Mágoa do pai, dívida, amor e mais: 6 lições do documentário ‘Super/Man’ sobre Christopher Reeve

Filme que está em cartaz nos cinemas conta a vida do ator eternizado pelo papel do herói e de sua vida após um acidente o deixou paralisado do pescoço para baixo, fala de amizade com Robin Williams e mostra como a família do ator abraçou seu legado

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Por Melena Ryzik (The New York Times)

O documentário Super/Man: A História de Christopher Reeve, em cartaz nos cinemas, conta a história da vida do ator formado pela Juilliard que alcançou o estrelato nos anos 1970 e 1980 interpretando o Super-Homem e, em 1995, como um tipo diferente de herói, depois que um acidente o deixou paralisado do pescoço para baixo.

O filme apresenta imagens inéditas de Reeve, que morreu em 2004, aos 52 anos, narrando sua infância, sua amizade fundamental com seu colega de quarto na Juilliard, Robin Williams, e sua transformação em importante defensor das pessoas com deficiência e da pesquisa no campo. Amigos como Glenn Close, Susan Sarandon, Whoopi Goldberg e John Kerry dão testemunhos; ativistas dos direitos dos deficientes também. É um filme que derrama lágrimas.

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Também funciona como um filme de família, mostrando Reeve em seu papel de pai de três filhos – Matthew Reeve e Alexandra Reeve Givens, de um relacionamento anterior, do qual ele fugiu no auge da fama, e Will Reeve, com sua mulher, Dana Reeve. Com apoio inabalável, ela abandonou a carreira de cantora e atriz para cuidar do marido. Ela morreu de câncer em 2006, apenas dezoito meses depois dele, deixando o filho, então com 13 anos.

A tragédia é amenizada pela esperança que Christopher Reeve legou, especialmente com a Christopher & Dana Reeve Foundation, que investiu US$ 140 milhões na busca de uma cura para a paralisia da medula espinhal. O filme – que chegou aos cinemas 20 anos após a morte de Christopher Reeve, quase no mesmo dia – narra a determinação deles e não se esquiva dos momentos mais sombrios, como preocupações com dinheiro e os infinitos cuidados diários.

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Christopher Reeve como Superman. Ele é tema do documentário 'Super/Man: A História de Christopher Reeve', em cartaz nos cinemas. Foto: Warner Bros. Pictures / Divulgação.

A abordagem franca – e o momento oportuno, pois os filhos de Reeve agora estão adultos – levou os irmãos a concordarem com o projeto depois de anos recusando outras ofertas, disse Will Reeve, 32 anos, correspondente da ABC News e sósia de seu pai. Eles esperavam que os filmes caseiros e o material de arquivo “dessem um significado mais profundo e uma textura maior à história dele”, disse, “e lembrassem às pessoas a plenitude de vida, apesar de qualquer lesão catastrófica que possam sofrer, qualquer deficiência que possam ter”.

Numa entrevista em vídeo de Londres, os cineastas Ian Bonhôte e Peter Ettedgui falaram sobre a justificativa para não colocar Reeve “no pedestal”, como Ettedgui descreveu. “Era muito importante mostrar como alguém que você pode considerar perfeito – o herói ideal – passa pelas mesmas inseguranças, pelos mesmos problemas familiares que o resto de nós”, disse ele.

Aqui vão algumas conclusões do filme.

Para o pai, nem mesmo o Super-Homem estava à altura

Reeve nasceu em Nova York, num ambiente privilegiado. Depois do divórcio, sua mãe, Barbara Lamb, que era jornalista, se mudou com ele e seu irmão mais novo para Princeton, Nova Jersey. Seu pai, F.D. Reeve, era um grande acadêmico e poeta, carismático e atlético, mas também distante e dominador.

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“Logo na pesquisa, tivemos a sensação de que Chris era assombrado pela figura de seu pai”, disse Ettedgui. No documentário, Christopher Reeve diz: “Eu achava que jamais conseguiria fazer alguma coisa para impressioná-lo”. E acrescenta: “Quando ele estava por perto, era difícil ser eu mesmo, ou literalmente respirar tranquilamente”.

O Reeve pai chegou a se animar um pouco quando o filho foi escalado para o papel de Super-Homem – mas só até perceber que o filme de Richard Donner se baseava no personagem dos quadrinhos, e não no drama de George Bernard Shaw, Man and Superman, de 1903.

Mas Reeve era parecido com seu pai em alguns aspectos

Christopher Reeve também era um atleta multifacetado: “Fazer as coisas com meu pai era uma questão de atividade e ação”, diz Matthew Reeve no filme. “Andar de bicicleta, jogar futebol, esquiar, nadar, andar a cavalo com minha irmã.

“Ele era um cara intenso”, acrescenta Matthew. “Você não podia falhar e desistir. Era tentar, falhar e tentar de novo.”

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Reeve teve Matthew e sua irmã, Alexandra, com Gae Exton, uma agente de modelos britânica que ele conheceu durante as filmagens de Superman, em Londres. Eles nunca se casaram, e Reeve nem sempre foi um pai confiável. No dia seguinte ao nascimento de Matthew, ele saiu para esquiar na França. Por fim, voltou aos Estados Unidos para curtir a solteirice e o estrelato. “Ele abandonou Gae e abandonou os dois filhos num determinado momento”, disse Ettedgui. (Reeve continuou vendo os filhos nas férias escolares).

