Um dos galãs mais bem sucedidos dos anos 1980 e 1990, Richard Gere tem um nível de estrelato em Hollywood que não se faz mais. Não é apenas que ele vive de surpreender em suas escolhas de atuação: Gere tem uma versatilidade, demonstrada desde o início de sua carreira, nos anos 1970, que poucos atores têm. De soldado a golpista, mulherengo a fiel interesse romântico, de cavaleiro medieval até, claro, advogados ambiciosos, Gere passou mais de cinco décadas passeando por gêneros e demonstrando uma habilidade única nisso.
Chegando aos seus 75 anos neste sábado, 31, Richard Gere, que nasceu em Filadélfia, nos Estados Unidos, passa uma fase distante do estrelato e mais próximo a produções mais independentes, mas raramente decepciona críticos. Para celebrar sua carreira, relembramos abaixo um pouco da história de vida do eterno mocinho de Uma Linda Mulher.
Um substituto de John Travolta?
No início de sua carreira, nos anos 1970, Gere transitava pelo palco e as telas e ao mesmo tempo se esforçava para se tornar um músico profissional. Combinando tudo isso, foi com o papel de Danny Zucko na produção inglesa de Grease, em 1973, no teatro, que ele ganhou notoriedade. Em 1978, este papel seria levado para o cinema por John Travolta.
Mas a relação entre Gere e Travolta, surpreendentemente, não para por aí. Na realidade, seria difícil imaginar o que seria de Richard Gere se o astro de Embalos de Sábado à Noite não estivesse tão ocupado entre os anos 1970 e 1980. Isso porque três dos grandes filmes que lançaram Gere ao estrelato - Cinzas do Paraíso (1978), Gigolô Americano (1980) e A Força do Destino (1982) - foram oferecidos para Travolta. Por motivos diferentes, o ator recusou ou não pôde participar das produções, e a estrela Richard Gere foi lentamente se formando.
Uma carreira de altos, baixos, premiações - e nunca um Oscar
Pelos anos 1980, fama e talento de Gere já estavam cimentados e ele já havia recebido sua primeira indicação ao Globo de Ouro por A Força do Destino. Mas o resto da década não foi fácil para sua carreira: os 1980 de Gere foram marcados por filmes de pouco sucesso de bilheteria e crítica, um período de seca que seria encerrado só em 1990, mas com dois sucessos absolutos: Justiça Cega, em que interpreta um policial corrupto, e o clássico Uma Linda Mulher. Sua comédia romântica com Julia Roberts, um Cinderela “moderno” (e já também ultrapassado) explodiu nas bilheterias e virou um ícone do gênero, com status de queridinho do cinema que poucos conseguem atingir.
E então os anos 1990 foram dourados para o ator: ele recebeu elogios por filmes como Sommersby: O Retorno de um Estranho, As Duas Faces de Um Crime e O Chacal e tudo culminou no ótimo ano de 1999, quando ele se reuniu com Roberts para Noiva em Fuga e foi eleito o homem mais sexy do mundo pela revista People.
Mais tarde, o início do novo milênio trouxe um de seus papéis mais lembrados até hoje, como o advogado mulherengo e sapateador Billy Flynn em Chicago. Mas mesmo mais esta indicação ao Globo de Ouro - e uma vitória como melhor elenco no Critics Choice - não levaram Gere para um indicação ao Oscar. Talvez isso não tenha nenhuma relação com suas habilidades de atuação.
De estrela a ator indie: os motivos políticos por trás da transformação
Lá atrás, em 1993, Richard Gere foi supostamente banido do Oscar por ter improvisado um protesto ao anunciar os indicados à melhor direção de arte. Na ocasião, ele protestou contra políticas da China, e pediu uma onda de pensamentos pelo fim da supressão de direitos humanos no território e no Tibete. Gere recebeu aplausos na época, mas hoje diz que isso lhe causou um banimento da Academia. Em 2003, no entanto, com Chicago recebendo 13 indicações, o ator foi novamente convidado a comparecer à cerimônia.
