EFE - “Se eu não fosse um eterno otimista, nunca teria me dedicado a fazer filmes”, disse o cineasta alemão Wim Wenders em Barcelona em uma entrevista coletiva, onde anunciou seu novo projeto, que girará em torno da paz.
“Não sei como o Woody Allen consegue”, acrescentou o realizador de Paris, Texas: “Sou otimista em relação ao futuro do cinema e da sociedade, porque só os otimistas podem mudar o mundo, os pessimistas sempre escondem a cabeça debaixo das asas”. E sobre o seu novo “grande projeto”, adiantou que “vai girar em torno da ideia de paz, porque sem paz não há verdade e não há bem comum”.
Wenders está na cidade espanhola, onde recebeu o prêmio honorário no festival de cinema BCN Film Fest.
O realizador alemão lembrou que “o 11 de setembro mudou o mundo, como aconteceu com a covid-19, o confinamento e a pandemia”, e onde esta incidência é mais notória é no “sentimento da procura da verdade, uma espécie em perigo de extinção, e do conceito de bem comum, que para as novas gerações já não tem importância e continuará em declínio”.
Sem ceder à nostalgia, Wenders, de 76 anos, pensa que “aqueles bons tempos do passado desapareceram totalmente” e agora “devemos nos perguntar o que podemos fazer por esta verdade que procuramos e pelo bem comum”, reflexão que nos últimos dias o levaram a pensar no novo projeto.
Ele não esconde a satisfação por regressar este ano ao festival de Cannes, onde concorrerá com Perfect Days e apresentará ainda o documentário em 3D Anselm, sobre a figura do pintor neo-expressionista alemão Anselm Kiefer.
“Adoro que ninguém saiba nada sobre esses dois filmes. Não tenho medo de competir, talvez só um pouco, mas não estou preocupado, e posso dizer que são dois filmes que não têm nada a ver com meus anteriores”, disse.
Não tenho medo de competir, talvez só um pouco, mas não estou preocupado, e posso dizer que são dois filmes que não têm nada a ver com meus anteriores
Wim Wenders
Wenders confessou que faz cinema porque um dia descobriu que existia: “Em criança queria ser pintor, arquiteto, padre, escritor, músico e no fim escolhi a pintura. Na verdade, fui um pintor quando fiz meu primeiro filme, e percebi que o cinema incluía tudo o que eu queria fazer na minha vida”.
Do seu trabalho, o que menos o entusiasma é escrever o roteiro, “porque não gosto de ficar sozinho”, e declara a sua admiração por aqueles realizadores que escrevem os seus próprios roteiros, algo que só fez em dois ocasiões com pouca satisfação. Elogiou dois de seus roteiristas, o austríaco Peter Handke, Prêmio Nobel de Literatura, e o americano Sam Shepard (já falecido), que “foram e continuam sendo muito importantes em minha vida”.
Para Wenders, Handke, com quem trabalhou cinco vezes, evoluiu ao mesmo tempo que ele, a ponto de “seu primeiro sucesso coincidir com o meu” e o caso de Shepard é diferente, pois o conheceu como dramaturgo em Nova York e San Francisco, e adorou a qualidade dos diálogos em suas obras.
“Quando vi Shepard, percebi que ele tinha uma personalidade explosiva. Ele era maior que a vida e também escritor. Foi ator em um dos meus filmes e escreveu dois deles. Foi um dos meus melhores amigos nos últimos vinte anos”, disse o cineasta.
Depois de assegurar que “a idade é irrelevante”, Wenders garantiu que “o que conta é quem você é e o que faz”.
Aos que se iniciam no cinema, aconselha a não ouvir quando alguém lhes diz que o cinema é um produto no qual necessariamente o artista tem de fazer sucesso.
“É uma grande mentira, e se por acaso acredita que o cinema é um produto, melhor se dedicar a desenhar carros, mas não ao cinema” e acrescenta que “mesmo que te obriguem, lembra que o cinema é cultura e faz parte da mais antiga tradição europeia como a literatura ou a pintura”.
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