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'O Silêncio da Chuva' traz Lázaro Ramos como o detetive Espinosa de Luiz Alfredo Garcia-Roza

Adaptação do primeiro romance do autor morto em 2020 tem desenvolvimento de uma investigação clássica, tão tortuosa quanto o caráter dos personagens

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio

O detetive Espinosa (Lázaro Ramos) participa de uma roda de samba num boteco quando seu celular toca. Um corpo foi encontrado dentro de um carro. Pronto: acabou o samba. E começou O Silêncio da Chuva, nova adaptação de um livro de Luiz Alfredo Garcia-Roza para o cinema, desta vez dirigida por Daniel Filho. Espinosa já foi personagem de uma série de TV, com Domingos Montagner no papel principal. Achados e Perdidos (2006) foi para o cinema sob a direção de José Joffily, com Antonio Fagundes na pele de um detetive aposentado. Berenice Procura (2018) é dirigido por Allan Fiterman. 

Lázaro Ramos em 'O Silêncio da Chuva' Foto: Mariana Vianna

O Silêncio da Chuva tem o desenvolvimento de uma investigação clássica. O morto, o empresário Ricardo (Guilherme Fontes), foi assassinado? Por quê e por quem? As perguntas conduzem Espinosa e sua assistente Daia (Thalita Carauta) à viúva, Beatriz (Cláudia Abreu), etambém à secretária do executivo, Rose (Mayana Neiva). Para compor o quadro, outros personagens entram em cena, como o corretor de seguros vivido por Otávio Müller e o pai de Beatriz, o empresário picareta Anselmo Vasconcellos.  A investigação é tão tortuosa quanto o caráter dos personagens, o que encaminha o filme para a complexidade do noir. Sem dispensar os clichês do gênero, trabalha com as aparências sempre enganosas, homens corruptos e dispostos a tudo, e a presença de femmes fatales em pontos-chave da narrativa.  Produto comercial de boa qualidade, O Silêncio da Chuva apoia-se na direção segura de Daniel Filho e no texto sólido inspirado no bom romance de Garcia-Roza, adaptado e roteirizado por Lusa Silvestre. Versão livre, que traz a trama do romântico Bairro Peixoto para um Rio de Janeiro contemporâneo, convulsionado e cheio de conflitos sociais.  O filme tem clima e sai-se bem em cenas de ação, o que não é muito frequente nas produções do gênero. O elenco responde bem às exigências do roteiro. Thalita e Lázaro compõem uma dupla de policiais bem interessante, com suas personalidades contrastantes. Ela, muito despachada e falastrona; ele, um tanto inseguro e mais introspectivo. As outras duas personagens femininas são levadas com brio por Cláudia Abreu e Mayana Neiva. Otávio Müller marca presença com seu carisma cult num papel um tanto exótico, mas que faz todo sentido no contexto do enredo.  A estrutura do longa mantém o suspense até o final. Aliás, “finais”, pois há um antes dos créditos e outro, depois. Portanto, espere esse outro desfecho depois da apresentação dos créditos técnicos. Ele confere novo sentido ao conjunto.  As questões sociais estão presentes na trama, em especial com a presença de Maximiliano (Peter Brandão), um ladrão pé de chinelo desejoso de dar um passo maior que as pernas. O ambiente um tanto soturno é pontuado por alívios cômicos, vindos, em especial, da tira interpretada por Thalita Carauta. Engraçada de fato, seu talento se escora nesse viés da comédia que consiste em dizer as falas com rapidez de metralhadora. A porção comédia merece reforço do multifacetado Otávio Müller, com sua caricatura de dom juan barato. Mas ele não fica apenas nos risos, diga-se.  Todos esses elementos em bom equilíbrio mostram a competência de Daniel Filho, diretor experiente por décadas acumuladas de trabalho na TV e no cinema. O resultado final mostra também que tomar como ponto de partida um texto consistente pode ser um bom trunfo. Garcia-Roza (1936-2020), como se sabe, foi psicanalista e professor universitário durante boa parte de sua vida. Autor de livros de sucesso sobre psicanálise, na maturidade resolveu mudar de ramo e transformou-se em escritor de romances policiais. Teve grande sucesso. O Silêncio da Chuva, publicado em 1996, é seu primeiro romance.  Nele, surge o detetive Espinosa, que opera basicamente no bairro de Copacabana. Policial diferente para nossos padrões, ele é tão eficiente como humano. Leva em conta a sociedade desajustada em que vive e não se acredita um paladino moral perdido num reino de pecadores. Mostra empatia com os outros. Gosta de viver, tem seus defeitos e fraquezas, mas é, basicamente, um homem reto. Pelo temperamento, lembra um pouco o inspetor Maigret, personagem de Georges Simenon. Lázaro Ramos, com sua integridade, o interpreta muito bem. 

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