Enquanto pode ser popular hoje em dia fazer um ou outro protesto em cerimônias de premiação, há quem diga que, em Hollywood, ainda existem assuntos tabu. Susan Sarandon, colega de elenco do ator em filmes como Dança Comigo? e A Negociação, falou sobre o momento ao The Hollywood Reporter: “Não importa que você fale mal do Trump porque Hollywood odeia o Trump. Mas Richard foi corajoso ao falar o que falou. Ele estava chamando atenção para coisas que as pessoas estavam decidindo não prestar atenção. Este foi o problema”. Um apoiador ativo da independência do Tibete através de diversas fundações, como a Tibet House US ou a Gere Foundation (fundada por ele próprio), ele é banido permanentemente de entrar na China.
Precisamente por ser um ponto sensível em Hollywood - indústria que sofre quando qualquer grande lançamento é impedido de estrear na China - é difícil determinar se a relação de Gere com o país é o motivo por trás da transição de carreira do ator. Fato é que nos últimos anos ele tem estrelado filmes cada vez menores, em produções sem grande alarde. Para ele, a China certamente teve um impacto na sua carreira: “Existem filmes que eu não posso fazer porque a China vai falar ‘não ele’”, disse ao THR. “Eu recentemente tive um filme que disseram que não seria financiado se fosse comigo porque seria um problema para os chineses.”
Amores brasileiros - e muitos outros
Para além do humanitário, o interesse de Gere pelo Tibete começou pela vertente religiosa, quando ele se aprofundou no budismo em seus 20 e poucos anos. Uma das pessoas envolvidas nesse mergulho espiritual, surpreendentemente, era brasileira: em 1978, ele viajou ao Nepal com a artista brasileira Sylvia Martins, com quem teve um relacionamento durante os anos 1970 e 1980. Richard Gere passou por diversos namoros com muitas mulheres ao longo dos anos, mas poucas ganharam notoriedade por seu relacionamento com o ator como Sylvia. Antes dela, rumores circulavam de que havia algo entre ele e a atriz Penelope Millford.
Foram inúmeros relatos de relacionamentos com nomes famosos, desde Barbra Streisand, Priscilla Presley a Kim Basinger - mas o relacionamento mais noticiado, que rendeu um (breve) casamento, foi com a modelo Cindy Crawford entre os anos 1991 e 1995. Desde então, ele teve mais dois casamentos: com a modelo e atriz Carey Lowell, entre 2002 e 2013 e com a ativista espanhola Alejandra Silva, com quem permanece casado desde 2018.
Richard Gere longe dos holofotes
De Chicago até aqui, nos últimos 20 anos, Gere tem virado sua carreira para um lado menos blockbuster, o que não quer dizer que ele não tenha chamado atenção da crítica especializada - ou do seu público fiel. Fãs de sua carreira lembrarão de sua última parceria com Diane Lane em Noites de Tormenta, de 2008, ou um de dos “filmes de cachorro” mais queridos e comoventes de Hollywood, Sempre ao Seu Lado, de 2009. Fato é que, por menos que Gere entre em cartaz com grandes produções de Hollywood, ele mal passa um ano sem lançar um filme.
E apesar de ter performances amplamente elogiadas - que até geraram algum burburinho de Oscar, como em Não Estou Lá, de 2007, ou Norman: Confie em Mim, de 2016, Gere simplesmente não foi agraciado com uma indicação na Academia até hoje. Se grandes produções ou prestígio do Oscar fazem falta, parece que não - de acordo com o próprio ator, a indústria cinematográfica não é mais a mesma de antigamente, e ele tem um ponto.
Também ao The Hollywood Reporter, ele disse: “Eu não estou interessado em interpretar um sábio Jedi na sua franquia. Fui bem-sucedido o suficiente nas últimas três décadas para me dar o luxo de fazer estes filmes menores agora [...] Os estúdios estão interessados em lucros gigantescos e eu ainda estou fazendo os mesmos filmes de quando comecei. Pequenos, interessantes, aprofundados em personagem e narrativa”.
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