Diga “Maggie Smith”, e a maior parte das pessoas vai se lembrar da Professora Minerva McGonagall da saga cinematográfica Harry Potter e de Violet Crawley, a Condessa Viúva de Grantham da série Downton Abbey. Mas a atriz inglesa, que morreu nesta sexta-feira, aos 89 anos de idade, foi muito além de seus papéis mais populares.
Curiosamente, a atriz famosa por essas duas personagens ácidas, impacientes, de nariz meio empinado, capazes de exercer autoridade sem jamais levantar a voz, começou sua carreira fazendo comédias e musicais nos palcos. Não que a Professora Minerva e Violet Crawley fossem desprovidas de humor. Mas era um humor fino, irônico, seco. Não dá para dizer exatamente que eram pessoas engraçadas.
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Foi fazendo comédia que ela chamou a atenção de Laurence Olivier, um dos grandes maiores do teatro inglês. Durante oito anos, competiu em talento com o astro dos palcos britânicos, fazendo papeis como Desdêmona no Othello de William Shakespeare. Sua carreira no teatro lhe renderia um recorde de seis prêmios Evening Standard de melhor atriz, além de um Tony.
A parceria terminou mal, quando Olivier substituiu Maggie Smith, grávida de seu primeiro filho, na peça The Way of the World, que dizia ser perfeita para ela. Em uma carta, a atriz não escondeu seu descontentamento, dizendo ser impossível confiar em Olivier novamente. Na vida, como em suas personagens célebres, Maggie Smith não tinha medo de dizer o que pensava. Aliás, dizem que ela não devia nada a Violet Crawley no quesito língua ferina.
Nessa época, ela já tinha estreado no cinema. Depois de uma figuração em Child in the House (1956), concorreu a primeira de suas 18 indicações ao BAFTA pelo filme policial Nowhere to Go (1959). Sua primeira indicação ao Oscar veio pouco depois, justamente por sua interpretação de Desdêmona na versão cinematográfica de Othelo (1965), dirigida por Stuart Burge – e em que contracenava novamente com Olivier, que concorreu ao Oscar de ator.
Ela continuou alternando teatro e cinema, mostrando sua versatilidade, fazendo de Hedda Gabler a comédias de Noël Coward, uma mulher excêntrica em Viagens com Minha Tia (1972) e uma adaptação de Morte no Nilo (1978), de Agatha Christie.
Seu primeiro Oscar veio com A Primavera de um Solteirona (1969), de Ronald Neame. Jean Brodie é uma professora com ideias românticas que impressiona suas jovens alunas, entrando em conflito com a direção. Maggie Smith é exata tanto nas cenas mais leves quanto nas mais dramáticas, mostrando sua versatilidade e talento para todos os gêneros. Seu segundo Oscar, desta vez de coadjuvante, veio com outra comédia, California Suite (1978), em que fazia um papel que a essa altura conhecia bem: uma atriz britânica indicada ao Oscar pela primeira vez. A diferença é que, ao contrário da personagem, ela sempre teve muitas chances de ganhar estatuetas.
Em geral, quem acompanhou a carreira de Maggie Smith nos anos 1980 e 1990, principalmente, pensa nela como uma atriz de comédia ou pelo menos uma atriz com grande timing cômico. No drama romântico Uma Janela para o Amor (1985), por exemplo, ela é responsável por diversos momentos deliciosos de leveza, que lhe renderam outra indicação ao Oscar de atriz coadjuvante. Sua presença na tela é simplesmente irresistível, deixando o espectador com vontade de vê-la mais – mesmo tendo à sua volta outros grandes atores, como Helena Bonham Carter, Daniel Day-Lewis e Judi Dench.
Ela sempre teve essa capacidade. Nem Minerva nem Violet são papéis grandes em número de cenas, mas são memoráveis por causa de Maggie Smith.
Em 2019, quando podia simplesmente estar coletando os polpudos pagamentos – sua aposentadoria, como ela costumava dizer – por Harry Potter e Downton Abbey, ela resolveu se arriscar mais uma vez. Aos 85 anos de idade, retornou aos palcos depois de 11 anos para fazer um monólogo em que interpreta uma ex-secretária de Joseph Goebbels, o ministro da propaganda de Adolf Hitler. E, em 2023, foi uma das modelos da coleção primavera-verão da grife Loewe. Coragem nunca lhe faltou.
Foi uma carreira e tanto. Que seja lembrada majoritariamente por duas séries tão populares não deveria ser motivo de tristeza. Maggie Smith é uma das poucas atrizes que fizeram grande sucesso e tinham participação essencial e insubstituível em obras lançadas quando já contavam mais de 65 anos de idade. É mais uma prova de seu talento, carisma e personalidade únicos.
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