Foi a maior bola cantada - Oppenheimer, como se previa, tornou-se o grande vencedor do Oscar de 2024. Além do troféu de melhor filme, levou os de direção (Christopher Nolan), ator (Cillian Murphy), coadjuvante (Robert Downey Jr.), além dos de montagem, fotografia e trilha sonora. Sete Oscars dos 13 a que estava indicado. Nada mal.
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Vitória justa, que pode ser comemorada ao sinalizar uma volta de Hollywood ao cinema adulto, depois do fiasco do ano passado. Oppenheimer, baseado na história do “pai da bomba atômica”, tem como mola propulsora uma discussão ética. Deve o conhecimento ser usado na fabricação de armas de destruição em massa? Não é pergunta simples de ser respondida. Ainda mais no contexto em que Oppenheimer foi convocado para dirigir o projeto Manhattan, que criou a primeira bomba atômica da história da humanidade. Estava em plena guerra mundial, com a Alemanha na dianteira do processo de fissão atômica que levaria à arma fatal. Já imaginamos o que faria Hitler com a bomba atômica nas mãos? Era o que se perguntava Oppenheimer e os cientistas que o cercavam. O próprio Albert Einstein, um pacifista convicto, vacilava em sua resposta.
Fale-se o que quiser de Oppenheimer, mas não se pode dizer que barateie dilema tão intenso. Ainda mais porque o cientista, depois do bombardeio em Hiroshima e Nagasaki, engaja-se numa missão pacifista que visa impedir o desenvolvimento de armas ainda mais potentes como a bomba de hidrogênio. E isso num momento em que ocupava ainda alto cargo de confiança num governo já envolvido com a Guerra Fria. Essa dimensão política se soma aos tormentos de consciência de um homem, e ambos completam a complexidade do filme.
A interpretação do personagem principal por Cillian Murphy é brilhante e a premiação era dada como certa, como de fato se confirmou. Robert Downey Jr. viveu com brio o antagonista de Oppenheimer, o maquiavélico Lewis Strauss, e mereceu seu prêmio. Os troféus técnicos reconhecem a solidez do longa e a direção de Nolan, intensa, precisa e cheia de idas e vindas no tempo, dá forma à densidade de projeto.
O segundo maior premiado foi Pobres Criaturas, com quatro troféus técnicos e o mais importante, o de melhor atriz, para Emma Stone. Nessa categoria, a disputa era acirrada, entre Emma e Lily Gladstone, personagem de Assassinos da Lua das Flores, de Martin Scorsese, que, indicado em 10 categorias, não levou nenhum prêmio. O colégio eleitoral do Oscar acabou por se inclinar para a atuação corajosa de Emma Stone, que interpreta uma mulher com cérebro de criança, que dá vazão a todos os seus desejos - sexuais em especial. Sua atuação desinibida contrasta com o moralismo do tempo atual, o que já é um trunfo a seu favor.
Já Os Rejeitados, que começava a pintar como um azarão, teve de se contentar com o troféu para Da’vine Joy Randolph, que era mesmo a favorita nessa categoria. É um filme simpático, humanista e que acredita na capacidade de redenção do ser humano, sem ser ingênuo. Também estamos necessitados de obras como essa.
Outro que virou um queridinho da crítica na reta final, o engenhoso Ficção Americana, ficou com a estatueta de roteiro adaptado, de Cord Jefferson. É bom filme e tem a coragem de discutir os efeitos do politicamente correto indiscriminado sobre a vida cultural contemporânea. Usa a ironia e o sarcasmo em sua crítica, e isso também é positivo numa época em que tudo é (mal) entendido de forma literal.
Como filme internacional, venceu aquele que era apontado como o favorito por especialistas e apostadores - Zona de Interesse, de Jonathan Glazer. Baseado na obra de Martin Amis, mostra o cotidiano pacato de uma família de alemães que mora ao lado do campo de extermínio de Auschwitz. A banalidade do mal está inscrita no cerne deste filme que gela a alma dos espectadores ao expor, de forma indireta, o horror do Holocausto.
Na categoria documentário acabou vencendo também o que todos esperavam, 20 Dias em Mariupol, duro registro do cotidiano da cidade ucraniana sob bombardeio russo. É a guerra, em sua crueza e seus efeitos sobre as principais vítimas - a população civil, em especial mulheres e crianças. Duro de ver, porém necessário.
Outros estrangeiros brilharam no Oscar 2024. O francês Anatomia de uma Queda levou o troféu de roteiro original. O Menino e a Garça, lindo trabalho do mestre Hayao Miyazaki, foi o melhor longa de animação. E o também japonês Godzilla Minus One ficou com o troféu de efeitos visuais.
Entre os maiores derrotados, está Barbie que, de oito indicações, cravou apenas uma - a de canção original (What Was I Made For?). Mais do que bom, dada a natureza de projeto comercial de promoção de uma marca de bonecas, travestido de mensagem feminista.
Mas o maior derrotado, sem dúvida, foi Assassinos da Lua das Flores, filme importante, dirigido de maneira inspirada por Martin Scorsese. Teve dez indicações e não converteu nenhuma em prêmio. Isso diminui o valor da obra? Em hipótese nenhuma. Relativiza a euforia com os critérios da Academia de Hollywood que, sem dúvida, melhoraram bastante em relação aos do ano passado, mas deixaram escapar o reconhecimento a esse grande e oportuno trabalho de um dos últimos mestres do cinema mundial.
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