriz afirmou que neste ponto da vida só faz o que realmente lhe interessa. “Já eu só faço o que os outros dizem, mas decidi que vou seguir o caminho de Nicole”, afirmou Darín, acrescentando: “Quem dera que alguém pudesse fazer só o que quer, só o que o move internamente”.
Mas lembra que há outros parâmetros a se levar em conta, como as amizades, os gostos pessoais, a leitura. Muito importante para ele é “ler uma história, sentir-se dominado por ela e, involuntariamente, já passar a fazer parte de um projeto que não se sabe se será ou não realizado”. Darín sentiu essa conexão instantânea ao ler as histórias que levaram a alguns de seus filmes. como O Filho da Noiva, Nove Rainhas, O Segredo de seus Olhos e O Elefante Branco. Mas ele assegura não ter a chave para se chegar ao sucesso. “Honestamente, não sei como funciona. Há atores e atrizes com química, bons diretores e roteiros e histórias fantásticas, mas nem sempre isso é suficiente para cair no gosto do público.” “A plateia responde seguindo parâmetros que achamos que estão sob nosso controle, mas na realidade, não estão. Por isso surpreende que uma boa história, ainda que sem grandes nomes, às vezes seja ser muito atraente para a plateia e outras vezes, não.” Em todo caso, o objetivo final é sempre o mesmo: levar o maior número de pessoas ao cinema. “Mas não acredito em fórmulas comprovadas. Tudo está permanentemente em movimento e dependemos de algumas coordenadas que possam ou não levar a um resultado positivo. É estranho, mas é assim.” / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ
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