Sofia Coppola: ‘Quis imaginar como foi para Priscilla Presley entrar no quarto de Elvis pela 1ª vez’

Diretora fala sobre o filme ‘Priscilla’ e seu foco na mulher do rei do rock, que tinha 14 anos quando o conheceu, com 24. ‘Ela frequentava o ensino médio quando já estava morando em Graceland. Imagine como era isso?’

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Por Mariane Morisawa

Elvis e Priscilla Presley formaram um casal de conto de fadas. Mas, lendo Elvis e Eu, a autobiografia da mulher do rei do rock, a cineasta Sofia Coppola descobriu que nunca sabemos o que aconteceu depois do “viveram felizes para sempre”. Ficou surpresa ao notar que pouco sabia sobre ela. “Priscilla frequentava o ensino médio quando já estava morando em Graceland. Imagine como era isso?”, disse a diretora, referindo-se à famosa mansão do cantor, em mesa-redonda com a participação do Estadão, em Veneza, onde seu filme Priscilla concorreu ao Leão de Ouro.

O longa-metragem, estrelado por Cailee Spaeny (indicada ao Globo de Ouro de atriz de drama) e Jacob Elordi, tem pré-estreias no Brasil a partir da quinta-feira (21), com lançamento oficial em 4 de janeiro.

Sofia Coppola adora falar do mundo particular, muitas vezes solitário e isolado, de adolescentes ou mulheres muito jovens. Foi assim em As Virgens Suicidas (1999), Encontros e Desencontros (2003), pelo qual ganhou o Oscar de roteiro original, e Maria Antonieta (2006), entre outros.

Cailee Spaeny é Priscilla Presley no filme de Sofia Coppola, 'Priscilla' Foto: Sabrina Lantos/A24/Divulgação

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“Eu sempre estou interessada em como as pessoas se tornam quem são”, afirmou a cineasta. “Priscilla Presley vive em um mundo extraordinário, mas suas experiências são universais. Todas as meninas tornam-se mulheres, muitas se tornam mães e sentem-se pressionadas a atender a certas expectativas. Quis imaginar como foi para ela entrar no quarto de Elvis pela primeira vez. Contar a história sob seu ponto de vista, conectando-nos ao lado humano de sua vida.”

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Ela até achou que Priscilla poderia ser um tanto parecido com Maria Antonieta – duas adolescentes trazidas de longe para viverem trancadas em uma gaiola de ouro. “Mas pensei: são mundos diferentes, e estou interessada nesse tema, em como garotas se transformam em mulheres com personalidades próprias em um contexto desses”.

Insular e intimista, Priscilla é praticamente um negativo de Elvis (2022), a vertiginosa cinebiografia de Baz Luhrmann sobre o rei do rock, estrelada por Austin Butler e no qual Priscilla era mera coadjuvante. A diretora não se abalou nem um pouco com a proximidade dos dois projetos, pelo contrário.

“Conhecendo a obra do Baz, tão específica, sabia que seria totalmente diferente. Achei até legal as pessoas ainda estarem com Elvis na cabeça e agora poderem ver esse outro lado. Fora que Priscilla trata da segunda parte do casal famoso, alguém que mal conhecemos.”

Sofia Coppola

Cailee Spaeny e Jacob Elordi como Priscilla e Elvis Foto: Philippe Le Sourd/A24/Divulgação

‘Minha mãe lutou para manter sua vida criativa’

Como tantas mulheres de seu tempo, Priscilla Presley ficou à sombra do célebre marido. “Era muito difícil para as mulheres naquela época, ela é da mesma geração da minha mãe”, disse a diretora.

“O papel delas era diferente em comparação à minha geração e à das minhas filhas, que são adolescentes. E nem faz tanto tempo assim. Fico imaginando a força que ela precisou ter para abandonar as expectativas de ser apenas mulher de um homem bem-sucedido. Eu sei que minha mãe lutou muito para manter sua vida criativa”, contou Sofia, filha de Francis Ford Coppola (O Poderoso Chefão, Apocalipse Now), um dos maiores cineastas americanos, e da artista, roteirista e documentarista Eleanor Coppola.