Mas quando ele ficou paralítico – depois de cair de um cavalo numa competição de equitação – sua conexão com a família, até mesmo com o pai, mudou e se aprofundou, dizem seus filhos e Exton no documentário.

Robin Williams era um irmão

Um dos pilares: sua amizade com Robin Williams. Eles se chamavam de irmãos e eram padrinhos dos filhos um do outro. Williams, comediante e ganhador do Oscar, foi um dos primeiros a visitar Reeve no hospital depois do acidente. E o fez interpretando o papel de um proctologista russo. Reeve tempos depois disse que dar risada fortaleceu sua vontade de sobreviver.

Williams, que sofria de demência com corpos de Lewy, morreu por suicídio em 2014. No filme, Close, amiga dos dois atores, diz: “Sempre achei que, se Chris ainda estivesse por perto, Robin ainda estaria vivo”.

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Essa fala atraiu suspiros durante a produção, disseram os cineastas, e eles tiveram dificuldade em incluí-la, temendo que pudesse incomodar familiares. Mas ela também mostrou a profundidade do vínculo entre dois homens que conheceram a escuridão em meio ao estrelato.

Até mesmo o Homem de Aço brigou contra as seguradoras

Um aspecto surpreendente do documentário é a preocupação da família Reeve com dinheiro. O público pode imaginar que um astro de seu calibre estava garantido para o resto da vida. O primeiro filme do Super-Homem rendeu quase US$ 1,5 bilhão de dólares nos valores de hoje, e ele fez três continuações. E os Reeve estavam definitivamente muito mais tranquilos do que a maioria das pessoas.

Christopher Reeve em Superman Foto: Warner Bros./Divulgação

Mas, na época do acidente, disse Ettedgui, Reeve estava fazendo filmes para a TV para pagar as contas – um ganha-pão cuja carreira estava em declínio. Seus cuidados contínuos em casa custavam US$ 400 mil por ano, com um limite de US$ 1,2 milhão no seguro vitalício, como Dana Reeve descobriu enquanto ele estava em reabilitação.

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Williams e sua mulher na época, Marsha Williams, intervieram muitas vezes como benfeitores financeiros. Ettedgui disse que eles até instalaram um gerador, “a um custo altíssimo”, na casa de Reeve em Pound Ridge, Nova York, para o caso de a energia falhar, o que ameaçaria o funcionamento de seu ventilador.

E enquanto Christopher Reeve continuava a ganhar a vida – escrevendo livros, dirigindo e atuando – ele também fazia lobby junto ao Congresso para aumentar os limites dos seguros de vida.

Aquele discurso no Oscar foi conquistado com muito esforço

A emocionante apresentação de Reeve no Oscar de 1996 – menos de um ano depois do acidente – foi um ponto de virada pessoal e social. Ele tinha superado as expectativas médicas desde o início. Ao ser aplaudido de pé por mais de um minuto por uma plateia às lágrimas, ele pareceu curtir o momento.

O documentário detalha os árduos meses de preparação e logística para levá-lo a atravessar o país até subir àquele palco, com riscos consideráveis à sua saúde.

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Seu discurso, que apresentou uma montagem de filmes sobre causas sociais, também foi um dos raros casos na época em que uma pessoa com deficiência recebeu esse tipo de plataforma. Foi “um momento que mudou completamente o jogo”, disse Bonhôte.

“Ele conseguiu criar uma memória que foi importante para muitas pessoas durante décadas”, disse Will Reeve, “mas também foi importante para ele, pessoalmente, provar a si mesmo que era capaz de sair pelo mundo – literalmente algo tão básico quanto fazer qualquer coisa, viajar e não ficar confinado em casa pelo resto da vida”.

A família abraçou um legado doloroso, mas orgulhoso

Will Reeve tinha apenas 3 anos quando o pai ficou paralítico. Ele criou o hábito de assistir a vídeos de entrevistas e programas de TV com seus pais no YouTube. “Com o passar dos anos, vejo tudo de novo, só para passar um pouco mais de tempo com eles”, disse. Mas grande parte das imagens de antes do acidente – quando seu pai estava “voando alto”, como disse Will – era nova para ele. Então, ver o filme “foi uma alegria e um presente nostálgico”, disse ele.

Sua experiência com Reeve como pai foi complexa. “Eu não o conheci da maneira que ele gostaria que eu conhecesse”, disse ele, “e lamento isso”.

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“Mas o que eu tive”, acrescentou, ‘foi um pai totalmente presente emocional e espiritualmente, que expressava seu amor, apoio e incentivo por mim todos os dias”.

“Eu sabia que ele tinha orgulho de mim”, disse ele. “Minha mãe me dizia o mesmo. Nada ficou sem ser dito. Eles sabiam como aquele tempo era precioso.”

Junto com seus irmãos, Will Reeve está envolvido na fundação que leva o nome de seus pais. Sua experiência também lhe dá uma perspectiva que atrai as pessoas.

“Durante a maior parte da minha vida, as pessoas compartilharam comigo suas histórias de luta, de sofrimento e de tragédia”, disse ele. “Suas histórias de inspiração e motivação. Isso veio de meus pais e da história deles.”

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“E isso é muito gratificante”, acrescentou ele, “porque posso falar sobre meus pais, o que os traz para o presente comigo. Eles já se foram há uns 20 anos. E ainda têm um efeito sobre as pessoas. Isso é muito importante para mim. É uma honra”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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