Priscilla cresceu mudando-se de cidade a cada dois ou três anos, por causa da carreira do padrasto, militar. Estava acostumada com a solidão e a falta de amigos. Quando morava na Alemanha, conheceu Elvis Presley, que prestava serviço militar. Ele era o artista mais famoso do mundo e tinha 24 anos, e Priscilla, apenas 14 – um relacionamento que hoje seria visto de outra maneira.

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Cena de 'Priscilla', novo filme de Sofia Coppola, Cailee Spaeny (foto) Foto: A24/Divulgação

Elvis tratava Priscilla ‘como uma boneca’

Quando o cantor voltou para os Estados Unidos, ficaram dois anos sem se ver, até Elvis convencer os pais dela a deixá-la passar duas semanas em Memphis. Menos de um ano depois, Priscilla se mudou definitivamente para Graceland, ficando lá mesmo quando Elvis rodava vários filmes em Los Angeles. O astro apresentou bebida e drogas a Priscilla e a tratava como uma boneca, escolhendo suas roupas, penteado e maquiagem.

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Por apresentar uma face mais complexa do rei do rock, Sofia Coppola não conseguiu a liberação de suas músicas. Ela então procurou soluções criativas com o marido Thomas Mars, líder da banda Phoenix, evocando o período ou o clima de determinadas cenas.

Sofia Coppola sabia que tinha dois desafios para escalar os atores desse lado B da história. Precisava de uma atriz interpretando Priscilla Presley com credibilidade dos 14 aos 29 anos. Acabou aceitando uma indicação da amiga Kirsten Dunst, com quem trabalhou em As Virgens Suicidas, Maria Antonieta e O Estranho que Nós Amamos (2017). Kirsten estava filmando com Cailee Spaeny o longa Civil War, de Alex Garland, que sai em 2024 e tem no elenco o brasileiro Wagner Moura.

Deu certo: Spaeny, 25, ganhou a Coppa Volpi de melhor atuação feminina no Festival de Veneza e concorre ao Globo de Ouro de melhor atriz de drama. Ela teve o luxo de poder contar com a consultoria de Priscilla Presley, sempre disponível para tirar suas dúvidas. “Ela me ajudou muito porque as diferenças geracionais são muitas”, disse Spaeny.

Cailee Spaeny teve de interpretar uma Priscilla dos 14 aos 29 anos com credibilidade; ela venceu prêmio de melhor atriz e concorre a outro Foto: Sabrina Lantos/A24/Divulgação

Elvis ferido e com borogodó

No caso de Elvis Presley, a pressão era enorme. A diretora não precisava do performer, e sim do homem por trás do ídolo, em sua vida privada, com defeitos e fraquezas. Jacob Elordi, que estourou em Euphoria e é o galã do momento em Hollywood, tinha o borogodó necessário. “Quando me encontrei com ele em um restaurante, todas as garotas se viraram e olharam. Imagino que Elvis também tinha o mesmo charme e carisma. E Jacob tinha a sensibilidade para mostrar seu lado vulnerável.”

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Como todos os longas de Sofia Coppola, Priscilla é um filme impressionista, de atmosferas e sutilezas. “Eu queria a essência do Elvis”, disse ela. Por isso, não importava muito que Jacob Elordi não se parecesse muito com o cantor.

No set de filmagem de 'Priscilla', Jacob Elordi (Elvis), Cailee Spaeny (Priscilla Presley) e a cineasta Sofia Coppola Foto: Sabrina Lantos/A24/Divulgação

Não seria de seu feitio também demonizar Elvis Presley. Ela apenas quis mostrar a complexidade de um homem famoso, ferido e produto de seu tempo. Mas, sem dúvida, é um Elvis nunca visto. Na entrevista coletiva do filme em Veneza, Priscilla Presley disse que o amor dela por Elvis nunca acabou, mesmo depois da separação. Só que ela não tolerava aquele estilo de vida.

É para fazer essas escolhas ousadas que a diretora prefere continuar no cinema independente. Chegou a flertar com Hollywood e quase fez sua versão de A Pequena Sereia, mas o projeto não foi adiante. “Eu não acho que trabalhar no sistema de estúdio, com pessoas me dizendo o que fazer, serve para mim”, disse a diretora, que cresceu nos sets de seu pai. “Eu gosto de me manter independente.”

Jacob Elordi é Elvis e Cailee Spaeny é Priscilla em cena de 'Priscilla' Foto: Sabrina Lantos/A24/Divulgação
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